1.Em Post há tempos aqui editado, citei um artigo de Daniel Gros no qual se chamava a atenção para a extrema insuficiência da poupança em Portugal - a poupança não chega tampouco para financiar a renovação do stock de capital, ou seja para repor o desgaste do capital produtivo…
2.Esta situação significa que todo e qualquer esforço de investimento em Portugal, nas actuais condições financeiras, terá de ser financiado por recurso a poupança externa, isto é a financiamento externo.
3.É pois de natureza financeira a grande restrição a que se encontra hoje sujeito o crescimento da economia portuguesa e que tenderá a agravar-se inevitavelmente nos próximos anos com o rápido aumento do endividamento ao exterior que até as previsões oficiais apontam.
4.Perante este quadro, compreendem-se as dificuldades de acesso ao crédito que as pequenas e médias empresas têm vindo a sentir e que agora também são extensivas aos particulares: a capacidade adicional de concessão de crédito do sistema financeiro é menor, são bem mais rigorosos os critérios de análise de risco e aumentou a exigência de garantias para cobrir os riscos assumidos (relação loan to value).
5.A sinistralidade do crédito tem aumentado bastante – o crédito mal-parado dos bancos a empresas privadas não financeiras mais do que duplicou nos últimos 12 meses – o que também explica a maior relutância que os bancos têm hoje em conceder crédito ao sector privado, com excepção das grandes empresas.
6.E os bancos, sendo-lhes dada essa possibilidade, preferem naturalmente conceder crédito ao sector público alargado que teoricamente proporciona menor risco e que pela regulamentação em vigor lhes consome menos capital…é preferível conceder crédito a uma empresa pública mesmo que completamente falida (e há tantas!) mas com o aval do Estado do que a uma média empresa privada com algumas dificuldades financeiras...
7.Esta situação tem tendência a agravar-se à medida que a dependência financeira externa aumentar, ditando uma crescente escassez de crédito para a economia.
8.Estamos pois a assistir a um típico fenómeno de “crowding-out” do sector privado no acesso ao crédito que explica, em boa parte, o formidável aperto de cinto a que este sector está sujeito e o rápido aumento do desemprego que dele deriva…
9.O anunciado lançamento das Grandes Obras Públicas (G.O.P.) só vem acentuar - e de que maneira - esta perversão no financiamento da economia. Com o eventual prosseguimento das G. O. P., o “crowding-out” do sector privado no acesso ao crédito será assustador, funcionando com uma poderosa mola impulsionadora do aumento de desemprego.
10.Assim sendo, justificar as G.O.P. com o argumento da criação de emprego será um dos maiores embustes de que há memória…as G.O.P., para além de contribuírem para aumentar a dependência financeira externa, actuarão como máquinas poderosas de destruição de emprego…
11.Avante com as G.O.P., pois, em nome do emprego!
4 comentários:
Acho que já ninguém é anjinho ao ponto de pensar que o governo avança para as obras públicas porque acredita ser bom para o país. Neste momento já só se quer ver até onde vai a pouca vergonha que, pelos vistos, teve um grande contributo na renovação recente da oposição.
Neste sentido, caro Tavares Moreira, dizer que as GOP são prejudiciais aos portugueses parece não fazer grande sentido porque não para o bem-estar destes que elas são feitas.
Caro Tonibler,
Sem prejuízo de reconhecer a perspicácia do seu comentário, lembro que a questão aflorada neste post não tem a ver com o facto de as GOP serem boas ou não para o País mas sim de serem boas ou não para o emprego.
No campo do delírio colectivo que vivemos, até se poderia admitir que, sendo péssimas para o emprego - tese deste post - poderiam, "quand même", ser boas para o País...
Tonibler exclui essa possibilidade, de forma aliás veemente, oferecendo um importante contributo metodológico para o esmiuçamento deste tema...
É exactamente isso, caro Paulo, trata-se em última análise de assegurar empregos para alguns - e que empregos e que alguns...- em troca de um número imensamente superior de desempregados!
Com uma séria agravante: a criação de alguns (e que alguns...) empregos será numa actividade sem contribuição para o PIB...
...Enquanto que as perdas de emprego se concentram no sector de bens transaccionáveis que, apesar de vital para o futuro da economia,terá que lutar pela sobrevivência em condições (de política económica) cada vez mais hostis...
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