1. Recordo-me bem da transição do “cavaquismo” para o “guterrismo” do final de 1995: foi o momento em que à “Crispação” social do final do cavaquismo se opôs, triunfantemente, a promessa de Diálogo, fraterno e social, do guterrismo.
2. O País precisava de Diálogo, estava cansado de Crispação, era necessária uma nova Agenda de abertura (dos cordões à bolsa, como viria depois a acontecer), que o guterrismo prometia, rejeitando as políticas de contenção orçamental dos últimos 2 anos do cavaquismo, curiosamente protagonizadas pelo Dr. Eduardo Catroga...
3. E o País acreditou nas virtudes redentoras do Diálogo fraterno e social, tendo assim sido lançadas novas etapas de um Estado Social a caminho da perfeição – (i) o rendimento mínimo garantido, (ii) os generosos aumentos do salário mínimo nacional, (iii) os generosos aumentos na função pública e o recrutamento de muitos milhares de novos funcionários públicos, (iv) a criação vertiginosa de empresas municipais e intermunicipais e de fundações apoiadas pelo Estado, (v) a criação de uma miríade de institutos públicos para os mais diversos fins, (vi) a fixação dos preços dos combustíveis (que saudades...)...
4. Com a embalagem que vinha de trás foi possível, a par dessa grande abertura ao Diálogo, não inviabilizar a entrada na moeda única em 1999 – momento celebrado com enorme pompa e circunstância – a qual, acreditou-se piamente na altura, nos iria proporcionar prosperidade e bem-estar social para todo o sempre e, segundo o autor mais reputado da época, a liberdade de endividamento sem limite nem consequências...
5. Até que aconteceu o primeiro tropeção em 2002, quando se descobriu que os défices orçamentais tinham sido martelados, que a realidade era muito diversa e pior: em vez de um défice de 1,1% do PIB em 2011, última estimativa oficialmente divulgada pelo Governo cessante chefiado por A. Guterres, viria a ser descoberto um défice de 4,4% do PIB após correcções verificadas e confirmadas pelo Eurostat...
6. Parecia que o sucesso da política de Diálogo tinha chegado ao fim, o País voltava-se decididamente para Austeridade, pela mão dura de M.F. Leite...a qual acabou rapidamente, menos de 2 anos depois, sobretudo a partir do momento em que a inspiração de um Estadista lembrou ao País que “havia mais vida para além do défice”...
7. A partir daí chegamos num ápice ao período áureo, em que vigorou uma Agenda de crescimento a todo o vapor, nos anos 2005-2010 – sendo que o crescimento mais rápido aconteceu do lado da dívida, tanto pública como privada – período esse que terminaria abruptamente em 2011 com o País entalado num beco sem saída, sem dinheiro nem crédito, forçado a aceitar um regresso à Austeridade, agora em versão TROIKA, infinitamente mais dura do que a dos últimos 2 anos do cavaquismo ou dos 2 anos de M.F. Leite...
8. Mas parece que os ventos estão de novo a mudar, passado um ano a Austeridade já cansa: segundo declarações do SG/PS na semana passada, a resposta ao drama do desemprego consiste em “abandonar a austeridade a qualquer preço e, em alternativa, consolidar as contas públicas através de uma Agenda para o crescimento e o emprego”...como, ninguém sabe, mas isso são pormenores sem interesse...
9. Este poder mágico das Agendas, para onde nos irá levar, desta vez? De regresso ao velho Escudo?
8 comentários:
O bom da agenda é que tem as tarefas por preencher... Eu, por exemplo, tenho uma agenda para o arrefecimento global, uma para a independência energética e outra para o pleno emprego. Não percebo porque é que não seguem a minha agenda, é só preencher as tarefas.
Só queria fazer um pequeno reparo, é que a política de MF Leite não foi interrompida pelas palavras de Jorge Sampaio mas pelos actos de um partido chamado PSD e pelo seu candidato neosocialista à presidência que, entre "moeda má" e outras coisas menos próprias que lhe chamou, condenou o sucessor de Durão Barroso a ser o mais efémero paraquedista de que há memória. Não coloquemos a culpa numa insignificância quando há tanta baixeza onde a meter. Nunca tive uma opinião positiva do Santana Lopes mas não tenho dúvida que quem levou o Sócrates a vencer as eleições é hoje presidente da República e que a existirem futuras notas de 1 milhão de escudos elas devem ter a cara dele, tal a responsabilidade que terá na sua impressão.
Mas a agenda de pagamentos essa não desaparecerá, será apenas reagendada.
A não ser que um remake pinochetiano na Grécia tenha lugar já no verão. Estará este filme na agenda?
"(...) os generosos aumentos do salário mínimo nacional, (iii) os generosos aumentos na função pública (...)"
Por favor, caro Drº Tavares Moreira, não fale em generosos aumentos do salário mínimo nacional quando este é atualmente de €485,00, o que é manifestamente pouco, reconhecido por grandes empresários!
Camaradas:
1. Há grandes melhorias de condições de vida em 3/5 da Humanidade, sim, produzem.
2. No Brasil, na China, na Indonésia, na Índia...
3. Por aqui os xuxiais-cál-quer-coisinha...não sabem ter solidariedade com os Povos.
4. Não se arranje culpados, desde o ouro do Brasil que é assim...no mais foi a força da ditadura que nos levou a nao ter dívida.
5. A massa cinzenta lusitana quando pensa, sai daqui...
6. Convido-vos a vir para Timor ou Moçambique: há vida.
Caro Tonibler,
Não deixo de lhe reconhecer alguma razão na apreciação exegética ao períodod de turbulência política que se seguiu ao fim da política de austeridade de M.F.L....
Acontece que por circunstâncias que agora pouco interessam acompanhei de muito perto esse período e pude avaliar, em toda a sua extensão, os enormes danos que a divulgação tonitroante da teoria presidencial do "há mais vida para além do défice" provocou na continuação da política protagonizada por MFL...
Essa teoria provocou um enorme rombo na já frágil barcaça governamental, que nunca mais se endireitou...e JMB com o seu olho de lince para esprietar oportunidades de promoção na carreira, quando viu o barco meio abaulado e uma janela aberta em Bruxelas neão hesitou um segundo...
Quanto ao que se passou a seguir, pode o meu amigo avançar as suas explicações à vontade, que não irei contesta-lo!
Ilustre Mandatário do Reu,
A agenda de pagamentos pode esperar, que se danem os credores...é pelo menos essa a tese do fogoso Alex Tsripas.
Se essa tese vingar, como muitos opinion-makers cá do burgo anseiam, os bancos portugueses, que já perderam mais de 50% na carteira de dívida grega, que se preparem para mais uma cura de emagrecimento...
Qualquer dia vamos ver os banqueiros reduzidos a pele e osso, vagueando, quais fantasmas, pela baixa de Lisboa em busca de apoio social...
Caro jotaC,
Nunca me ouvirá dizer que o salário mínimo é excessivo para quem efectivamente trabalha, ou que precisamos de salários mais baixos para defender a competitividade das produções nacionais...
Mas não esqueçamos que no actual contexto de fraquíssima oferta de emprego, esse tipo de medidas "ajudam" aqueles que estão no desemprego a não conseguirem emprego..
E atenção tb que me referi a um período específico da governação em Portugal, caracterizado pelo mais completo desregramento na gestão das finanças públicas, que, conjugado com toda uma série de outros erros de política económica - aposta em mega-projectos de rendibilidade negativa e altamente consumidores de capital, por exemplo - acabaram por nos atirar para a situação de "beco sem saída" finalmente detectada em Abril de 2011.
E é no contexto de toda essa irracionalidade de políticas que os aumentos do salário mínimo acabaram por contribuir para o descalabro final, ajudando (entre outros factores) ao rápido aumento do desemprego a que estamos assistindo!
Caro Tavares Moreira
Para que uma "Agenda" tenha sucesso, é necessário financiamento, algo que no futuro a médio e longoprazo, ou não teremos em montantes adequados ou, serão servidos( os financiamentos) com condições que não desejamos.
É verdade que a europa mudou e muito mas, não voltou para trás....
Resta, para quem o desejar cantar ou ouvir a canção de António Mourão...
Cumprimentos
joão
Caro Tavares Moreira,
Sei que não me vai responder, mas foi Sampaio quem impediu MFL de seguir com o plano? Ou foi o PSD?
Não conheço pessoalmente a senhora, mas não me parece árvore que abane com qualquer vento...
Caro João Jardine,
A questão que suscita - de uma Agenda de Crescimento exigir algum dinheiro - é matéria de reduzidíssimo interesse para estes crescimentistas da 25ª Hora...
Eles cultivam uma modalidade de Crescimento, de raiz essencialmente verbal e especulativa, que dispensa bem a componente financeira...
Caro Tonibler,
Respondo, obviamente, a essa dilacerante questão - foi em 1º lugar a formidável inspiração do Estadista que nos lembrou a existência de uma Além do défice , em 2º lugar a fraca capacidade da comunidade laranja da época para entender os fundamentais da economia portuguesa...
Mas admito que tenha havido ainda uma 3ª ordem de factores: a fraca capacidade de convencimento dos poucos que, como este seu amigo, tentaram (por vezes com algum sofrimento imposto de fora) remar contra a maré...
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