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quarta-feira, 4 de abril de 2012

Acabou este modelo social ou este modelo europeu?

Rezam as crónicas que o presidente do BCE terá hoje declarado que o modelo social europeu está morto. Já não me espanto que, perante a desorientação que grassa entre os dirigentes políticos, seja o presidente de um banco (apesar de ser um banco especial) e não um responsável político, a avisar do óbito. Mas mesmo sendo Draghi a lançar a questão deste modo, valeria a pena aproveitar a ocasião que o choque da declaração vai proporcionar, e refletir no que está verdadeiramente em causa, que é, afinal, não somente o modelo social, mas todo o modelo de construção europeia. A começar pela questão da sustentabilidade de uma união política, económica e social de uma Europa com quase 30 quadros constitucionais distintos e economias com estruturas muito diferentes (admitindo que a diversidade cultural não constitui forte condicionamento, o que não é líquido se se consumarem as admissões de alguns Estados que pretendem integrar a UE). Ou se o deficite de legitimidade democrática da maioria das instituições decisórias europeias favorece o esbatimento das diferenças, sendo que pensar construir uma união com diferenças acentuadas de nivel de desenvolvimento entre os Estados é uma quimera. Ou ainda se os acréscimos de custos de contexto que a burocracia europeia continuadamente decreta, permitem o aumento da competitividade da própria Europa mas em especial dos Estados economicamente mais frágeis no quadro da economia global, onde já se descobriu que a vantagem está do lado de quem há muito percebeu que há luxos na regulação social que se pagam muito caro.

Haverá quem esteja disponível para fazer este debate? Tenho dúvidas.

7 comentários:

Anónimo disse...

Caro Ferreira de Almeida, tenho para mim e há muitos anos que esse debate irá fazer-se, sim. A posteriori, quando todos estiverem a culpar todos do castelo de cartas ter caído com um estrondo que será ouvido em todo o planeta.

Bmonteiro disse...

Dou-lhe mais dez, quinze anos, para implodir.
Decorre agora, concurso para uma mão cheia de bons empregos na UE.
É o que tem animado a malta do Zé, pois, o nosso Zé.
Zurich, já respondeu.

jotaC disse...

Caro Drº Ferreira de Almeida,
Se excluirmos este srº que não tem responsabilidades politicas, não estou a ver alguém de dentro, isto é, um país da união vir questionar este modelo. Contudo, aparentemente o modelo já está a em causa, senão vejamos as medidas tomadas pelos países. Portanto, acho que o percurso que se segue ditará, ele próprio, a continuação ou o fim do projeto europeu, tenho para mim o seu fim.

Rui Fonseca disse...

Numa entrevista ao Wall Street Journal, Draghi, a propósito do modelo social europeu afirmou:

"You know there was a time when [economist] Rudi Dornbusch used to say that the Europeans are so rich they can afford to pay everybody for not working. That's gone,"

O estado social europeu, travejado pela solidariedade e pela inclusão, sustentou-se no crescimento económico e no pleno emprego. Paradoxalmente, contudo, é quando aquelas traves começam a gemer com o peso e a ameaçar ruptura que uma questão se coloca:
Que convivência social pode esperar-se quando o crescimento económico estagna e o desemprego explode, se a solidariedade deixar de existir e a exclusão marginalizar?

Que modelo de sociedade pode garantir uma convivência que permita evitar a guerra? Porque, contrariamente ao que afirma Draghi, tendencialmente o trabalho, em consequência das conquistas científicas e do engenho dos homens, será um bem cada bem cada vez mais escasso.

E a discussão que se coloca não é, salvo melhor opinião, sustentar este ou outro modelo que garanta a convivência pacífica na Europa, mas o modo como garantir que esse modelo não seja exclusivamente europeu.

Caso contrário, o modelo será chinês um dia destes.

O que está em causa, antes de mais, é a globalização e o que é mais urgente é o seu reenquadramento. Se não, a trajectória será descendente até ao ponto (longínquo) em que ela se inverterá.

O que se passa na União Europeia, com as contradições que refere, é um caso particular das consequências mal reguladas de globalização.

Salvo melhor opinião.

Suzana Toscano disse...

Decretar a morte do modelo social europeu é uma forma brutal de reduzir expectativas e ir aliviando a pressão social que se adivinha crescente em Itália. O que eu gostaria de ver, e é isso que se espera de um político europeu que lidera um dos mais importantes países da Europa, é como é que ele propõe a sequência, se o modelo morreu o que é que se vai construir em vez dele, ou vai tentar salvar o que puder, e assim sucessivamente, até voltarmos à miséria e à desproteção social que ditou o modelo social europeu? Não percebo bem estas declarações bombásticas, ou é uma desistência pura e simples da política?

Joao Jardine disse...

Caro JMFAlmeida

O financiamento do "modelo social europeu", supõe o incremento líquido de população.
O aumento da longevidade, por si só, não compromete o modelo, já a taxa negativa de natalidade sim.
O Sr Draghi, perdoe-me a franqueza, limitou-se a verbalizar a inferência óbvia e, no que à oportunidade respeita, veio tarde.
Sobre a sobrevivência do atual sistema político europeu, não percebo onde se encontram as dúvidas.
A adesão à moeda única é um caminho sem regresso quer do ponto de vista formal, não existem mecanismos de saída, quer do ponto de vista substancial: corresponderia ao eclodir de uma crise global sem paralelo.
No que respeita à contribuição para a sustentabilidade do modelo social europeu, com a nossa natalidade declinante, Portugal está na linha da frente dos responsáveis do fim do mesmo;
Sobre a viabilidade do sistema europeu, as elites nacionais, junto com as congéneres europeias são os responsáveis únicos; perorar sobre a falta de democracia é não recordar o comportamento escandaloso que, no passado, as elites assumiram quando os eleitorados europeus não validaram as escolhas.
Por isso, permita-me concluir com o seguinte comentário: temos por opção o que merecemos.
Cumprimentos
joão

(c) P.A.S. Pedro Almeida Sande disse...

A construção europeia é imparável porque é a guarda avançada do próprio processo de globalização e de um nova abordagem à relação de sustentabilidade do homem com o planeta e consigo próprio.

A Europa sempre se construiu na crise e mesmo em períodos de interrupção seguirá dentro de momentos.
O que a Europa precisa hoje é de instrumentos vitais de estratégia. A chamada ao curto prazo, sacrifica a visão mais longa da Europa, sacrificando o adquirido do sentimento de pertença. Nas empresas, as falhas de competitividade actuais são quase sempre fruto de erros do passado - em especial a falta de capacidade de reconhecimento e e exploração dos valores que integram a perspectiva aprendizagem e crescimento. E é por isso que a Europa precisa hoje de instrumentos vitais de estratégia, assentes em formas audazes de gestão do conhecimento.
Assim o modelo que aparenta acabar não é o modelo europeu mas apenas um modelo social que se irá adaptar aos tempos e que está apenas em fase de avaliação e de convergência estratégica dos seus membros.