Na última edição deste programa da RTP1 esteve em debate a questão do futuro do País, com especial incidência na questão económica e financeira e destaque para a complexa situação das finanças públicas.
Do referido painel de oradores, mal escolhido para não variar, salientou-se o Dr. Medina Carreira (MC) pela forma desassombrada como apresentou os seus pontos de vista e como profetizou o futuro negro que nos espera.
Eu não tive possibilidade de ver o programa na íntegra, mas acompanhei algumas passagens da intervenção do Dr. MC, tendo-me apercebido do estilo algo apocalíptico das suas previsões.
Troquei entretanto impressões com algumas pessoas que viram o programa, de diferentes tendências e até idades, e em todas elas encontrei a mesma inquietação quanto ao futuro profetizado pelo Dr. MC.
Será mesmo assim? Perguntaram-me. Será que o Estado vai chegar a um tal grau de insolvência que deixará de poder pagar as pensões de reforma por exemplo? Ou os salários da função pública?
Procurarei, em breves linhas, explicar que, estando de acordo com o Dr. MC no diagnóstico da nossa dificílima situação – tenho usado a expressão ALERTA VERMELHO para caracterizar o alto risco em que nos encontramos - não partilho porém da visão apocalíptica da sua profecia.
Com efeito, se não fossemos capazes de resolver o problema do crescimento da despesa pública – que, pelo menos de acordo com a informação mais recente, de Abril, continua sem controlo – chegaria o momento em que a situação se tornaria verdadeiramente crítica.
Vivemos neste momento um período de expectativa, que pode durar mais uns meses, justificado pelas medidas anunciadas pelo Governo em algumas frentes, no sentido de travar o crescimento insustentável da despesa e de cumprir as metas de redução do défice público prometidas a Bruxelas – não mais de 4,6% do PIB em 2006, não mais de 3,7% em 2007 e não mais de 3% em 2008.
Todavia, aquele período de expectativa terminará, mais cedo ou mais tarde, se vier a verificar-se que o grau de execução das medidas anunciadas é insuficiente para cumprir satisfatoriamente os objectivos assumidos.
Aí começaria outro problema que consistiria na revisão para baixo da qualidade do risco atribuído à Republica Portuguesa, por parte das agências internacionais de rating, com o consequente agravamento da taxa de juro que o Tesouro português teria de pagar em novos financiamentos para cobertura do défice.
Se a situação mesmo assim não ficasse resolvida, persistindo o descontrolo, o risco da Republica voltaria a ser aumentado e os juros subiriam novamente.
Esta operação repetir-se-ia as vezes que fossem necessárias até que, vergados ao peso insuportável da dívida, teríamos mesmo de mudar de rumo, nem que para isso fosse necessário, por exemplo, mudar a Constituição.
Este processo pode estender-se por 2,3 ou 4 anos, mas será inevitável caso não tenhamos capacidade para corrigir, de forma autónoma e voluntária, o excesso de despesa pública.
Mas a inevitabilidade desse processo, que teria custos muito elevados não tenhamos ilusões, assegura que o cenário apocalíptico do Dr. MC não seja possível.
Para não ser muito longo, deixo para próximo post algumas observações complementares.
10 comentários:
"Mas a inevitabilidade desse processo, que teria custos muito elevados não tenhamos ilusões, assegura que o cenário apocalíptico do Dr. MC não seja possível"
E não se pode dar o caso da actuação correctora do mercado, através do aumento da taxa de juro a suportar pelo Tesouro português, não ser suficientemente rápida para travar a tempo esses níveis de endividamento?
E sob esse peso da dívida não seriam despoletadas acções por parte do estado, que teriam o potencial de desencadear um nível de desordem social que poriam em causa a organização actual do estado?
Basta ler as vozes que já hoje se levantam: http://www.negocios.pt/default.asp?CpContentId=276987
Camarada Reis Soares,
A solução Cadilhe não faz qualquer sentido. Se quiser eu, dessas, lembro-me de 20.
Camarada Tavares Moreira,
Existe um pressuposto em toda a análise que é a independência nacional, isto é, que Portugal continuará a existir como país independente. Coisa que, atendendo ao grau de conforto artificial em que vive a população portuguesa, não me parece viável de pôr de lado. De resto, há sempre a solução de mandar o Euro às urtigas que toda a gente acha má mas que ainda não vi ninguém com uma solução melhor e legal.
Caro Reis Soares,
O seu especialista não enterrou o país, mas que mandou umas pázadas, mandou. Se é deste tipo de soluções que procura não entendo as suas queixas.
Segundo o dr T.Moreira, que não viu todo o debate, julgo que durou mais de 2 horas e meia, o dr MCarreira teria ou tem uma visão apocalíptica do futuro para País. Segundo outros, de diferentes sensibilidades e idades, que ouviu depois, as opiniões eram coincidentes com a do dr MC. Porque, como disse Reis Soares, o dr MC apresentou nºs. E sublinho o que disse ainda RSoares, "ele tem a coragem de os apresentar, os restantes economistas, e homens das finanças acham"! Exceptuam-se Cavaco Silva, que sempre foi corajoso e muito pessimista,desde 98, ou memo antes, Manuel Ferreira Leite, com todos os inimigos que tem, e poucos mais.( gostava de ouvir o 1º min das finanças do actual governo, Campos e Cunha, competente e sério e se demitiu quando se apercebeu de algo). É por andarem todos a achar, que isto chegou aqui. Porque todos procuram o politicamente correcto, e anseiam por um lugar, algures por aí. Respeito muito o dr Silva Lopes mas, neste programa, ao contrario de outro, há 2 anos, com o mesmo mote e com a presença de SL e MC, onde o seu discurso foi concreto, acusador e catastrofista, desta feita surge muito sereno e fugidio. Quando a situação se agravou e nos coloca na cauda da Europa. Porque terá mudado? Alguns paliativos por aí apresentados, serão soluções de 10 a 15% dos nossos problemas. Os outros 85/90% continuam a agravar-se.
Admiro o dr MC porque estuda e vive estas questões. Os eus funs de semana, são a fazer contas. Por isso concretiza as suas previsões. E não as apresentou todas. Sei que tem nºs que não divulgou mas, mais tarde ou mais cedo, eles serão do conhecimento público. Gostaria de ver, depois os especialistas a rebater, tb com nºs e com dados concretos, as suas contas.
PS- Sou um mau espectador de Tv, porque a vida não o permite. Por isso apareço por aqui apenas noite e tarde. Hoje houve excepção. Mas considero este espaço do Pros e Contras, sem dúvida, o melhor programa de debate existente na TV Portuguesa nos ultimos anos, ou mesmo, atrevo-me a dizer desde sempre, com limite no tempo 80/85. Antes disso não conta por razões por demais conhecidas. Pela coragem de debater temas polémicos e, principalmente, pela qualidade, em geral,dos convidados que ali vão. Opinião, tambem de todos ou quase todos que conheço, quando o tema vem à conversa. Hoje, as grandes figuras deste País, querem ir ao Pros e Contras. Como escrevia há dias, poucos, um jornalista de opinião, no Correio da Manhã, este programa atingiu um nível de topo mundial, na forma e na substância. Natural a discordância de muitos ou de alguns, cada qual pelas suas razões. Mas, afirmar que o programa sobre Economia e o Futuro do País teve um mau painel, "como é habitual", parece-me injutíssimo e, confesso, estranho, vindo de alguem como o dr Tavares Moreira, que parece e sempre o vi como homem, profissional e politico de bom senso e equilibrio nas opiniões.
É uma ficção alimentar-se a esperança de que as medidas do governo poderão travar o crescimento da despesa.
Para quem tinha algumas dúvidas sobre a "tal vontade" do governo creio que elas ficaram desfeitas aquando do recuo na extinção dos dezoito governadores civis.
Veja-se agora o que acontece com o PRACE.
A DGV vai ser extinta , só que, parte das suas competências vão passar para o Instituto de Transportes Terrestres e para o Instituto de Infra-estruturas Rodoviárias criados no Ministério de Obras Pública e Comunicações, e que as restantes competências ficarão na dependência de um novo organismo, o Gabinete de Segurança Rodoviária.
Afinal em que ficamos, mais Estado ou menos Estado? Mais coordenação ou menos coordenação? Mais eficácia ou menos eficácia? Mais burocracia ou menos burocracia? Mais despesismo ou menos despesismo?
Será que a extinção da CP e o seu desdobramento em três empresas autónomas teve como consequência uma melhor gestão, menos custos de exploração e uma maior coordenação entre elas? Os sindicatos afirmam que não. E com a JAE, que se desdobrou igualmente em três empresas? Os administradores nomeados pelo Governo sem dúvida que triplicaram mas será que a eficácia, a coordenação, a produtividade e os custos para as mesmas realizações diminuíram?
A lógica despesista da nossa classe politica é irreversível.
Camarada Tonibler,
O camarada Reis Soares está um bocado... "dissidente", não está?
A dizer que há quem perceba mais sobre qualquer assunto do que o Toniteam?
Convoque-se reunião do blogue!
Caros Comentadores,
Registo, com muito interesse, as diferentes reacções ao post do Prós e Contras.
Três ou quatro comentários apenas, para procurar clarificar o tema deste nosso debate.
Em primeiro lugar, recordo-lhes a concordância que deixei expressa em relação ao diagnóstico real do País apresentado pelo Dr. M.C.
Salientei também o carácter desassombrado do seu depoimento, contrastando com os de outros participantes.
A única divergência, que mantenho, tem a ver com a conclusão final, que sugere a possibilidade de se vir a verificar uma situação de bancarrota do Estado, com a suspensão de pagamentos de pensões ou de vencimentos.
Na minha análise, isso não poderá vir a suceder, pois antes de lá chegarmos funcionariam mecanismos, sobretudo pelo lado do mercado financeiro, de correcção do processo de degradação das finanças públicas a que temos vindo a assistir.
Esses mecanismos, que resultariam do agravamento do risco atribuído à Republica Portuguesa, enquanto emitente de dívida nos mercados, podem vir a ter custos muito elevados, mas acabariam sempre por travar a emergência de uma situação de bancarrota.
Haverá ainda outros mecanismos como as ameaças de sanções por parte dos órgãos responsáveis da U.Europeia, mas já se percebeu que a força coactiva destes deixa bastante a desejar.
A impossibilidade política de agravar ainda mais os impostos será outro mecanismo. Chegamos a um ponto em que um agravamento adicional de impostos teria custos políticos elevadíssimos.
Assim, como travão fundamental, teremos o mercado financeiro em última análise.
É pois este o meu ponto de divergência, que não percebo tenha suscitado alguns comentários pouco simpáticos por parte de um comentador, que quis meter-me num “saco” de maus servidores da Pátria que, confesso, me incomoda particularmente - por sentir que é uma tremenda injustiça, apenas por isso.
Quanto ao Dr. M.C. quero ainda dizer que, não obstante a divergência apontada, e ao contrário do que alguns opinam quando o acusam de derrotismo, considero que ele tem vindo a prestar um relevante serviço ao País, chamando a atenção, com grande objectividade e frontalidade, para os problemas graves que enfrentamos.
E espero que continue, com o mesmo desassombro e objectividade, só teremos a ganhar com isso. Portugal deverá agradecer-lhe.
Um último apontamento para reconhecer que exagerei no comentário à escolha dos painéis de comentadores para o Prós e Contras. Embora mantenha a minha discordância em relação à composição deste painel, isso não me dava o direito de generalizar e de dizer “mal escolhido para não variar”. Não me custa confessar o excesso.
Caro LMSP,
Sem dúvida, a aplicação de sanções por parte da UE - ou mesmo a simples ameaça - seria sempre desprestigiante para o País, abalando o orgulho nacional e diminuindo-nos aos olhos do Mundo.
Isso deverá constituir um factor adicional de travagem da degradação das nossas finanças públicas como referi no meu anterior comentário.
Mas o mais eficaz, minha opinião, será sempre a punição dos mercados financeiros, forçando-nos a pagar um preço crescente para financiar os nossos excessos.
Ena, caro T Moreira:
O seu post provocou uma interssantissima reflexão que todos precisamos de fazer. Infelizmente nem todos vêm por aqui. Lendo as nossas verdades e as nossas incorrecções e análises, mesmo que erradas. Mas o que é preciso é colocar as gents a pensar! Passo ao meu comentário que não tem cariz político, financeiro. É só uma reflexão realista, procurando fugir aos conteúdos técnicos, que , aliás não domino para trocar impressões com um especialista.
Era o que eu dizia no meu post anterior, quando falava "simbolicamente" de "engenharias financeiras". Punição dos mercados financeiros, para pagar os nossos excessos!
...(cito)"Esses mecanismos, que resultariam do agravamento do risco atribuído à Republica Portuguesa, enquanto emitente de dívida nos mercados, podem vir a ter custos muito elevados, mas acabariam sempre por travar a emergência de uma situação de bancarrota."
...(cito)"sanções por parte dos órgãos responsáveis da U.Europeia". Essas sanções só nos obrigariam a tomar as medidas que entretanto se querem adiar!
...(cito)" um agravamento adicional de impostos teria custos políticos elevadíssimos"
Politicos? Mas o problema é económico, é de sobrevivência dos mais velhos, dos pensionistas, dos desempregados! Não é politico. Sejamos realistas caro Dr. O mal é vermos a política e os interesses políticos a comandar tudo. Por essa razão, nunca teria havido a Perestroika, o 25 de abril, a alteração de regime franquista espanhol, etc. O que é necessário é termos bons politicos a comandar a gestão do País. E isso talvez falte há uns anos.
Andamos sempre á procura de quem pague os nossos excessos. Acreditamos ou preferimos considerar que surgirá um milagre e a política está sempre a comandar tudo. Não! São as pessoas em 1º lugar! Não perspectiva de Guterres, mas numa perspectiva pragmática, reformista, social democrata que o sr perfilha.
Nunca atacamos a raiz do problema. Porquê?
1) Eu não vi o programa e tenho pena, pois gostaria de conhecer os principais novos argumentos do Medina Carreira -- a única pessoa que teve até hoje a coragem de pôr o dedo na grande ferida portuguesa. O que é dizer muito, pois teremos sempre que perguntar o que andam a fazer os eleitos do sistema que, como se sabe, não vão perder um único jogo do Mundial! Parece que há 5 milhões de portugueses que dependem de forma continuada, directa ou indirectamente, dos dinheiros públicos. Se assim for, o problema que temos entre mãos é mesmo e só um problema político. Nenhum bloco de poder se pode aguentar mais de 4 anos em funções, pela simples e única razão de que os eleitores não deixam! Numa palavra, a nossa democracia foi sequestrada, subsumida, ou deformada por uma massa generalizada de funcionários, largamente improdutiva, bem instalada na ossatura do Estado e das intituições, cujo crescimento "natural" ameaça sem remédio a viabilidade do país. Já ouviram de Estados Falhados? Pois é disto mesmo que temos que começar a falar quando falamos da enorme cobardia política que acometeu a generalidade dos nossos operadores políticos - desde o Bloco ao CDS, passando pelas acéfalas associações empresariais, pelos embrutecidos sindicatos, já para não falar dos capelistas da Opus e da Maçonaria.
2) Eu começo a pensar que tudo se conjuga para uma alteração radical do nosso sistema político. É uma questão de tempo. Não sei como será a pós-democracia que aí vem. Não te que se parecer necessariamente com nada do que já conhecemos. Nem tem que ser estupidamente autoritária. Mas lá que terá que impor racionalidade no ssitema, terá...
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