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segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

A história da Carochinha (versão para adultos)


A história parecia ser mais um daqueles casos recorrentes de hipocrisia colectiva, uma comoção geral perante o caso de uma menina inglesa, de 15 anos, que teve um filho de um menino de 13 anos. Parece que o caso deu origem a também recorrentes debates sobre a gravidez precoce em Inglaterra e, provavelmente, a outras tantas e renovadas teorias.
Mas desconfio que todo este lamento colectivo foi um disfarce. O caso é que não foi a idade da mãe que gerou este alarido, provavelmente não seria notícia nenhuma que uma garota de 15 anos ficasse grávida e levasse a gravidez a bom termo, calculo que seja lamentavelmente frequente. O que deu brado foi a idade do pai, 13 anos! e suspeito que mais pelo facto de causar admiração geral a façanha física do que o escândalo do resultado. O menino, de facto, aparece com cara de anjo, olhinhos perdidos de inocência e cabelo cortado à escovinha, só lhe falta o bibe da escola e terá sido por isso que foi o alvo de todas as curiosidades, a ponto de uma repórter lhe ter perguntado “como é que ele tencionava assumir as responsabilidades?”, “garantir o sustento da família” e outra tantas tontices, mais tontas ainda do que as respostas atarantadas do miúdo.
O “fenómeno” de virilidade precoce foi logo aproveitado como “furo” editorial, e choveram propostas para fazer filmes ou novelas com os heróis da fita, tudo sob a capa do grande drama social ou, ainda vamos chegar a isso, com o pretexto de “ajudar” a jovem família.
Mas o dinheiro, ou a promessa dele, logo despertou memórias afrodisíacas em vários rapazolas da mesma idade e suas zelosas famílias que, perante testemunhas credíveis (até advogados!) logo se chegaram à frente para assumir a paternidade da criança. A avó materna do bébé, que devia estar no mínimo constrangida com o assunto, assegura que a única dúvida é que o jovem amante não mandou nenhum cartãozinho à namorada no Dia dos Namorados o que é, sem sombra de dúvidas, uma mancha negra sobre se afinal foi ele o autor da proeza. Se a garota tinha uma vida sexual no mínimo atribulada, apesar dos seus 15 anos, é coisa que não parece preocupar ninguém, salvo no facto de, pelo resultado, se tratar de “sexo desprotegido”. Mas todos esses detalhes, incluindo a fila de imberbes prováveis candidatos à paternidade da criança, são agora mais pimenta para o argumento que já está a ser escrito para consumo dos espectadores de novelas…Todo este espectáculo degradante parece uma versão cruel e sem ingenuidade da história da carochinha, que só arranjou pretendentes para se casar quando veio à janela anunciar que tinha achado 5 réis ao varrer a cozinha...

6 comentários:

Massano Cardoso disse...

Há certa notícias que me deixam perplexo. Esta é uma delas. A gravidez da adolescência é um epidemia britânica, vão na frente do pelotão seguida das “lusitanas paixões”. É preciso combater este fenómeno, o que não é nada fácil. Agora o que me parece preocupante é um eventual fenómeno de mimetismo que pode ocorrer sempre que acontece um caso destes, porque a lógica dos adolescentes é diferente dos adultos. Não sei se a notícia terá “bons efeitos” na comunidade. Por vezes não divulgar será mais benéfico.

Pinho Cardão disse...

Mas, caro Professor, haveria algum critério jornalístico que não quizesse aproveitar o pitéu?
Vai ser desenvolvido até à náusea. E muitos, muito politicamente correctos, até lhe chamarão serviço público...

Anónimo disse...

Este caso é paradigmático da total falta de valores da comunicação social. Como a Suzana também eu ouvi as perguntas feitas ao rapazito, revelando a mais indecente das explorações do caso.
Não me espanta que agora se desenvolva a costumeira espiral do quanto pior melhor.

Margarida Corrêa de Aguiar disse...

Suzana
A espectacularidade é que vende, seja lá o que for, sem qualquer respeito dos próprios pela sua vida privada. Tudo vale, para se ser célebre, ser capa de revista e ser notícia de abertura de telejornais, nem que seja por alguns minutos.
O importante é a descoberta das vantagens da ocasião, mesmo que toda uma vida fique comprometida por uma infelicidade virada mediaticamente felicidade.
São as entrevistas, a abertura de uma conta para receber ajudas e donativos, os presentes disto e daquilo, os direitos de autor para um livro algures best-seller ou para um filme candidato a um qualquer óscar, oscilando entre a solidariedade e o negócio.
A espectacularidade mediática está cada vez mais ligada ao dramatismo das desgraças da vida alheia, seja porque um rapazinho de 13 anos começa por ser pai mas que afinal é capaz de não ser, seja porque uma mãe divorciada e desempregada com seis filhos engravidou de oito filhos graças às novas tecnologias de fertilização.

Bartolomeu disse...

Se ainda existisse, William Shakespeare , reescreveria a sua peça «Romeu e Julieta», desta feita, com alterações argumentórias, mas certamente socialmente acutilante, rematando por antecipação com a sua "To be or not to be... that's the question... or not...
And...life happens

Suzana Toscano disse...

Caros republicanos, este caso é repugante porque mostra bem a extensão que já atingiu a total ausência de valores ou sequer de meras referências de comportamento, seja das famílias, seja dos jornais, seja das comunidades locais e mesmo das escolas. Segundo vi creio que nesse mesmo dia, é nas escolas (no caso, as britânicas, mas não será exclusivo) que as crianças adolescentes se iniciam na vida sexual e, uma vez iniciadas, a praticam sem rei nem roque. Não é só a gravidez que é preocupante, essa é apenas uma das consequências, é realmente toda a dissolução moral, uma indiferença perante o que deve ou não deve ser o comportamento, o respeito mútuo e os afectos. E o papel das raparigas, e suas mães, apesar de tudo, ainda é o que mais me impressiona.