O português bate recordes no totoloto e euromilhões, joga nas apostas
on-line, adere aos sorteios dos bombeiros, dos cegos, da cruz-vermelha, das comissões
fabriqueiras, compra rifas de que nunca saberá o resultado,
entusiasma-se na lotaria instantânea. O português gosta de jogar em tudo, mas,
ao que se ouve, só não gosta das rifas dos carros
promovidas pelo Fisco. Melhor dito, os media dizem que não gosta, o que é coisa
radicalmente diferente. Por exemplo, na RTP, dito serviço público, os
jornalistas de serviço e ao serviço, certamente da verdade, nunca conseguiram
encontrar um só cidadão que concorde com a rifa. Pelo contrário, pivôs, entrevistadores
e entrevistados rivalizam nos argumentos mais boçalmente inteligentes contra a medida, como o
custo do combustível ou da manutenção do carro, como se não fosse possível ao
infeliz contemplado vender o objecto tão odiado que teve o azar de lhe calhar
em sorte e assim arrecadar um bom pecúlio. E, ao que também vou ouvindo, a rifa de um carro de gama alta é considerada abominável afronta, coisa natural num país de pequenos e médios,
agora até mais pequenos que médios.
Também os senhores deputados e comentadores da esquerda muito esquerda
e da esquerda menos esquerda, como da direita da esquerda não gostam da rifa
fiscal. E dizem que o governo deveria era preocupar-se em acabar com a economia
paralela.
Ora eu também não gosto da economia paralela. Mas é precisamente por
isso que não engalinho com o sorteio. É que ele pode mesmo contribuir para mitigar
tal economia.
Pois o que eu estou é contra os impostos que deixaram de o ser para
ser confisco. E contra o estado excessivo que tal permite, pior ainda, que a
tal obriga. E, neste caso, contra o governo, que não fez o que devia fazer. Mas
estou também contra aqueles que querem ainda mais estado, que obriga a mais
impostos que, automaticamente, geram mais economia paralela.
Ao fim e ao cabo é do que gostam. Por isso, odeiam a rifa.Como sempre nestas coisas com o inegável apoio da comunicação social. Alguma dessa, sim, a necessitar de uma enorme rifa!...
12 comentários:
Pois
Caro HPSANTOS:
Pois? Pois sim? Pois não? Pois, em parte? Pois, no todo?
E depois?
Pois...pois!...
Esta história do sorteio dos automoveis é das melhores jogadas deste governo. Vai precisamente de encontro à mentalidade Portuguesa até mesmo no pormenor dos carros escolhidos. Se fosse um Renault Clio ninguém ligava mas sendo um belo Audi tudo pede facturas a ver se tem sorte.
Se há algo triste aqui é a mentalidade Portuguesa. A medida limita-se a usar essa mentalidade de forma positiva.
Caro Pinho Cardão,
Fez-me lembrar uma professora alemã que dizia que o mais difícil em Portugal era perceber o que quer dizer a palavra pois. Como escrevendo não se pode entoar, ela dava esses exemplos (o pois, pois, que conforme a entoação quer dizer sim ou não, ou o pois sim, que também pode querer dizer sim ou não conforme a entoação, tal como o pois não, ou mesmo o solitário pois.
Eu uso muito como usei neste comentário para sublinhar (equivocamente, é certo) a evidência do que diz.
henrique pereira dos santos
Caro Henrique Pereira dos Santos:
Pois a professora alemã era uma sábia e o meu amigo tão sábio quanto ela. Pois então!...
Caro Zuricher.
Pois o meu amigo bateu no ponto. Essa é a verdade. O resto...são tretas que nem uma rifa merecem. Mas também aí há quem venda...
Pois eu cá fico com a sensação que, no fundo, Pinho Cardão abnega a rifa e tudo o que ela significa.
Ao que dizem, esta história da nota fiscal não é uma invenção do governo português, mas acredito que é uma boa jogada e que vai dar bom resultado. E não compreendo a posição de muitos opinidadores que criticam a ideia, sobretudo os que esgrimem com os eventuais custos de manutenção dos carros, de tão pobre que é o argumento.
Pois, eu acho esta coisa bem esperta, e de esperta passaria a inteligente se fosse demonstrado o acréscimo da receita e o fim a dar-lhe, que poderia em parte repercutir-se no alívio da carga de todos...
Caro Ferreira de Almeida:
Com rifa ou sem rifa, tempos são de abnegação, caro Ferreira de Almeida.
Por isso, andamos todos devidamente abnegados. E até creio que, com clima instalado, os infelizes contemplados com a sorte e com os Audis serão os primeiros a abnegar da rifa. Não vão eles ser acusados de colaboracionismo com o Fisco!...
Caro Prof. Pinho Cardão,
Há já muito tempo (demasiado…) que não me perdia por estas bandas do 4R! Já tinha saudades, confesso!
Quanto ao S/ artigo, excelente, como sempre, suscita-me sentimentos algo conflituantes.
Explico.
Não sei se é apenas uma “febre conjuntural” ou se as minhas convicções estão mesmo a evoluir, mas o certo é que me sinto cada vez mais liberal. Nesse sentido, concordo com as observações que faz a propósito do excesso de Estado e da forma como este confiscador instiga a economia paralela.
Dito isto, não vejo a economia paralela (em si mesma indesejável, é evidente), como uma doença, mas antes como um sintoma.
E, por isso mesmo, não poderia estar mais em desacordo com a S/ tolerância para com a “rifa fiscal”.
Por duas ordens de razão:
Primeiro, porque não se cura a doença combatendo o sintoma…
Depois, porque, retomando uma ideia que Michael Sandel tão bem explicou, a aposição de um “preço” em certas coisas esvazia-a do seu valor intrínseco. E isto de transformar a Autoridade Tributária numa espécie de avatar dos Jogos Santa Casa (já viram o logotipo?...) parece-me, de algum modo, uma ideia esdrúxula…
E se quisesse ser maledicente, até poderia aventar uma terceira ordem de razão: Uma aldrabice (economia paralela) não se combate com outra aldrabice (as “rifas”). É que, bem vistas as coisas, quem, no fim de contas, ganhou a sorte grande foi mesmo a SIVA, que, suspeito, desde 2011 tem tido mais dificuldades em renovar as frotas do Governo, Troika oblige…
Caro Henry:
Primeiro que tudo, muito obrigado pelas suas palavras. E nós gostamos de o ver por cá.
Depois, penso que o seu comentário é muito pertinente. Eu também não morro de amores pela rifa. Mas não a critico. Porque penso que, sendo um meio legítimo, atinge um fim incontestável, que é o de diminuir a fuga aos impostos. Independentemente de essa fuga ser doença ou sintoma de doença, como diz.
Claro que estou convencido de que uma fiscalidade razoável e racional, conjuntamente com a acção coactiva do Estado, seria a melhor medida para dissuadir a fuga ao fisco e a economia paralela. Mas, já que não é assim, e o meio é lícito, pois que se pratique. Será um second ou um third best. Paciência!...
Caro Pinho Cardão, não sei se haveria a mesma tolerância se a mesmíssima iniciativa tivesse sido no tempo do outro Governo...
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