O homem desde sempre se interrogou sobre a criação de mundo, ato verdadeiramente fascinante ao ponto de constituir o estímulo mais universal e poético que esteve e continua a estar na base da mais divina das características humanas: a imaginação. Descrições belas, cheias de poesia, rescendendo a arte. São tantas as manifestações artísticas a este propósito. O Génesis, a Teogonia de Hesíodo, o Gilgamesh, as interpretações e variações ao redor deste tema, como o “Diário de Adão e Eva” de Mark Twain ou “Adão e Eva no Paraíso” de Eça de Queiroz, são algumas das minhas preferidas. Até a descrição do “muito douto e muito ilustre Usserius, bispo de Meath, arcebispo de Armagh, e chanceler-mor da Sé de São Patrício”, que o nosso grande escritor cita com particular ironia, é de uma imaginação sem limites. Quem diria que Usserius conseguisse, com precisão matemática, datar o dia e a hora da criação, nada menos nada mais do que às duas horas da tarde do dia 28 de Outubro de 4004 antes do nascimento de Cristo. Às tantas à hora da divinal sesta! Outras manifestações artísticas procuram registar esse momento. A mais polémica é “A Origem do Mundo”, segundo Gustave Courbet. Uma imagem da região pudenda de uma mulher em que se destaca uma espessa "trufa" de pelos púbicos.
A primeira vez que vi uma fotografia deste quadro, que andou sempre escondido até acabar por ser exposto no Museu d'Orsay, fez-me relembrar algo semelhante, mas ao vivo. Numa tarde de Verão, andava a nadar no rio, quando, após contornar uma pequena ilha, me deparei com uma mulher que, depois de ter passado o dia a lavar e a corar a roupa, se lembrou de se refrescar nas águas. Não tinha fato de banho, apenas uma combinação. Ao sair da água, começou a despir-se para se enxaguar e vestir a saia. Fiquei sem saber o que fazer, mas não deixei de olhar para o que estava à mostra. Lenta e discretamente fiz um compasso de espera, voltando a cabeça para o açude, dando tempo que a senhora acabasse de se vestir. Quando vi que estava tudo em “conformidade”, retomei o percurso, passando em frente e emitindo um sonoro “Boa-tarde”, o qual foi prontamente correspondido com: “Boa-tarde, menino”!
O acontecimento de Braga, em que foram apreendidos pela PSP volumes de uma obra, cuja capa correspondia ao quadro de Courbet, devido a queixas de alguns adultos que viram algo de maléfico para as crianças, parece-me mais do que excessivo, uma atitude deveras perigosa. Quanto aos adultos que fizeram a queixa não tenho nada a comentar. Têm todo o direito de mostrar a sua indignação face aquilo que consideram ser moralmente condenável. Querem proteger as crianças do mal e do vício. É certo que as crianças são muito curiosas e, desde sempre – não é só de agora -, que querem ver certas “coisas”. Mas quem é que não as quis ver? Muito poucas, decerto. E as que viram, em que é que se tornaram mais tarde? É bom não esquecer que, na altura, não tínhamos com dois clicks a oportunidade de ver o que se vê hoje e até sem clicks! Basta ver a televisão.
O que está a acontecer não augura nada de bom. A justiça e a polícia já começam a proibir e a apreender obras com base em pressupostos moralistas. É certo que no dia seguinte arrepiaram caminho. Apreendem livros. Qualquer dia passam a queimá-los. A seguir prendem pessoas e depois passam a “queimá-las”, também. Primeiro os livros, a seguir os homens.
Quando voltar a Paris, vou dar uma saltada ao Museu d´Orsay. Não vale a pena andar sempre a adiar...
A primeira vez que vi uma fotografia deste quadro, que andou sempre escondido até acabar por ser exposto no Museu d'Orsay, fez-me relembrar algo semelhante, mas ao vivo. Numa tarde de Verão, andava a nadar no rio, quando, após contornar uma pequena ilha, me deparei com uma mulher que, depois de ter passado o dia a lavar e a corar a roupa, se lembrou de se refrescar nas águas. Não tinha fato de banho, apenas uma combinação. Ao sair da água, começou a despir-se para se enxaguar e vestir a saia. Fiquei sem saber o que fazer, mas não deixei de olhar para o que estava à mostra. Lenta e discretamente fiz um compasso de espera, voltando a cabeça para o açude, dando tempo que a senhora acabasse de se vestir. Quando vi que estava tudo em “conformidade”, retomei o percurso, passando em frente e emitindo um sonoro “Boa-tarde”, o qual foi prontamente correspondido com: “Boa-tarde, menino”!
O acontecimento de Braga, em que foram apreendidos pela PSP volumes de uma obra, cuja capa correspondia ao quadro de Courbet, devido a queixas de alguns adultos que viram algo de maléfico para as crianças, parece-me mais do que excessivo, uma atitude deveras perigosa. Quanto aos adultos que fizeram a queixa não tenho nada a comentar. Têm todo o direito de mostrar a sua indignação face aquilo que consideram ser moralmente condenável. Querem proteger as crianças do mal e do vício. É certo que as crianças são muito curiosas e, desde sempre – não é só de agora -, que querem ver certas “coisas”. Mas quem é que não as quis ver? Muito poucas, decerto. E as que viram, em que é que se tornaram mais tarde? É bom não esquecer que, na altura, não tínhamos com dois clicks a oportunidade de ver o que se vê hoje e até sem clicks! Basta ver a televisão.
O que está a acontecer não augura nada de bom. A justiça e a polícia já começam a proibir e a apreender obras com base em pressupostos moralistas. É certo que no dia seguinte arrepiaram caminho. Apreendem livros. Qualquer dia passam a queimá-los. A seguir prendem pessoas e depois passam a “queimá-las”, também. Primeiro os livros, a seguir os homens.
Quando voltar a Paris, vou dar uma saltada ao Museu d´Orsay. Não vale a pena andar sempre a adiar...
3 comentários:
São atitudes pseudo-moralistas como esta que têm vindo a emergir ultimamente e que fazem lembrar outros tempos já bem distantes, em que coexistiam perfeitamente bem os moralistas e os ditadores.
É preocupante, sem dúvida…
É incrivel que tal tenha acontecido com a reproducção daquele quadro. Há de ter sempre essa áurea de pintura proibida. A expressão desta obra faz vibrar mais que qualquer fotografia ou filme ou pornografia. Acho legitimo o choque de quem não distinga. Há ali a mão de um mestre.
Como em outras situações, aquilo que mais nos custa a entender, são os exageros, aquilo que é excessivo. A questão, reside a meu ver na capacidade (ou incapacidade)particular de "riscar" a linha que divide aquilo que é passível de chocar, porque ultrapassa consistentemente o tolerável, ou, aquilo que fica aquem do tolerável, e que por isso possa tambem chocar.
Recordo-me já com pouca precisão, de imagens e entrevistas de rua feitas a senhoras de localidades da zona de Braga, aquando da "invasão" de raparigas brasileiras e de países do leste "importadas" para "atender" clientes nos bares e "casas de alterne".
As senhoras, muito indignadas, opinavam que a polícia deveria expulsa-las e fechar aqueles antros onde os seus amados esposos se "perdiam"(divertiam). As moças... as brasileiras argumentavam que se os esposos das senhoras indignadas as "visitavam" é porque elas sabiam ser mais carinhosas e desinibidas para com eles.
Confesso Senhor Professor, a minha imaginação não foi capaz ainda, de criar a imagem da forma como o mundo se criou, mas uma coisa, a meu ver é inegável (salvo opiniãomelhor fundamentada)se não existisse a mulher, com toda a sua genitália e o seu meticuloso e preciso aparelho reprodutor, a raça humana não existiria, logo, o mundo tambem não. Ou não é verdade que o mundo é uma criação da imaginação humana!?
Alvitra-se agora por aí, que irão ser ministradas nas escolas secundárias, creio, aulas de educação sexual... Hmmm.
Cogito: Até onde se estende e onde termina a abrangência do conceito?
Quem ensina disciplinas, os professores, antes de se encontrarem aptos a leccionar, adquirem formação técnica, qual será a formação exigida àqueles que irão leccionar a disciplina de "Educação Sexual"?
Por último, apesar de um batalhão de outras cogitações me ocorrerem: Um aluno ou uma aluna que, à semelhança de outras disciplinas, não consiga obter aproveitamento nesta, de que forma será vista pelos colegas? Será que os(as) colegas com notas altas, os irão apupar no recreio, chamando-lhes "mariquinhas", ou "impotentezinhos", ou "frigidazinhas"?
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