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quinta-feira, 8 de novembro de 2007

O tempo não perdoa...

“O tempo é a substância de que sou feito”
(Jorge Luís Borges)


A análise de diversos estudos apontam para a existência de interessantes associações entre certos comportamentos e exposição a diferentes factores com muitas doenças. Consumo excessivo de sal e hipertensão, obesidade e diabetes, tabaco e cancro do pulmão, hipercolesterolemia e enfarte do miocárdio, poluentes atmosféricos e doenças pulmonares, radiações e malformações são alguns de inúmeros exemplos que poderíamos descrever e que reforçam este conceito. Deste modo estamos mais aptos a tomar adequadas medidas de prevenção. Só que prevenção não significa, forçosamente, “evitar” o aparecimento da doença mas sim “adiá-la” para mais tarde.
As formas como são transmitidas certas mensagens e notícias dão a impressão de que é possível evitar as doenças, o que não é totalmente verdade. No entanto, são suficientes para modificar o modo de pensar de muitas pessoas ao ponto de ficarem admiradas quando acabam por adoecer. Cumpriam com todas as regras e recomendações, e mesmo assim...
Em toda esta problemática há um ponto que importa focar, o envelhecimento. Consideramos como “normal” viver a maior parte da nossa existência num estado de excepção do qual se destaca a velhice. É bom viver muitos anos, sobretudo com o mínimo de capacidades, mas o risco de adoecer e de morrer aumenta exponencialmente com a idade. Os diversos factores que, diariamente, são enunciados como responsáveis por muitas doenças devem ser analisados em função do tempo.
A este propósito convém informar que quando comemoramos o nosso aniversário não fazemos mais um ano, mas sim “um ano e mais qualquer coisita”, “qualquer coisita” que vai aumentando de ano para ano! O tempo biológico acelera enquanto o cronológico se mantém constante. Este fenómeno foi quantificado no século XIX por Benjamin Gompertz, matemático judeu, que criou uma interessante equação segundo a qual seria possível calcular o risco de morte com a idade. Como estava ligado a seguradoras viu aqui uma forma interessante de calcular os prémios de seguro em função da idade. Mas o que é curioso é o facto de que através desta lei, Lei de Gompertz, que se aplica às outras espécies, ser possível calcular o tempo de duplicação da taxa de mortalidade que é cerca de uma semana nas moscas, três meses nos ratinho e de oito anos nos seres humanos. Deste modo, partindo da “idade em que não se morre”, que na nossa espécie oscila ao redor dos 10/11 anos, é fácil de calcular que a taxa de mortalidade é duas vezes superior aos 18 anos, quatro vezes aos 26 anos, oito vezes aos 34 anos, dezasseis vezes aos 42 anos, trinta e duas vezes aos 50 anos, sessenta e quatro vezes aos 58 anos e o melhor é ficar por aqui para não assustar mais!
Por cada dia que passa envelhecemos mais rapidamente do que no anterior, numa aceleração preocupante que, curiosamente, parece diminuir em idades muito avançadas, não se sabendo se é por falta de combustível ou por esquecimento de São Pedro!
Este fenómeno biológico é curioso e tem como correspondente a percepção da passagem do tempo. Em criança e na adolescência o tempo demora a passar, depois começamos a ter a percepção de que acelera, mas a partir de certa altura nem damos pela sua passagem.
A prevenção das doenças tem como objectivo “empurrá-las” para mais tarde, de preferência para o “fim” da vida, porque apesar de conhecermos muito sobre os principais factores de risco, há um, o mais importante de todos, que não perdoa: o tempo.

8 comentários:

Bartolomeu disse...

Curioso caro Prof. Massano Cardoso.
Lembro-me de ter lido ha um tempo razoável ;) uma tese (não sei se lhe posso chamar assim) acerca da constatação de casos raros de pessoas cujo organismo ganhou resistências e imunidades após idades já "avançadas". Um processo que a ser verdadeiro, estará certamente ligado a uma qualquer mutação genética, imagino.
Sempre me causou alguma impressão a excessiva longevidade, parece-me uma aberração da natureza. Apesar de tambem não conseguir estabelecer uma "idade ideal" para a morte ocorrer. Mas sempre achei terrível poder sobreviver a amigos e sobretudo a familiares da geração precedente. Não consigo entender, por exemplo, o desejo de algumas pessoas com possibilidades económicas, desejarem que o seu corpo seja mantido congelado, para quando mais tarde a medicina tiver cura para a doença que os vitimou, sejam "ressuscitados". Que tipo de referências irão colocar de novo essas pessoas, no contexto de vida, onde irão passar a existir? E as ligações familiares?
Brrrr é algo que me faz arrepiar, só de pensar. Faz-me recordar uma vez que me perdi da minha mãe na praça de Algés, teria uns 4 ou 5 anos e derrepente vi-me no meio de uma floresta de gente com quem não me conseguia identificar e que até me parecia ameaçadora. Eram gigantes, e eu sujeito a uma voracidade de feras que a minha visão infantil me fazia imaginar.
Brrrr!!!

invisivel disse...

Muito sinceramente não tenho palavras que expressem a minha admiração. Muito obrigado!

Quero realçar a forma "serena" e eloquente como o Professor MC, nos leva a compreender e aceitar como o inevitável: «...O tempo biológico acelera enquanto o cronológico se mantém constante...».

Margarida Corrêa de Aguiar disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Margarida Corrêa de Aguiar disse...

Caro Professor Massano Cardoso
Mas porque será que o envelhecimento nos acelera a passagem do tempo? Porque será que o tempo encolhe justamente quando com o peso da idade queremos que o tempo estique? Não nos apercebemos, é tudo tão rápido... Mas quando percebemos o funcionamento das "máquinas" da vida e do tempo através do "O Tempo não perdoa" do Professor Massano Cardoso tudo fica cristalino...

invisivel disse...

Lindo comentário o seu , drª Margarida Aguiar.

Margarida Corrêa de Aguiar disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Margarida Corrêa de Aguiar disse...

Caro invisivel
Há momentos! Obrigada.

Suzana Toscano disse...

Tenho um tio com 88 anos que gosta de resumir a vida na frase "Tempus fugit". A vida é uma luta contra o tempo que corre. A primeira vez que temos a consciência de idade é quando pensamos que já passou a oportunidade de fazer isto ou de fazer aquilo. Até uma fase da vida a experimentação é a palavra de ordem, está tudo em aberto, pode-se voltar a tentar, corrigir,mudar se for preciso. A certa altura, vê-se com incredulidade que afinal existe o "nunca mais". As mulheres talvez sintam isso primeiro, sobretudo quando começa a ser tarde para terem filhos, os homens talvez seja quando acham que já não vão poder chegar a presidentes da empresa ou a directores do departamento... Mas a natureza é tão sábia que nos protege da consciência do envelhecimento até muito tarde, apesar de ela ser implacável, como mostra o caro Massano neste magnífico post.
Mas, pelo que tenho podido ver, quando chega a velhice pura e dura, a tal qua a nova longevidade permite, o tempo passa outra vez devagarinho, são longas as horas de solidão em casa, sem o companheiro de sempre, poucas visitas, só as idas ao médico a marcar o calendário. Aí, o pouco tempo que falta escoa minuto a minuto, lentissimo...Às vezes esquecemos isso, só damos importância aos sinais biológicos e achamos que os velhotes estão bem..