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quinta-feira, 7 de junho de 2012

A casa da sombra (folhetim diário talvez em 5 episódios) - 1º episódio

O Verão está à porta e o folhetim da crise vai-se embrulhando sem fim à vista. Daí a ideia de retomar os folhetins mais ou menos românticos, com a grande ambição de não esgotar a paciência dos leitores enquanto não se vê o epílogo. Aqui fica.

1º Episódio
Chegou à casa pela vereda poeirenta onde já não devia passar um carro há muito tempo. A aldeia distava dali poucos quilómetros, mas o caminho que levava até àquele ponto da encosta antecipava o abandono e o esquecimento a que estava votada a pequena propriedade que o sogro, sabendo do desinteresse do filho, deixara ao neto em testamento. Ainda lá tinham ido, uma vez por outra, depois da morte dele, era o garoto ainda pequeno, para abrir a casa e trocar dois dedos de conversa com os caseiros que aí viviam, numa casita afastada, e que tiravam do cultivo daquele campo todo o seu sustento. Com o tempo, foram espaçando cada vez mais as viagens mas alarmaram-se quando lhes soou que corria na aldeia o rumor que a casa estava assombrada, e desistiram de vez. Contavam que se ouviam gemidos e ralhos durante a noite, numa inquietação tremenda, seria talvez o antigo dono que, inconsolável pelo desleixo da família, voltava uma e outra vez para habitar a casa. Os velhos caseiros nunca deixaram as terras, mas a aldeia voltou costas ao lugar e todos evitavam usar o caminho que passava rente ao portão.
Nem por isso ela hesitou quando tomou a decisão de sair da casa de Lisboa e se afastar, quem sabe por quanto tempo, para viver longe do sufoco dos dias destemperados, enredados em problemas que se encadeavam uns nos outros, por insensatez e incúria do marido e indiferença do filho já homem. Sentia-se atolada e impotente, sempre confrontada com dramas de que nem suspeitava, num sorvedouro que tornava inúteis os gestos de defesa ou os esforços para os resolver. Num lindo dia que antecipava a Primavera, declarou sem aviso prévio que ia para a quinta e que tencionava lá ficar até retemperar as forças e a paciência, deixando os dois homens incrédulos mas incapazes de se opor à sua decisão.
A porta principal rangeu quando a abriu, dolorosa de humidade, e a poeira sobressaltada dos móveis fê-la tossir violentamente, enquanto lutava para forçar as portadas inchadas das janelas. Quando, finalmente, o sol entrou às escancaras, pareceu-lhe que a casa se abria num sorriso acolhedor e, pela primeira vez em muito tempo, sentiu desfazer-se a amargura que lhe pesava no peito e acreditou que seria possível sentir-se em paz consigo própria. (continua)

7 comentários:

Bartolomeu disse...

Uma amiga, bancária, sufocada com a vida profissional e familiar, decidiu tal como a protagonista da estória, negociar a saída do banco, deixar a casa de Lisboa e ocupar uma quinta que a família possui na zona de Torres Novas.
O marido, bancário também, preferiu continuar em Lisboa, intímamente convencido que a mulher, dentro de uns dias, estaria de volta.
Mas não, aquela mulher, frágil e deprimida, renasceu. Ocupou-se em primeiro lugar com a reconstrução e adaptação de uma casa de apoio à casa principal. Fez daquele cantinho a sua habitação e o seu refúgio. Depois, passou a ocupar-se, apoiada nos conhecimentos dos caseiros, à recuperação agrícula da vasta área de terrenos que compõem a quinta. Contactou as entidades competentes, apresentou projectos, candidatou-se a apoios comunitários, mandou fazer furos de água, instalar bombas e regas.
Em poucos meses tornou a quinta novamente produtiva e lucrativa e ela, readquiriu a vontade de viver. O marido passa os fins de semana na quinta, os filhos também a visitam, acompanhados dos netos, o que fêz com que adquirisse alguns animais, entre ovelhas, galinhas, patos, coelhos e até um cavalo. Novos projectos não cessam de nascer no espírito daquela mulher, sempre pronta a aprender e a arriscar. Afinal, aquilo que torna a vida mais interessante e nunca monótona.
Será que dentro de pouco tempo, veremos aprecer nas montras das livrarias um livro escrito por Suzana Toscano?
Espero que sim!

Suzana Toscano disse...

Bem, caro Bartolomeu, olhe que eu já tenho o folhetim pronto, estou a ver que há por aí muitas heroínas a dar o mesmo mote :) Vamos ver se o destino das duas é o mesmo, mas eu estou bem lembrada das recomendações do caro Pinho Cardão e da Catarina de que não queriam aqui dramas... a ver vamos. Se resultar, juntamos as duas protagonistas e talvez as livrarias tenham novidades :)Cá espero os seus comentários e críticas, assim a revisão das provas já fica adiantada!

Catarina disse...

: )
Aqui estou para continuar a leitura...
Abraço

Margarida Corrêa de Aguiar disse...

Suzana
Obrigada por partilhar connosco este conto. Promete! Mas não nos deixe muito tempo em suspense. Pertenço ao grupo dos leitores que não gostam de dramas, prefiro finais felizes ainda que pelo meio aconteçam coisas menos boas.

Bartolomeu disse...

Cara Dr. Margarida, uma libertação, nunca constitui um drama, mesmo que alguns sentimentos tenham de ser sacrificados em seu nome...
;)

jotaC disse...

Aguardemos então o epílogo...

Suzana Toscano disse...

É verdade, caro Bartolomeu, mas enquanto a libertação chega e não chega sofre-se um bom bocado com a incerteza, veja lá como o caro jotac já está aqui a pedir o epílogo :)