O PSD, no seu pleno direito, decidiu apresentar uma Proposta de Revisão Constitucional.
Como de costume, e em vez de a analisar nos seus méritos e deméritos, o PS logo sobre ela formulou as mais tenebrosas intenções e os mais selváticos objectivos: ataque definitivo ao Estado Social, regresso ao antes do 25 de Abril foram as intenções mais benévolas que os socialistas viram no documento.
Ao mesmo tempo, foi posta em prática uma barragem de propaganda no mesmo tom, utilizando os comentadores, constitucionalistas, professores e jornalistas do costume. No dia da apresentação da Proposta, ela foi logo "desfeita" pelos entrevistados da RTP no seu principal telejornal.
Sempre assim foi o comportamento e a reacção inicial do PS em todas as Propostas do PSD. Foi assim, por exemplo, com as revisões constitucionais que permitiram as privatizações, a modernização do sistema financeiro, a abertura da Banca à iniciativa privada. E até, para muito PS, o fim do Conselho da Revolução.
Ganharia mais o PS, ganharia a classe política e ganharia o país, se Propostas, oportunas ou não, melhores ou piores, fossem discutidas pelo que valem, e não mediante meros e primários processos de intenção.
E conviria pensar que o maior ataque ao Estado Social está nos défices crescentes que este Governo tem permitido, mais do que permitido, dinamizado e desenvolvido. O PS tem sempre o Estado Social na boca, mas o que tem feito é enfraquecê-lo a todo o momento.
Todavia, não há magia que dure sempre. E os portugueses estão certamente a compreender o truque.
10 comentários:
Como sempre, a acuidade da apreciação do meu Amigo. A minha concordância.
É engraçado ver como toda a esquerda, e o CDS em coro, entendem inoportuna a iniciativa da revisão. Mas a verdade é que não se fala de outra coisa.
Um mérito já teve a iniciativa da direcção do PSD, independentemente dos custos que trouxe para a imagem de quem deu a cara pela proposta: o de demonstrar que o PSD não é acompanha o PS e o PC (o BE não é desta ordem constitucional) no papel de guardador de tabus.
Agora, o que valem, em concreto as propostas, designadamente quanto à reforma do sistema político, essas são contas de outro rosário.
Conhecidas no pormenor, mas sobretudo nos seus fundamentos as propostas, certamente que meteremos o bedelho na discussão.
Há uma coisa que não entendo na discussão do estado social, da gratuitidade, etc.
Se passarmos os ordenados dos funcionários para metade, podemos ter o dobro do estado social que temos e não vejo ninguém a defender isso, não percebo porquê. O salário dos funcionários públicos está na constituição????
Dr. Pinho Cardão
A proposta de revisão constitucional do PSD tem a vantagem de distinguir os projectos do PSD e do PS. No “Cem por Cento” deste sábado, Nicolau Santos diz uma coisa com a qual concordo totalmente. É que a partir de agora vai ser difícil repetir a frase "eles são todos iguais". Esta novidade traz-nos a perspectiva de uma alternância que não seja igual.
Em particular no que respeita ao Estado Social, a realidade já se encarregou, há muito, de mostrar que a gratuitidade tendencial da educação e da saúde é letra morta. O que se tem verificado é exactamente o contrário. A classe média paga os seus impostos e depois recorre, tendencialmente cada vez mais, ao sector privado, pagando duas vezes. E verificamos também que as pessoas que têm baixos rendimentos não têm efectivamente garantido o acesso à educação e à saúde. Manter pessoas em filas de espera, em situações tantas vezes desesperantes porque a rede pública não tem capacidade de resposta não é, a meu ver, aceitável. Se o acesso deve ser assegurado pela rede pública ou pela rede privada é outra discussão. Quem tem possibilidades, a tal classe média, acaba por ser empurrada a recorrer ao sector privado. Acresce que as despesas correspondentes não são totalmente reembolsadas pelo Estado. Acabar com as correspondentes deduções fiscais só vem agravar o esforço que está a ser exigido à dita classe média. São só alguns exemplos para mostrar a necessidade de revermos o que é queremos que seja o Estado Social. Portanto, é de aplaudir a coragem do PSD de trazer o assunto à discussão pública. Quanto a timings e a riscos a análise fica para os analistas políticos!
Meu Amigo Pinho Cardão, o Senhor conhece-me pessoalmente, assim como a quase totalidade dos autores do "Quarta" e sabem certamente que não me incluo na estirpe dos "muito inteligentes".
Sou um fulano que visita o blog, participa e tal, mas, pouco ou nada conhece dos meandros, dos "bastidores" onde toda a acção se desenrola. Todos sabemos, que os autores conhecem e participam nas decisões que são tomadas a nível das "cúpulas" (de variadíssimas cúpulas). Como dizia o Jô Soares nos seus programas humorísticos, V. Excelências, são "unha e carne com os homes".
Perdoe-me se estou a "pisar" demasiado o "risco", mas, fui habituado de pequenino a dizer o que me vai na alma. E o que me vai na alma, tem directamente a ver com toda esta polémica da revisão da constituição, pensada e proposta pelo novo líder do Partido Social Democrata. Aquele partido em que, segundo as sondagens, uma maioria significativa, começava a colocar as suas esperanças de mudança para um novo governo, um governo mais consciente, mais coerente, mais sério, mais confiável.
E então... eis que nos sai um mocinho, cheio de boas maneiras, mas, a meu ver, cheio tambem de más intenções.
Estarei errado, Dr. Pinho Cardão?
Estará apensar o líder do PSD numa fórmula tão... tão sublime, tão inovadora, tão fantástica que os comuns mortais, como eu, consigam perceber somente que daquelas reformas, só poderá saír prejuízo para uma quantidade de gente que andou anos a fio a pagar impostos para que, ao chegar o dia inevitável da doença, tivesse acesso a tratamentos de saúde gratuito, au chegar o dia de entrar para a escola pública, os seus netos tivessem direito ao ensino gratuíto?
Diga-me meu amigo, Dr. Pinho Cardão, Estou errado neste raciocínio?
Caro Bartolomeu
O problema é que podemos continuar a fingir que temos um sistema de saúde - e é vê-la à classe média de cartãozinho na mão: é médis ou...? - que temos um sistema de ensino gratuito - um mestradozinho no ensino público a qualquer coisinha como 5000€ - uma acção social que vai entrar com a nossa condição de sustento - tens uma mãezinha ou um tiozinho com um fiat punto de 86 - então já não tens direito a isenção de propinas - podemos continuar a fingir que temos Scuts a 600 cêntimos de Euros por 100,000 metros de estrada alcatroada sem bermas, podemos continuar a pensar que temos tudo isto... mas o que temos são funcionários públicos duplicados por uns sósias partidários a 5000€ e tudo o mais que sabemos. E o que sabemos é que temos um Estado há vinte anos à espera de um orçamento de base zero, e o que sabemos é...
Na hora para ajudar ao que sabemos:
As reformas vitalícias dos políticos aumentaram no primeiro semestre deste ano e estão a fazer disparar os gastos públicos. De acordo com o jornal «Correio da Manhã», em apenas seis meses, os gastos com as pensões dos políticos ascenderam a 4,8 milhões de euros, uma subida de 14 por cento, face aos 4,2 milhões gastos no mesmo período do ano passado. Ao todo, estão a receber subvenção vitalícia um total de 399 antigos detentores de cargos públicos.
Caro dr. Pinho Cardão,
O PS sempre esteve pelo menos 10 anos atrasado. É atavismo já conhecido.
A novidade chama-se José Sócrates e, como bem assinalou Pacheco Pereira, ontem, no Público, faltam-lhe qualidades que facilitem encontrar um lugar adequado a um futuro-ex-primeiro-ministro.
Caro Bartolomeu:
Muita generosidade da sua parte, mas a verdade é que nenhum dos autores do 4R bebe do fino. É pessoal retirado, cada qual entregue aos seus afazeres profissionais, elegendo o 4R como espaço de intervenção cívica. Muito agradável, pela troca de impressões que proporciona.
Quanto ao essencial, a preocupação do Bartolomeu daria para conferências de várias sessões, pelo que qualquer recomentário meu pouca luz poderrá trazer.
De qualquer forma, gostaria de dizer que o meu post não foi sobre o mérito específico das propostas do PSD, mas sobre os processos de intenção que lhe moveram. Se um sujeito propõe A e o interlocutor diz que é B, e não discute A, NENHUM ENTENDIMENTO NUNCA É POSSÍVEL.
Também gostaria de dizer que a manutenção do essencial do Estado Social exige reformas profundas. No que respeita à saúde, por exemplo, a despesa actual já absorve cerca de 10% do PIB e mais do que toda a receita do IRS. O aumento da esperança de vida, o envelhecimento da população e a incidência cada vez maior de doenças crónicas vão fazer disparar ainda mais os gastos com saúde. Para além de ter que se ganhar uma necessária e acrescida eficiência no sistema, torna-se necessário fazer profundas reformas no SNS que, não pondo em causa o acesso generalizado aos cuidados médicos, permitam a sua sustentabilidade. São essas reformas que podem e devem ser discutidas, sob pena de, a curto prazo, se perder o essencial, que pode acontecer pela deterioração e perda de qualidade dos serviços, devido a falta de financiamento. Por outrolado, uma coisa é o Estado assegurar um SNS, outra coisa é a prestação concreta do serviço. E esta matéria também pode e deve ser discutida sem tabus.
O mesmo se pode dizer quanto à educação.
Indo à sua questão final, diria que nenhum sistema de saúde ou de ensino é gratuito: ou se paga com impostos, ou pelo serviço, ou através da dívida pública, que exige impostos futuros.
E no fim, as suas preocupações são as minhas. Mas discuta-se, sem tabus.
Prezado Dr. Pinho Cardão, confesso-lhe, agrada-me mais ler o teor deste seu comentário. Sabe o meu amigo, certamente, que a minha forma natural de olhar os problemas e de os discutir, é preferencialmente, sem tabus.
E aquilo que mais me arrelia no fim de todo este sururu, é que, se as medidas de alternativa política, ou "Mudar" o país, propostas por Pedro Passos Coelho, se ficassem pela privatização da Caixa Geral de Depósitos e da Radio Televisão Portuguesa, ainda cum raio, mas, se descambam para os lados dos direitos mais importantes, conquistados pelo povo portugês, fruto do mesmo regime demcrático que originou, ou propiciou que uma Constituição da República, baseada nos mais nobres direitos humanos, fosse redigida... aí, meu caríssimo Amigo, não pode haver português, com sentido de sociedade e de estado, que concorde e avalize tamanha "bacorada".
Eu, pessoalmente, não chego a entender o ponto de vista do lìder do PSD. As razões que o caro Dr. Pinho Cardão evoca no seu comentário, são suficientemente pertinentes, para que se entenda a necessidade de reformar, de adaptar, de encontrar novos modelos de gestão, mas... retirar? roubar? Isso nunca!
Se o PSD afirma que não pretende acabar com o estado social, tem de encontrar uma forma mais capaz de o fazer, porque da forma que propõe, pagando o doente a consulta, a operação, o tratamento de acordo com o seu nível de vencimento, é o mesmo que dizer aos que auferem salários mais altos, "caríssimos senhores, aconselhamos a que deixem de descontar para o serviço de saúde e subscrevam planos privados" e dizer à maioria dos empregados deste país, que auferem baixos salários, e àqueles que vencem o úbsídio do fundo de desemprego, "pá... vocês, olha... azar".
E o que dizer da alteração do termo "justa causa" para "razões atendíveis"? No mínimo, que uma é clara e concreta, e a outra, vaga e ambígua. A primeira consagra um direito e determina uma obrigação. A primeira diz claramente ao patrão: pá, só podes despedir aquele tipo se ele faltar a qualquer uma das suas obrigações, perfeitamente identificadas no código de trabalho e nos contratos de admissão. E diz explícitamente ao empregado: Oh pázinho, atenção! Não te esqueças que tens direitos, mas também tens obrigações, o teu patrão pode despedir-te, mas só se tiver razões concretas para o fazer. A segunda... "razões atendíveis" esta, parece-me a emenda capaz de criar assassinos.
Não me surpreenderia nada que a falta de atendimento das razões fosse capaz de fazer um pai desesperado, pegar numa caçadeira, rebentar a cabeça do patrão, como já sucedeu, num passado não muito longíncuo, apesar de as razões serem atendíveis.
Caro Dr. Pinho Cardão, entendo que ha efectivamente muitíssimas leis e procedimentos que é urgente mudar, para conseguir governar melhor este país, sem mexer nos direitos fundamentais dos trabalhadores; direito à manutenção do emprego, direito à educação e direito à saúde, mesmo que para isso, seja necessário aumentar as taxas de desconto salarial.
E em minha opinião, é importante ainda, que Pedro Passos Coelho emende a mão e encontre propostas mais coerentes e consistentes para apresentar aos eleitores deste país.
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