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segunda-feira, 25 de outubro de 2010

De surpresa em surpresa...

As instituições de solidariedade social (IPSS) desempenham um papel insubstituível e indispensável no apoio social às pessoas carenciadas. Constituem uma rede de intervenção que mobiliza a sociedade civil, congregando vontades e causas que excedem em muito a relação estabelecida entre as IPSS e o Estado através da qual este entrega subsídios por conta dos serviços prestados às populações por aquelas entidades .
Num momento em que se concretizam cortes e muitos outros já estão anunciados, seja nos apoios sociais (subsídio de desemprego e apoio ao emprego e abono de família, etc.) seja nos salários, em que os impostos vão aumentar e em que o desemprego tem vindo a crescer e se vai agravar, vamos ter mais famílias carenciadas e a pobreza e a privação material vão agravar-se. Partimos de níveis de pobreza e de privação material muito elevados e preocupantes. As famílias de menores rendimentos são as mais vulneráveis à austeridade imposta pelo OE e serão as mais atingidas e as que maiores dificuldades vão ter que enfrentar.
Quem vai ajudar estas famílias? Muitas delas recorrerão às IPSS, que já estão submetidas a grande pressão, com pedidos de apoio que não param de crescer.
Sabendo-se que o montante dos subsídios do Estado às IPSS – rubrica “Acção Social” do Orçamento da Segurança Social – vai também sofrer um corte em 2011, de 5,5%, face ao montante orçamentado para 2010, é fácil perceber que se estas entidades não encontrarem outras fontes de financiamento - a contracção da actividade económica e o clima de incerteza poderão afectar os donativos das empresas e das famílias - terão dificuldades acrescidas para responder satisfatoriamente às necessidades das famílias.
Perante um quadro em que as IPSS vão ser chamadas a uma maior intervenção, é incompreensível que o OE preveja cortar nos benefícios fiscais que lhe estão concedidos, designadamente a restituição do IVA suportado na aquisição de determinados bens e serviços, entre os quais constam a construção, beneficiação ou manutenção de instalações. Com crise ou sem crise, a sua vocação e o facto de se tratar de entidades sem fins lucrativos justifica o regime fiscal que está estabelecido.
Enfim, já nada nos deveria espantar, mas a verdade é que há sempre mais uma descoberta que não deixa de surpreender. Ainda assim, gostaria de acreditar que se trata de um engano. Ainda há tempo para o corrigir…

9 comentários:

Anónimo disse...

Uma das criticas mais comuns, que tive oportunidade de ler, nos relatórios dos especialistas europeus é precisamente "porque razão estão estas instituições a desempenhar uma função que pertence ao Estado?". Eu acho que é uma boa pergunta e como esta há muitas outras igualmente interessantes, mas na nossa realidade se não forem estas instituições a desempenhar este papel a nossa sociedade estaria perdida porque o Estado há muito que se desvinculou desta responsabilidade.

Honestamente, tenho pena que estes relatórios nunca sejam lidos por quem deve lê-los a nível nacional, porque a nível europeu eles são lidos.

Margarida Corrêa de Aguiar disse...

Cara Anthrax
Confesso que não li os relatórios que referiu, mas gostava de os conhecer.
O facto de a garantia de protecção social caber ao Estado não quer dizer, na minha opinião, que tenha que ser o Estado a executar as funções. Quando há quem faça tão bem ou melhor, a sociedade não tem qualquer ganho adicional em que seja o Estado a prestar directamente esses serviços. Há casos em que ainda o faz, mas governos sucessivos têm anunciado o propósito de contratualizar a sua prestação com entidades do sector social.
Há boas razões para que o apoio social seja realizado através da rede de instituições de solidariedade social. Não encontro realmente motivos para que o Estado se substituísse a esta rede com uma rede própria para prestar serviços sociais às populações. O importante é que na contratualização dos serviços às IPSS o Estado defenda equilibradamente os interesses das partes, tendo presente a necessidade de assegurar que os serviços são efectivamente prestados a quem deles comprovadamente precisa, com elevados padrões de qualidade e ao melhor preço e não esquecendo que são os impostos dos contribuintes que os financiam. O Estado não faria melhor, mas tem muito para fazer enquanto regulador e fiscalizador destas actividades.
Com efeito, as IPSS actuam junto das populações e, portanto, conhecem bem a pobreza, a exclusão social, os riscos sociais, os problemas concretos das pessoas concretas. A sua proximidade às populações confere-lhes um melhor conhecimento das realidades e por consequência a probabilidade de as ajudas chegarem aos cidadãos mais necessitados é maior.
As IPSS são instituições que pela sua missão de ajuda, com pessoas que nelas trabalham imbuídas de espírito humanitário, criam elos de confiança com as pessoas que às mesmas recorrem, o que permite aliviar-lhes a carga negativa que enfrentam, em que a angústia, o desespero ou a vergonha são traços que fazendo parte da intimidade inibem e dificultam a procura de ajuda.
Um traço muito positivo das IPSS é o recurso ao voluntariado que encontra a sua espontaneidade no princípio da solidariedade, que desde sempre a sociedade portuguesa cultivou e que tem vindo a ganhar novas expressões e novas causas. O seu carácter humanista é um traço que todos reconhecemos ser necessário proteger e reforçar.
As IPSS nascem espontaneamente da sociedade civil (a sua origem é aliás centenária) na procura de encontrar respostas sociais concretas, sem prejuízo da obrigação que sobre o Estado recai de garantir níveis de protecção social adequados, concretizando-o através das instituições de solidariedade social.

Suzana Toscano disse...

Margarida, receio bem que a confissão do MF tenha sido genuína, ele não sabe mesmo em que mais há-de cortar...

joshua disse...

Margarida, não faltam entorses e absurdos num orçamento segregado sobre o joelho. Nada a esperar da nau remendada socratista sobre bóias precárias do controlo mediático.

PALAVROSSAVRVS REX

Margarida Corrêa de Aguiar disse...

Suzana
Desconfio que ainda há muito por onde cortar. É preciso procurar e ter vontade.

Caro joshua
E tempo não faltou para evitar os "entorses e absurdos".

Anónimo disse...

Cara Margarida,

Pois não seja por isso!
Os relatórios (os das visitas que decorreram em Portugal e nos outros países da UE), são públicos e encontram-se disponiveis, dentro das diferentes categorias de temas em:
http://studyvisits.cedefop.europa.eu/index.asp?cid=3&artid=7456&scid=77&artlang=EN

E se quiser aqui vão alguns exemplos do que vai encontrar:

http://studyvisits.cedefop.europa.eu/assets/upload/supervisors/evr/EVR_437_PT_Europeanyear2008.pdf

http://studyvisits.cedefop.europa.eu/assets/upload/supervisors/evr/EVR_259_PT_en.pdf

http://studyvisits.cedefop.europa.eu/assets/upload/participants/End_Visit_Report/200910_EVR_110_PT_May10.pdf

Margarida Corrêa de Aguiar disse...

Muito obrigada, Cara Anthrax.
O tema da educação é também de primordial importância.

Anónimo disse...

De nada cara Margarida,

Vai ver que encontra relatos interessantes, principalmente nas visitas organizadas por Portugal.

Penso que o mais importante destes relatórios é compreender que a implementação de determinadas medidas num sector específico têm consequentemente impacto noutros sectores, porque nenhum sector é um fim em si mesmo.

No caso Português, a percepção com que se fica é que as medidas são tomadas e implementadas de uma forma avulsa sem ter em consideração as consequências das mesmas em todos sectores.

A educação não é só uma questão de primordial importância. A educação é um dos pilares fundamentais da sociedade, se nós temos "monstros" fomos nós que os criámos a golpes de medidas políticas desconcertadas, instáveis e sem rumo.Criámos, e estamos a criar, indíviduos cuja satisfação se resume à fácil obtenção de beneficíos a curto-prazo. É como se estivéssemos a criar uma geração de pensos rápidos.

Já observou bem a questão do orçamento? Tenho a certeza que sim e embora eu não saiba exactamente o que vê, eu digo-lhe o que vejo; uma palhaçada (por favor não entenda isto como uma manifestação de má-educação, mas antes como honestidade). Tudo em volta deste orçamento é uma palhaçada, são bombeiros a apagar fogos que nada fizeram para os impedir e agora acham que é da obrigação de todos ir a correr ajudar. Mais uma vez, estão a pensar no imediato. Estão a reagir a uma situação de crise que, irresponsavelmente, não anteciparam ou não quiseram antecipar e ao fazer isto puseram em causa um dos princípios essênciais do Estado que é o de assegurar o bem-estar da sua população.

Margarida Corrêa de Aguiar disse...

Cara Anthrax
Partilho das suas preocupações.
O maior problema reside no nível de desenvolvimento económico e social do país, nas disparidades da ocupação do nosso território, com um litoral superlotado e o interior desertificado, e nas desigualdades sociais da distribuição do rendimento e da riqueza, na pobreza e na exclusão social. O estado da educação não poderia deixar de reflectir o contrário. É tão atrasada quanto o país.
Temos mais educação, porque mais crianças e jovens acedem à escola, mas não temos melhor educação.
A proposta do OE não vai resolver estes problemas, muito pelo contrário, serão agravados. Para além da recessão que se advinha, é muito preocupante o impacto que os cortes nos apoios sociais e nos salários, o congelamento das pensões mínimas e a subida dos impostos vão ter nas condições de vida das famílias pobres, com baixos rendimentos, sem esquecer os desempregados e, em particular, os que não dispõem de qualquer rendimento e apoio social.