Saída limpa e programa cautelar perseguem-nos até à náusea em todos os
noticiários, programas, comentários de jornalistas e equiparados, economistas e
doutores de todas as etiologias. Ficam os sábios pelas palavras, que palavreado
abundante é sempre o melhor meio “pour épater le bourgeois”. Que, pode passar
todo o tempo, mas é bem que nunca escasseia.
Claro que ao governo interessa uma saída limpa: aprovisionada que está
a tesouraria até às eleições, é trunfo que tem nas mãos e que lhe pode dar a
sorte no jogo eleitoral. E à Troyca também interessa, para comprovar a excelência
das medidas preconizadas.
Convém é explicar que saída limpa só o seria se significasse a dispensa
definitiva da Troyca, ou de cada uma das entidades que a compõem. E que essa
dispensa definitiva traduzia a possibilidade de Portugal conseguir financiar
sustentadamente os seus défices, que persistirão.
E que, para os poder financiar sem auxílio alheio, eles terão que ser
reduzidos. E que, para serem reduzidos, a despesa pública, se não diminuir,
pelo menos não pode crescer. E, não podendo crescer, haverá que transformar o
efeito transitório das transitórias medidas de cortes de salários e de pensões
em efeitos definitivos. O que significa que, porventura com recurso parcial a
outras naturezas de despesa, as restrições aos orçamentos familiares persistirão.
Tudo isto se tornou claro para os mercados. Para eles pouco interessa
que as medidas tomadas possam ter sido as mais fáceis e porventura as piores e
mais penalizadoras para os cidadãos e para a economia. Porque eles sabem que se
chegou a um ponto de não retorno. E tomam as palavras de Seguro como mero
folclore, certos que estão que, seguramente, ele não modificará, a ser eleito,
seja o que for.
E, porque sabem que não há alternativa ao controle do défice e que
este se aproxima do valor aceitável, abriram as portas do financiamento,
possibilitando assim a tal saída limpa. Mas que trancarão de novo portas e
janelas a um que seja leve deslizar da política de contenção orçamental.
Óbvio que a posição do BCE de activar políticas agora eruditamente chamadas
de “quantitative easing” , traduzidas na compra de activos , eufemisticamente dívida
pública, como forma de estímulo à economia, ajuda à queda das taxas de juro. Acontece
que esta política de estímulo monetário tem como causa próxima a deflação que
se começa a sentir, pelo que, esta resolvida, lá se irão as políticas não
convencionais e ficamos novamente dependentes de nós próprios.
Pelo que, “pour épater le bourgeois” uma saída limpa é bonita, mas
esquece que o substracto se mantém. E que um programa cautelar, porque nada
modifica, sempre seria um anteparo no caso de turbulência interna ou externa. Porque muitos de nós continuaremos por cá.
Claro que nada disto se diz ou vai ser dito. O Governo falará de
vitória, o PS de derrota, qualquer que seja a solução. E muitos dos media ampliarão o
barulho, potenciando a confusão.
Assim continuaremos a viver. Com politiqueiros promovidos a
políticos reciclados em universidades de verão. E grande parte dos jornalistas e comentadores como bons acompanhantes.
9 comentários:
Dr. Pinho Cardão
Claro que será anunciada uma saída limpa, independentemente do que ela queira significar. O que interessa é que vamos continuar debaixo de vigilância apertada e o BCE vai continuar a emprestar dinheiro. Teremos que ter necessariamente um seguro - talvez com umas cláusulas escritas em letra muito miudinha para não se verem - pois em qualquer momento os mercados podem virar. A descida das taxas de juro é um fenómeno global, estamos a beneficiar. O que pode explicar uma yield nas obrigações a 10 anos de 3,575%?
A semana passada um político de serviço dizia muito contente que a partir de 17 de Maio quem passará a decidir sobre a nossa vida somos nós. Era bom era, mas o melhor, mesmo, é que estejamos debaixo de vigilância...
Dou-lhe toda a razão, caro Dr. Pinho Cardão. Confesso que já sentia saudades de me sentir tão completamente de acordo com as suas opiniões.
Mas, em minha opinião, para que conseguíssemos estabilizar as nossas contas e reduzir a necessidade de recorrer ao financiamento externo; a par da inevitavelmente necessária reforma profunda do estado e corte das tão faladas "gorduras", seria necessário que a população tomasse por iniciativa própria, a decisão de boicotar a aquisição de produtos de consumo importados.
Esta seria certamente uma excelente forma de estimular a produção interna, ajuda-la a crescer e com isso a necessidade de criar mais postos de trabalho.
Apoiado e excelente post.
Eu estou muito mais optimista. Os jornais estão a morrer, os canais de televisão em queda profunda. Já ninguém ouve um político. Na verdade, acho que estas europeias vão mostrar quão paralela é a economia da politiquice, quão irrelevante ela é para o pensamento das pessoas. O Seguro é uma figura do anti-regime.
Cara Margarida:
Claro que qualquer credor, sobretudo institucional, irá ficar vigilante. Afinal, tem que prestar contas pelo dinheiro que lhe foi confiado.
Caro Bartolomeu:
Medida aliciante...mas perigosa. Imagine que os outros países pensavam e faziam o mesmo!,,,
Caro A . Cristóvão:
Muito obrigado. E apareça mais vezes!
Caro João Pires da Cruz:
É capaz mesmo de ter alguma razão. No entanto, estudos de opinião ainda colocam os jornalistas como das classes mais respeitáveis...
Caro Dr. Pinho Cardão, os habitantes dos outros países, necessitam e apreciam os bens de consumo que produzimos e exportamos. O nosso vinho, o nosso calçado, os nossos "escargots". Nós, se conseguirmos livrar-nos dos nossos tiques de novo-riquismo, não precisamos da maioria se não mesmo a totalidade desses bens.
Note; eu não disse que o nosso governo deveria renunciar os acordos comerciais, a decisão teria de ser individual embora num consenso quanto mais geral, melhor.
E como se encheriam páginas e pãginas de jornais e horas de mesas redondas televisivas, caro Pinho Cardão? Saídas limpas já ouvi falar em várias modalidades, do mesmo modo que as amparadas são na verdade a "normalidade" do futuro. A bem dizer, saímos sem sair, entrámos sem querer, ficaremos assim enquanto nos deixarem. Celebremos pois o que quer que seja, é melhor celebrar já porque ao menos essa alegria jã ninguém nos tira! Pourvu que ça dure....
Finalmente um texto com pés e cabeça!
Enviar um comentário