O BCE decidiu na última 5ª Feira, como se sabe e era esperado, deixar inalteradas as suas taxas de intervenção para cedência de fundos ao sistema bancário.
Na declaração do Presidente Trichet que anunciou essa decisão, foram no entanto detectadas diferenças sensíveis de terminologia em relação à declaração que no mês anterior justificara decisão de igual teor.
Na declaração de Fevereiro, Trichet omitiu várias passagens da anterior, as quais sinalizavam uma grande preocupação com a inflação, deixando aberta a possibilidade de um aumento próximo das taxas para conter intoleráveis “desvios” da inflação em relação à regra de ouro “não superior mas próxima de 2%”.
E também nesta última declaração Trichet acentuou a probabilidade de uma próxima e significativa redução em baixa da sua previsão de crescimento para a Zona Euro.
Tal bastou para que os mercados interpretassem essas alterações como sinal de que o BCE iria baixar as taxas em Abril...
Achei curioso este preciosismo de interpretação: ainda não seria na reunião de Março – que seria apenas preparatória (!!) – mas em Abril, sim em Abril, o BCE reduziria a sua taxa principal em 0,25%!
Este fim-de-semana, em Tóquio, onde participava numa reunião dos responsáveis financeiros do G7, Trichet procurou moderar os ânimos, emitindo declarações que parecem destinadas a contrariar a interpretação do mercado: disse, em suma, que na reunião da última 5ª Feira o BCE não tinha considerado qualquer cenário de descida das taxas...
E acrescentou que continuava a esperar um crescimento sustentado em 2008...
Torna-se difícil encontrar um fio condutor, com um mínimo de clareza, neste discurso...
O que continua a perceber-se é que o BCE não sabe o que fazer, perante um cenário em que se misturam:
- Pressões para a subida dos preços no consumidor, decorrentes de um encarecimento generalizado de matérias-primas;
- Perspectivas de abrandamento (significativo) da actividade económica na Zona Euro, induzidas sobretudo pela crise dos mercados financeiros e pelo quase certo abrandamento/recessão nos USA.
Neste cenário, o BCE parece andar às “apalpadelas”, para ver se encontra alguma saída...só espero que não venha a meter o pé nalgum buraco mais escondido (ou na poça, como também se diz)...
5 comentários:
Que o BCE não faz a menor ideia do que fazer, aí concordo. Na dúvida, um banco central líder baixava a taxa para manter o valor absoluto da sua moeda e não para o subir face ao dólar, como fará um "cambista". E se não é para o BCE ser um banco central líder, serve para quê?
Mas, para dar alguma razão ao Trichet (e já não durmo hoje), por mim ainda está por provar que existe uma crise de facto nos mercados financeiros. Há, na minha modestíssima opinião, uma diferença entre uma crise e umas quantas oscilações nos índices dos mercados de acções. Quando essas oscilações se reflectirem no desemprego, isso é crise. Até lá é um "ventinho fresco". Mesmo as revisões das previsões crescimento me pareceram precipitadas (não a portuguesa, claro, mas essa não é exactamente uma previsão, é mais uma fézada)
Resumindo, compreendo que o Banco Central da Turquia não saiba o que fazer, porque ninguém sabe. O mal do BCE é pensar que é o Banco Central da Turquia.
Com toda a consideração Tonibler, não o sabia tão ricardiano (aderente às melífluas teses de Ricardo Reis)acerca da "crise" dos mercados financeiros e às suas inocentes consequências...
Sem alinhar nas teses catastrofistas dos comentadores de pacotilha - que num dia são catastrofistas e no dia seguinte, se lhes parecer mais soleiro, viram eufóricos - digo-lhe que o abrandamento da actividade é real.
Como o Senhor bem saberá, o emprego/desemprego só reage a estes "estados de alma" com sensível desfasamento temporal...
No entanto, nos USA a taxa de desemprego já subiu quase 1% nos últimos 6/7 meses...
Já que fala no desemprego, confesso que não entendo muito bem por que razão em Portugal não se fixa=cola=gruda a taxa de desemprego...
Se esse sistema funciona tão bem com a inflação e com o crescimento, porque razão não haveria de funcionar com o desemprego?
Era um problema a menos com que ficavamos...
Mas eu não sou ricardiano. Só tenho ainda que "ver" a crise, porque até agora só vi psicologia. Claro que, como sabemos, de previsão em previsão as coisas tornam-se reais, mas nenhuma das razões avançadas até agora é razão suficiente para a crise tirando, obviamente, as previsões da crise.
Também não tenho essa opinião do desfasamento do desemprego e do emprego, mas isso dava um comentário de 50 páginas.
A taxa de desemprego ainda não conseguiram fixar, mas já tentaram montes de vezes. Agora, espero que não o façam porque é o único indicador de jeito neste país.
Já tinha referido esse problema do BCE. Não sei até que ponto poderia um corte nas taxas de juro agravar as pressões inflacionistas. Elas devem-se essencialmente À subida do preço dos produtos alimentares. Também é de atentar que a Espanha está a abrandar e é preciso começar a precaver esse iminente cenário de recessão. Mais uma vez voltamos ao problema do costume. A crise no imobiliário. Até que ponto não seria interessante uma entidade reguladora na área da construção pra evitar estes fenómenos, promovendo assim um crescimento sustentado e sustentável??
Caro Tonibler, em função do seu último comentário, em corolário do anterior, eu creio poder concordar que meu Amigo não é ricardiano: é, sim, ultra-ricardiano...
Caro André,
O BCE celebra 10 anos de vida no próximo dia 1 de Junho - 10 belas primaveras que, segundo consta, serão celebradas com a entoação emcoro, pelo Conselho de Governadores, da "Ode ao Sub-Prime", da autoria conjunta de Tony Carreira e Vasco Graça Moura.
Dizem que vai ser um momento especialmente comovente...
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