O discurso do PR sobre uma consolidação orçamental amiga do
crescimento suscitou aqui, no 4R, um lúcido e oportuno post do Tavares Moreira,
com o qual não deixo de concordar. No entanto, dada a importância do tema, junto
algumas notas.
1. O Presidente escolheu como oportunidade
para falar do tema não uma qualquer iniciativa no âmbito dos serviços públicos,
mas um encontro com representantes de empresas start-ups de diversos países. Com
isso, naturalmente, o Presidente quis significar que concebe o crescimento como efeito
da iniciativa empresarial, e não como consequência de mais despesa pública ou
de intervenção do Estado.Tanto é
assim que, frisou, a comunicação
social deveria dedicar mais espaço à divulgação das iniciativas empresariais,
nomeadamente dos jovens empresários de "talento", abertos à inovação
e que são "o motor da mudança" do tecido empresarial e "os
verdadeiros alicerces da criação de uma economia portuguesa sustentável".
2. É óbvio que, na actual conjuntura,
o crescimento só poderá fazer-se através da iniciativa privada, competindo ao
Estado criar as condições para tornar o investimento atractivo, com menos
custos de contexto, menos burocracia, menor carga fiscal, logo menos despesa
pública. Pois é o nível absolutamente desproporcionado que esta atingiu, pelos
seus efeitos directos na carga fiscal e nas dificuldades de financiamento da
economia, que constitui um dos grandes entraves ao normal desenvolvimento da actividade
económica, impedindo assim investimento, emprego e o bem-estar dos cidadãos
portugueses.
3. Ao mesmo tempo, é certo que despesa
pública em excesso origina empolamento dos serviços, criando mais burocracia,
mais custos de contexto, levando a um verdadeiro condicionamento industrial, de
diferente tipo do de Salazar, mas nem por isso menos violento e esmagador. E
que leva inevitavelmente à corrupção.
4. Um reparo se pode fazer ao discurso
do Presidente, quando, ao invés de aconselhar os políticos a reservarem "mais espaço
para falar dos factores de crescimento económico e de criação de emprego",
os deveria instar a acordarem nas medidas atinentes ao crescimento e ao emprego
e a concretizá-las.
5. Interpretações
das palavras do Presidente de associação de crescimento económico a mais despesa
pública parecem-me assim absolutamente descabidas. Porque o Presidente sabe
melhor que ninguém que crescimento por via de mais despesa
pública é uma ilusão, já que não há quem a pague. E que uma consolidação
orçamental por via do aumento dos impostos também é rematada tontice, porque prejudica
o crescimento.
6. Consolidação
orçamental e crescimento económico só por via do investimento. Urgente é torná-lo atractivo. Uma medida que não custa dinheiro, mas implica acabar com os lóbis
das burocracias. O que é tanto mais difícil quanto cada vez mais os governos
são constituídos por burocratas, que desconhecem que há sempre um modo de bem fazer as coisas. Burocratas, mesmo que se digam políticos.
7 comentários:
A mim, Caro António, a compatibilidade parece-me tautológica: Se houver investimento privado adicional que suscite um crescimento económico igual ou maior à retracção provocada pela redução da despesa pública, crescimento e consolidação orçamental são estupendamente compatíveis.
Mas será esse crescimento suficiente para inverter o crescimento da dívida pública?
Só se o crescimento for superior ao da taxa de juro implícita da dívida. Ou, como parece ter descoberto a "inteligência" do FMI se forem feitas privatizações quanto baste e de modo que atinjam os objectivos.
Mas esta parece não ser a evolução observada em Portugal a acreditar num relatório do FMI, citado aqui
http://www.jornaldenegocios.pt/economia/financas_publicas/detalhe/fmi_fraco_crescimento_nao_impede_grandes_reducoes_de_divida_publica.html
Continuamos, portanto, a marcar passo, descendente.
Nem mais! Condicionamento industrial..."democrático"!!!
Muito poucos percebem o que se está a passar a esse nível!
Caríssimo Rui.
Estou de acordo, quando dizes que "se houver investimento privado adicional que suscite um crescimento económico igual ou maior à retracção provocada pela redução da despesa pública, crescimento e consolidação orçamental são estupendamente compatíveis".
Ora redução da despesa pública terá forçosamente que haver, não já por razões ideológicas, mas por não haver quem a pague. De modo que, para haver crescimento e emprego, há que criar condições atractivas para o investimento. É o que o governo não tem feito. E o que os sindicatos não cessam de obstaculizar.
Caro António Barreto:
Democrático não será; burocrático, com toda a certeza.
De facto, aí passam-se coisas espantosas. Em alguns casos, a roçarem verdadeiro boicote económico.
Se calhar os actos contribuem para essa nossa confusão. Agora fazer essa leitura que o meu caro faz, como se tivesse a fazer uma interpretação das escrituras, essa não lembra ao diabo (salvo seja). O homem bloqueou todas as medidas de corte de despesa e assinou todas as despesas que levaram o estado à falência. Acreditar que agora está no 'período azul', desculpe lá...
Em manobra combinada com Cavaco Silva, desde o ministro da economia, de Paulo Portas, de Passos Coelho ao presidente da república, todos deram agora em falar de crescimento económico. De um lado como manobra política em período eleitoral, por outro como “mensagem aos credores”, aos “mercados”, quando os juros ultrapassam os 7%. A trama tem tanto de anedótico como de trágico. Presidente e governo, insistem em continuar com as mesmas políticas recessivas que só podem conduzir a mais recessão, desemprego e miséria. E não são as suas palavras ou a sua vontade que altera a realidade. O crescimento de que falam é um mito que se irá desfazer nos dados económicos dos próximos meses. Em tempos, Cavaco Silva ainda se apresentava de algum modo descolado do governo quando falava em espiral recessiva, mas neste momento encontra-se coladinho ao governo e às suas estuporadas políticas.
Grato pela amável referência ao Post anterior, não deixo de salientar o excelente estado de espírito revelado pelo Pinho Cardão na abordagem de tema de tão cruciante actualidade e a propósito do qual se cruzam - por vezes em colisão nada adocicada - opiniões tão cavadamente divergentes...
Enviar um comentário