Foi noticiado a existência de hipotéticos complots para construir ou criar novas doenças com o objectivo de assegurar mercado para os crescentes interesses da poderosa indústria farmacêutica. A situação não é nova e irá originar muitos debates sobre este interessante tema. Os anglo-saxões utilizam a expressão Disease Mongering, ou seja: provocar a sensação de que existem certos problemas ou “doenças” que necessitam ser corrigidos e controlados. Deste modo, a “apetência” para o consumo de fármacos estaria criada.
A medicalização da sociedade não é de agora. Há mais de trinta anos, Ivan Illich já tinha denunciado esta situação. Transformar a menopausa em doença, alarmar para uma epidemia de disfunção sexual feminina, realçar a ansiedade social, a síndroma pré menstrual ou a síndroma das “pernas irrequietas”, além de considerar vários fenómenos que acompanham, naturalmente, a idade ou são frutos de uma interacção social, em doenças é comum e não isento de sérios problemas. A percentagem de adultos rotulados de “doentes crónicos” chega, nalgumas comunidades, a ultrapassar os 60%! É fácil de verificar as consequências.
O problema é, ainda, muito mais complexo. E, tem a ver com o facto de dicotomizarmos tudo e todos: bonitos e feios; gordos e magros; fiéis e infiéis; negros e brancos; benfiquistas e outros (lembrei-me do Tonibler!); doentes e sãos… Ora o binómio doença-saúde tem de ser analisado num processo contínuo, como se fosse uma semi-recta, começando no infinito, onde está a “saúde perfeita” e aquele ponto comum a todos, a morte. Depois, claro, a fasquia é colocada, umas vezes mais para o lado direito, outras para a esquerda, consoante certos critérios. Os que ficam do lado direito têm riscos mais elevados de virem a sofrer doença, mas os que estão do lado esquerdo, considerados normais, também correm, embora de forma menos acentuada, mas, porque são mais numerosos, acabam por ser os principais contribuintes das doenças (nada de conotações políticas!).
O exemplo do colesterol elevado é paradigmático. Há muitos anos era considerado como normal, valores que hoje exigem “tratamento” imediato. Ao longo dos anos, o limite de “normalidade” começou a baixar, a baixar e hoje já está nos 190 mg%. Não me admiraria muito que, no futuro, este valor ainda desça mais. Claro que as justificações científicas são intocáveis. Os que apresentam determinados valores acima do limite de “normalidade” correm mais riscos, logo, os esforços no sentido de evitar essa situação serão bem-vindos. Mas serão mesmo? Apesar desta situação, a título meramente exemplificativo, hipercolesterolemia, não estar enquadrada no conceito estrito de Disease Mongering, ilustra alguma preocupação sobre o conceito de normalidade em medicina e as suas eventuais repercussões na própria saúde das populações, as quais, tendo de tomar fármacos, acabam, também, por correrem outros tipos de riscos, além dos custos económicos inerentes, quando podiam ser controlados de forma não farmacológica, ou, mesmo, serem aceitáveis, dentro de determinados limites.
Temos pano para mangas…
5 comentários:
Deixe-me começar por dizer que quem não é benfiquista padece mesmo de alguma maleita e que já deveria haver medicação para isso.
Como tudo na natureza, a normalidade é apenas o ponto central de uma gaussiana. As pessoas entendem isto, a não ser quando lhes dizem para apostar a vida no seu entendimento...
Caro Tonibler
Mesmo que houvesse medicação para quem não é benfiquista, acha, por exemplo, que o Pinho Cardão iria tomá-lo? Oh! Oh! É o tomas! Seria muito pior que óleo de fígado de bacalhau...
Quanto à "normalidade gaussiana" é apenas uma das muitas "normalidades#. Há muitas situações em que não se aplica.
é verdade professor massano cardoso.acho que o caro pinho cardão não tomava esse remédio...
Caro Professor,
Mas toda a gente sabe que vender saúde é lucrativo e está na moda (note-se que já era lucrativo mesmo antes de estar na moda).
Temos farmácias;
Temos parafarmácias;
Temos lojas de produtos naturais e dietéticos;
Temos termas;
Temos Spas (forma mais moderna das termas);
A saúde vende-se muito bem, a quem a tem (que quer ter mais) e a quem não a tem (que a quer ter). Isto é como juntar a fome à vontade de comer e se não há necessidade, então há que criá-la.
tenho cá para mim que quando o benfica arrumar a casa ,para o ano vai ser uma máquina.e depois o caro dr pC,face ás azias que vai ter (prafrazeando jorge coroado-já li o livro dele no "canto dos
malucos"da fnac" e recomendo"-)vai ter de tomar umas doses cavalares de oleo de figado de bacalhau..
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