Número total de visualizações de páginas

quinta-feira, 1 de março de 2012

O insustentável erro da funcionalização das empresas públicas

Admite-se a dificuldade, mas a política do governo em relação às empresas públicas não tem sido um sucesso. As reestruturações vão demorando e as privatizações efectuadas foram apenas as óbvias. Não se conhecem contratos-programa que definam o nível de serviço exigido, com direitos e deveres pormenorizados e objectivos estabelecidos. Até ao momento, e para além dos anunciados projectos em curso, nomeadamente na área dos transportes, a medida mais notada, mas também a mais nociva, foi a da diminuição da remuneração dos gestores e a do corte dos subsídios de férias e de Natal aos colaboradores, por equiparação aos funcionários públicos.
Medida, todavia, já excepcionada para os gestores de algumas empresas públicas que se encontram em concorrência com operadores privados, certamente para evitar a fuga dos melhores que, aliás, já começou a acontecer. Mas, também aqui, há uma insustentável contradição na medida. Se se pretendeu, e bem, proteger a remuneração dos gestores, racional, lógico e obrigatório seria também preservar a remuneração dos colaboradores, atingidos pelos cortes nos subsídios. Não se vê qualquer razão lógica para este tratamento diferenciado.
Se todas as empresas devem ser bem geridas, as empresas públicas que se justifiquem deviam-no ser ainda melhor. Porque o capital pertence aos cidadãos e o serviço que prestam reflecte-se na vida diária de cada um. É por isso que deviam ter os melhores gestores, premiados se ultrapassam os objectivos, sancionados se, injustificadamente, ficam aquém do contratado. E ter os melhores colaboradores, devidamente motivados. Mas ter os melhores gestores e os melhores colaboradores é ter gestores e colaboradores bem remunerados.
O Governo tem que, definitivamente, decidir o que fazer com as actuais empresas públicas. Acabe o Governo com as que não acrescentam qualquer valor e remunere bem gestores e colaboradores daquelas que se possam justificar. Fazer o contrário e baixar salários para dizer que se fez é somente medida ilusória e popularucha, além de provocar reacções negativas das boas empresas públicas. Com todos os inconvenientes que daí resultam, para a população ou o para o governo. Declaração de interesses: não sou gestor público nem colaborador de qualquer empresa pública.

13 comentários:

Rui Fonseca disse...

Em princípio, totalmente de acordo contigo.

Mas o critério de concorrência utilizado para justificar remunerações competitivas tem muito que se lhe diga.

Que concorrência enfrenta o presidente da RTP se uma parte substancial dos seus proveitos são comparticipações pagas pelos contribuintes?

Que concorrência enfrentam as administrações da CGD, inimputáveis pelos inúmeros erros que tem cometido, por subordinação ou não aos ditames dos governos no poleiro?

Será que se o senhor presidente da CGD fosse presidente da CP, mesmo ganhando o que ganha na CGD e não o que ganha o actual presidente da CP,teríamos uma empresa ferroviária como deveríamos ter?

Se o super remunerado presidente da EDP fosse presidente do Metro, da Carris, do Metro do Porto, enfim de todos os metros desta terra, reduzir-se-iam substancialmente os resultados negativos dessas empresas?

Do que se precisa é que os ases super bem pagos mostrassem o que valem onde as coisas estão mais que tortas.

O critério da concorrência, meu caro António, quando se fala de empresas em regime de monopólio de facto (públicas ou privadas)é, desculpa a franqueza, um apito dourado.

(c) P.A.S. Pedro Almeida Sande disse...

... e pelo caminho faça-se uma verdadeira reforma autárquica, com emagrecimento real de freguesias e de concelhos.

Far-se-ia, se não se vivesse numa democracia tomada pelas clientelas partidárias que mandam o país emagrecer, enquanto até a limitação de mandatos torpedeiam.

Como se algum cidadão Português já não tivesse "topado" o real problema Português: a democracia de paródia construída em cima de gente eticamente muito bem formada, democracia de chicos espertos à Portuguesa.

E depois perguntam-se porque nenhum Português tem respeito por este sistema partidário.

Margarida Corrêa de Aguiar disse...

Caro Dr. Pinho Cardão
Completamente de acordo. As empresas públicas devem ser tão bem geridas como as empresas privadas, estejam ou não em mercados concorrenciais. Quem gere bem deve ser bem pago e premiado pelos resultados alcançados e responsabilizado pelos maus desempenhos. Se acrescentarmos, as reformas sectoriais programadas, as reestruturações que é preciso fazer nas empresas públicas, as privatizações que é necessário preparar, apenas para citar situações que caracterizam um quadro excepcional de grande exigência, compreendemos que precisamos de gestores competentes. Mas custam dinheiro. Haverá fuga de gestores e dificuldades em os contratar. São os mesmos que o sector privado contrata.

Tonibler disse...

1. Empresas de foro privado (com intuito de lucro) com capitais públicos.

Das duas uma, ou são empresas exportadoras e não faz sentido o estado participar nelas fora de um investimento de fundo de pensões ou coisa do género, porque produzem para fora; ou são empresas que vendem para dentro, e não faz sentido o estado lucrar com a venda aos seus accionistas, pelo que o estado não deve participar delas fora de um investimento do tipo fundo. Em ambos os casos, não faz sentido haver gestores nomeados pelo estado.

2. Empresas de serviço público com capitais públicos.

Não faz sentido que os privados produtores de um serviço público possam decidir sobre o preço desse serviço. Assim, os funcionários que prestam serviços públicos não deveriam votar ou, alternativamente, a prestação de serviços públicos é posta a concurso aos privados que não podem votar, privados de natureza colectiva. Neste sentido, também não faz sentido ter gestores públicos.

Finalmente, a CGD nos últimos 5 anos representou um encargo para o contribuinte de mil milhões de euros, admitindo que os angolanos vão conseguir pagar os 5 mil milhões que estão enterrados no BPN. E estamos a falar da CGD, que é noticiada como a melhor das empresas públicas... Não há boas empresas públicas!

Joao Jardine disse...

Caro Pinho Cardão

A sua formulação do probelma é um erro de paralaxe.

a) Existem cerca de 972 grandes empresas. Se considerar a existência de 10 gestores de elevada craveira (o que quer que isso seja), teremos 10.000 gestores. Como os privados não vão absorver as "fugas", estamos numa situação de crowding out de RH que, a "lei" do equilibrio da oferta e da procura, se irá encarregar de ajustar. A falácia da "concorrência com o privado" está desfeita; neste caso aproveito as palavras do Senhor PM e proponho que emigrem.
b) Capitalismo sem falência é como religião sem pecado, passa a ser licenciosidade, o mesmo se pode aplicar a uma democracia sem ética. Quando não existem condições objectivas sejam elas políticas ou económicas (é um argumento discutível) para se poder impor a falência, terá sempre de ser substituída pela demissão ou pela acusação em sede de direito criminal; a ética serve, exactamente para isso.
Dito isto, e desta perspectiva, o governo terá, já em Maio/Junho, de terminar a tarefa mais importante e essencial, (re) introduzir a ética e a diferenciação na economia, em especial no sector dos designados bens não transacionáveis.
Neste país antropologicamente igualitário, vai ter de aprender que, nem os homens perderam a inocência original nem, o modelo de capitalismo que se está a impor, pode sobreviver sem desigualdade.
Desta perspectiva, muito do que se está a passar em Portugal pode se explicado, a começar pela curiosa transversalidade dos interesses.
Cumprimentos
joão

Pinho Cardão disse...

Caro Rui:
1. O critério da concorrência aplica-se apenas nos casos em que é aplicável. La Palisse não diria melhor.
2. Também não tens dúvidas, apesar do que referes, que um bom líder faz forte a fraca gente e apresenta melhores resultados do que um fraco líder. A liderança é relevante.
3. Os contratos-programa são decisivos nas empresas públicas. Sem eles não se pode medir a performance dos gestores, nem o cumprimento dos níveis de serviço.
4. Continuo a pensar que a baixa de salários dos gestores públicos se vai repercutir na qualidade do recrutamento e da gestão.

Caro Tonibler:
1. Quanto ao ponto 1, total acordo
2. Quanto ao ponto 2, não entendi muito bem. Mas se recomenda a concessão de serviços públicos a entidades privadas, também concordo. Obviamente.
3. Caixa Geral de Depósitos
Dá pano para mangas. Refiro apenas que uma crítica global não se pode fazer tomando como padrão os resultados de um ano.

Caro João Jardine:
Não vou muito longe de si em muitos dos aspectos que refere.
Aliás, um dos problemas da nossa economia é que as empresas em Portugal nascem, crescem, vivem, mas raramente morrem. Uma falência não é encarada no seu verdadeiro significado, pelo que, à mínima ameaça, logo aparecem todos os procedimentos protectores. Em geral, tais situações levam a que as empresas vegetem, façam concorrência desleal, não paguem impostos, tornando-se um peso para a economia. Uma falência a tempo, penalizando o capital que não soube gerir, é a melhor forma de preservar, em outras mãos, os recursos tecnógicos e humanos existentes.

Tonibler disse...

Caro Pinho Cardão,

Quanto à CGD estamos a falar dos resultados acumulados dos últimos 5 anos para o estado. mil milhões de euros negativos resultantes do net entre as valorizações do capital por incorporação de resultados e aumentos de capital, acrescidos dos custos de oportunidade do capital inicial dos 5 anos. O accionista estado nunca foi buscar dividendos nestes últimos 5 anos. E estou a falar dos últimos 5 anos porque não encontrei as contas dos anos anteriores, porque então deve dar uma bela conta... 5 anos, já é padrão?

Anthrax disse...

Iiiiiiiiiiiiiiiiii... concessão de serviços públicos a entidades privadas, é como pagar às escolas particulares pelos alunos excedentários que já não têm vagas nas escolas públicas. Dá um asneirão gigantesco.

Mas se acham giro subsidiar parasitas, por mim na boa. Desde que estejam preparados para, mais cedo ou mais tarde, levarem uma valente dentada, quem sou eu para contrariar :)))

Tonibler disse...

Que republicana, camarada Anthrax!! Isso significa que os 700 mil parasitas que hoje trabalham para o estado são considerados privados acima dos outros privados todos ou são parasitas iguais aos outros parasitas todos? É que alguma razão deve haver para termos défice...

Aquilo que vejo é que pago a 700 mil privados, não tenho nada em troca e cada vez que quero alguma coisa, fazem greve. Isto é dentada a sério ou é só amor???

Ilustre Mandatário do Réu disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Ilustre Mandatário do Réu disse...

A teoria do Pinho Cardão até parece boa (se bem que claramente desmontada e clarificada pelos comentadores).

Mas a realidade dos factos é que estas empresas não dão lucro, são um fardo para o contribuinte. Há por isso que saneá-las, começando pelo mais fácil que é reduzir salários.

Mais, a redução de custos salariais no público em concorrência com o privado levaria a uma pressão de descida de custos de trabalho também no privado. O que é bom para a productividade destas últimas.

O argumento comunista da qualidade e dos salários não tem pés nem cabeça.

Quem diria... com todo o respeito, o Pinho Cardão parece-me um Arménio Charles da CGTP versão empresas públicas. Depois queixe-se se lhe aumentarem os impostos para pagar a sua "teoria"...

Pinho Cardão disse...

Caro Ilustre Mandatário do Réu:
Por essa é que não esperava.
Enfim, temos que estar preparados para tudo!...

Ilustre Mandatário do Réu disse...

Caro Pinho Cardão,

Inclusive para a sua lógica ;)

Mas já agora, o meu amigo cavaquista dos 4C(ostados) parece, neste seu artigo, em franca divergência com o Presidente da República.

Pois o PR afirmou e bem:


A justiça na repartição dos sacrifícios tem de ser uma marca da governação que agora se inicia.

[...]

À legitimidade para reclamar sacrifícios tem de corresponder uma cultura do exemplo, assente em valores éticos e princípios de serviço público.


O meu amigo defende neste seu artigo exactamente o contrário.

Cumprimentos