Vital Moreira teve a amabilidade de tentar esclarecer as dúvidas que enunciei sobre os fundamentos da decisão de Jaime Gama em aceitar a proposta de referendo apresentada pelo PS. Quero antes de mais agradecer o gesto e voltar a colocar outras dúvidas resultantes do seu esclarecimento.
1. Compreendo que o n.º 2 do Art.º 171.º constitui uma excepção à regra das "quatro sessões legislativas", tal como a dissolução constitui a outra excepção. O problema está na forma como se concretiza essa excepção.
2. O referido n.º 2, não determina que " a legislatura da AR então eleita é acrescida da parte da sessão legislativa que estava em curso à data da eleição" como refere Vital Moreira. O que lá está é mais rigoroso: "...a Assembleia então eleita inicia nova legislatura cuja duração será inicialmente acrescida do tempo necessário para se completar o período correspondente à sessão legislativa em curso à data da eleição". O problema está em saber se o tempo inicialmente acrescido constitui ou não uma sessão autónoma. Na forma e no espírito do princípio do quadriénio parece-me lógico ( e a mais uns tantos ilustres constitucionalistas) que não.
3. Continuo a pensar que o problema só se colocou ao Sr. Presidente da AR, Dr. Jaime Gama, pela necessidade de encaixar o referendo no calendário do Partido Socialista e não por previamente se ter aceite e aplicado a tese do Prof. Vital Moreira. Será que sou eu que estou a deturpar e a desvalorizar tão esclarecido raciocínio do Dr. Jaime Gama?
Por fim, se a conformidade do procedimento legislativo fôr reconhecida pelo Tribunal Constitucional poderá o Prof. Vital Moreira ter a certeza que não manterei a minha " radical, e temperamental, oposição ao mesmo". Ficarei decerto "vencido", mas não "convencido". Para além disso, fico apenas curioso em saber como reagirá o Prof. Vital Moreira se o TC rejeitar a sua interpretação.
Os melhores cumprimentos.
5 comentários:
Não foi propriamente uma amabilidade, foi uma demonstração de soberba.
Uma lei constitucional não tem propriamente o volume do 'Guerra e Paz' . Nem pode ter.
Aquilo que me faz uma enorme confusão é:
a) Como é que a mais importante lei da República que deve ter uns duzentos artigos, dos pequeninos, pode ser sujeita a tamanha diferença de interpretações numa questão de calendário, depois de ter sido revista e comentada por centenas de olhos? Quem responde por tamanha incompetência?
b) É semelhante texto destinado ao conhecimento de todos os cidadãos ou a democracia é propriedade dos 230 que estão sujeitos a legislar sob o seu abrigo?
c) Como se explica aos restantes 9 999 670 cidadãos que a lei que obriga os legisladores, que os representam, pode levar a preto ou branco, de acordo com a vontade do artista?
Pelos vistos, 200 artigos é demais para serem trabalhados pelos representantes do povo. Se calhar devemos começar só com os primeiros 20 ou 30, antes de lhes dar-mos coisas mais complicadas...
Que isto faria sangue se o patrão fosse outro, ai isso faria!
Uma lei constitucional presta-se à interpretação que uns quantos iluminados lhe quiserem dar, em função das circunstâncias que entenderem ser do seu interesse, ainda para mais se esses iluminados tiverem sido autores ou pertencerem ao círculo dos «pais» de que eu falei no post original de djustino.
São esses que perante as inconstitucionalidades que diariamente se registam por esse país fora, só erguem o dedo, qual senhor reitor severo, quando a sua obra se vira contra si.
E que argumento pode ter o cidadão comum contra a crítica de Vital do "ignorante que comenta sem saber do que fala"? Nenhum.
Posso responder que a CRP é minha, mas ele não aceitará. Porque é dele.
E todos sabemos que ele passou muitos dias a debate-la e a escreve-la, fechado na AR nos anos quentes da Revolução. E estava em melhores condições que os restantes deputados do PPD e PS, os quais nem comida tinham. Vital por seu turno, estava bem nutrido e consequentemente sabia o que fazia, porque o MFA só distribuia comida e água ao PCP. Havia verdadeiramente umm fibro-vital à frente da constituinte!
Vital está mais por dentro do assunto. Não o contestemos e aceitemos a sua versão da sua obra!
Monteiro:
Sim, tens razão. Quem sou eu, para além de ser o dono da bola, pagar a festa e lançar os foguetes.
Obviamente que se a CRP diz que é à terça e afinal é à quarta é porque eu sou um ignorante, não porque ele é um perfeito incompetente...
Sabem do que é que eu gosto mais na lei?
...
É o facto dela ser geral e abstracta, assim a mesma norma pode ter tantos significados quantos as pessoas que a lerem assim o entederem. É igualzinha à Declaração Universal dos Direitos do Homem. Toda a gente a assinou e ninguém a respeita, embora todos digam o contrário. O que na realidade varia, é o dom da retórica. Há uns que o têm e outros que não.
Nesta perspectiva, os advogados são um bocado como os vendedores, falam pelos cotovelos e puxam a brasa à sua sardinha.
Pessoalmente, acho que fazem bem. Afinal também têm de ganhar a vida e a bem dizer, só compra quem quer.
A propósito do drama que é a interpretação das normas constitucionais, se querem saber, acho que aquilo que menos me preocupa é saber se passaram 1, 2, 3 ou 4 legislaturas. De facto, isso não me interessa mesmo nada. A única coisa que realmente me incomoda é saber o que é que acontece se no referendo ganhar novamente o "não".
O que é que acontece? Vão fazer outro referendo para o ano, para ver se ganha o "sim"? Reformulando a questão; vão fazer referendos até ganhar o "sim"? Ainda por cima, para mudar a lei não precisam de perguntar ao "povinho" se concorda, senão o melhor é começar a pensar em fazer muitos referendos, sobre muitos assuntos que afectam a vida do dia-a-dia dos portugueses.
Se querem que vos diga, esta é uma daquelas situações em que se verifica a máxima do "falem bem ou falem mal, falem é de mim.". É mais um tópico da "to do list" que fazia parte das promessas eleitorais do «tio» Sócrates e que ele já pode riscar. Qualquer pessoa sabe que os referendos, são um daqueles eventos dos quais as pessoas não se esquecem e nas próximas legislativas é sempre algo que se pode arremessar à oposição.
O que os moços da oposição têm de fazer, não é discutir quantas legislaturas passaram ou não passaram (até porque a maior parte das pessoas para além de não ter a minima curiosidade em saber, percebe muito pouco de CRP), mas sim como é que podem contrabalançar os efeitos do evento na cabecita do povito.
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