Acabei de adquirir uma tradução em português de uma obra de H. Fournier, efectuada por Narciso Alberto de Sousa: “ O onanismo – suas causas, perigos e inconveniente para o indivíduo, família e sociedade: - remédios” (Coimbra, 1879). É notável o conteúdo desta obra, no que respeita à quantidade de asneiras, pseudo-interpretações, princípios moralistas, numa época em que devia haver um certo grau de liberdade intelectual e de respeito pela ciência. Um bom exemplo de anti-ciência que me fez recordar um pequeno texto que escrevi há algum tempo sobre tão ancestral prática.
Nesse tempo Judá desceu de entre seus irmãos e entrou na casa dum adulamita, que se chamava Hira, e viu Judá ali a filha de um cananeu, que se chamava Suá; tomou-a por mulher, e esteve com ela. Ela concebeu e teve um filho, e o pai chamou-lhe Er. Tornou ela a conceber e teve um filho, a quem ela chamou Onã. Teve ainda mais um filho, e chamou-lhe Selá. Estava Judá em Quezibe, quando ela o teve. Depois Judá tomou para Er, o seu primogénito, uma mulher, por nome Tamar. Ora, Er, o primogénito de Judá, era mau aos olhos do Senhor, pelo que o Senhor o matou. Então disse Judá a Onã: Toma a mulher de teu irmão, e cumprindo-lhe o dever de cunhado, suscita descendência a teu irmão. Onã, porém, sabia que tal descendência não havia de ser para ele; de modo que, toda vez que se unia à mulher de seu irmão derramava o sémen no chão para não dar descendência a seu irmão. E o que ele fazia era mau aos olhos do Senhor, pelo que o matou também a ele (Génesis 38:1 – 38:10).
É muito provável que esta história tenha condicionado muitas das atitudes e interpretações populares e médicas acerca do onanismo.
Até ao final do século XVIII pensava-se que o esperma era fabricado pelo cérebro, descendendo para se acumular nos testículos.
O esperma era considerado como um “licor” muito precioso, pelo que era necessário não desperdiçá-lo e, consequentemente, deveria ser reservado para a procriação. Além disso, era “bombeado” para a circulação geral redistribuindo a sua riqueza e qualidades por todo o corpo. Face a estes argumentos não é de admirar o aparecimento de diferentes técnicas destinadas a impedir que se vertesse tamanha preciosidade. Infusões, dietas, colchões especiais, corpetes tipo armadura, cinturões dos mais diversos tipos e até aparelhos destinados a acomodarem os pénis com tamanhos diferentes (havia já respeito pelos aspectos ergonómicos), feitos de latão, os mais baratos, até aos de prata! O assunto era de tal modo relevante que suscitava a elaboração de trabalhos “científicos” destinados a provar o perigo para a saúde de tal prática (caso do famoso Tissot com as suas obras: “O onanismo”, dissertação sobre as doenças produzidas pela masturbação ou “Aparelhos cirúrgicos de Misericórdia contra o onanismo”, entre outras).
Em meados do século XX estes conceitos ainda estavam bem presentes. Basta ver a obra de Eugene Steinach que propunha a vasectomia, precisamente para evitar que se perdesse o esperma e desta forma contribuir para o rejuvenescimento. Foram muitos os que se sujeitaram a esta “poupança” seminal, mas não enriqueceram em termos de juventude. Este conceito não é apanágio do mundo ocidental. Quem diria que já vigorava na antiga China, e, segundo os médicos chineses, o melhor era fazer amor sem ejacular! Paciência de chinês!
Hoje, sabe-se que não há qualquer prejuízo, pelo contrário, até pode ser benéfico. De facto, um trabalho recente, realizado na Austrália, sugere que, quanto mais vezes um homem ejacula — sobretudo entre os 20 e os 50 anos — menor é o risco de contrair cancro da próstata. Discute-se quais as razões para este efeito “protector”. Provavelmente, a ejaculação impede as substâncias cancerígenas de agredir a próstata, além de sofrerem uma forte concentração naquele órgão. A hipótese de estagnação prostática carece de confirmação, como é óbvio.
Se Onã tivesse tido conhecimento deste trabalho poderia ter respondido ao Senhor quando lhe perguntou: — Onã, Onã, o que estás a fazer?!
— Prevenção Senhor, prevenção!
Não tinha provavelmente sido morto e as “coisas” teriam sido muito diferentes….
2 comentários:
A propósito, não há nenhum grupo pró-vida que se oponha ao onanismo? Está mal, tanta semente de vida espalhada pelos 4 cantos do mundo...E havia tanto a comentar sobre o onanismo, mas vou parar...
Ora aqui está um assunto que merece discussão aprofundada.
After you, Toni!
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