A excelente imagem de Gaia ou Gaea, deusa da Terra, servida apetitosamente ao Blog pelas mãos do Prof. Massano, fez-me reler o relato da criação do mundo, feito nos versos de Hesíodo, cerca de oito mil anos antes de Cristo e mantido na tradição e mitologia gregas.
Nesse relato, lá está Gaia, a segunda criatura a ser criada, nascida do Caos.
O poema é notável.
Se compararmos com o relato da Bíblia, 4000 anos posterior e também um poema admirável, vemos semelhanças que são de assinalar.
Aí vai o poema.
Primeiro que tudo surgiu o Caos
E depois Gaia, de amplo peito
Para sempre firme alicerce de todas as coisas
E o brumoso Tártaro num recesso da Terra de largos caminhos
E Eros, o mais belo de entre os deuses imortais
Que amolece os membros
E, no peito de todos os deuses e de todos os homens, domina o espírito e a vontade ponderada.
Do Caos nasceu o Érebro e a negra Noite
Da noite, por sua vez, nasceu o Éter e o Dia
Que ela concebeu e deu à luz, depois da sua ligação amorosa com Érebro.
E Gaia gerou primeiro Urano (o céu) constelado, igual a ela própria
Para cobrir em toda a volta
E para ser eternamente a morada segura dos deuses bem-aventurados
Deu à luz, em seguida, as altas montanhas
Retiros aprazíveis das ninfas divinas
Que habitam as montanhas arborizadas
Também deu à luz o mar estéril
Que agita com as suas vagas, o Ponto, seu deleitoso amor.
E seguidamente, tendo partilhado o leito com Urano,
Gerou o oceano dos redemoinhos profundos,
E Coio e Crio e Hipérion e Jápeto…
Gostava de notar a poderosa descrição de Eros, “…o mais belo dos deuses que…, no peito de todos os homens, domina o espírito e a vontade ponderada!...”
Simplesmente notável!...
E isto, 8000 anos antes de Cristo, mais de 7000 anos antes da filosofia grega!...
O homem pouco aprendeu, desde então!...
2 comentários:
Se a imagem é bela, o poema é divino...
Já agora continuemos com o poema e ver o que aconteceu quando Saturno capou Urano que não se cansava de fecundar Gaia. Da fecundação do mar estéril pelos testículos de Urano nasce Afrodite (Afro - espuma. E ainda bem...
Mais que aos Titãs e às Titânias, Urano (Céu) detesta seus outros filhos, os Ciclopes e os Hecatônquiros. São criaturas brutais e indomáveis.
Para não ter que encará-los, Urano obriga-os a viver no ventre escuro de Gaia (Terra), sem nunca ver a luz do dia.
Gaia sofre com a reclusão dos filhos. Sofre também com a fecundidade contínua que lhe impõe Urano (desde que se unira a ele, seu ventre não havia parado de gerar um só instante). E começa a odiar o celeste esposo.
Decide vingar-se dele. Chama os Titãs e pede-lhes que a ajudem a destronar Urano.
Todos se recusam. Só Cronos (Saturno) aceita a incumbência da mãe, pois já estava revoltado com seus sofrimentos.
O valente guerreiro do Tempo promete a Gaia que a vingará. Ela entrega-lhe a afiada foice que vinha talhando há muito tempo, com terrível intenção.
Quando Urano se aproxima da esposa para novamente fecundá-la, Cronos atira-se sobre o pai. Luta com ele. Subjuga-o.
Urano sangra e se contorce. Um grito cheio de dor ecoa pelos quatro cantos do planeta.
Os testículos de Urano voam pelo espaço. O sangue escorre sobre a terra e sobre as águas. E mais uma vez a natureza é fecundada.
No mar, os órgãos com o sémen expelido formam uma espuma alvíssima, da qual emerge Afrodite (Vénus), deusa do amor e da beleza.
Na terra, o sangue origina as Melíades, Ninfas dos carvalhos, e as Erínias, vingadoras dos crimes semelhantes ao de Cronos.
Mas elas nada fazem contra o vencedor de Urano. Todo o poder do mundo lhe pertence.
O titã soberano une-se à Réia (Cibele), sua irmã, e nela engendra uma multidão de filhos. Porém devora-os todos, logo ao nascerem, para que não lhe tomem o reino.
Apenas uma de suas criaturas escapou-lhe à voracidade, e o destronou do centro do mundo: Zeus (Júpiter), o poderoso olímpico.
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