Aproveito a espera do voo que me trará de volta a Portugal, depois de uns dias de trabalho em Moçambique, para anotar impressões e assim voltar ao 4R após forçada ausência.
À saída deixei um País frio, pesado e triste, uma situação social e económica deprimente e sem sinais de melhorar. À chegada a Maputo e durante estes dias, a sensação é de entrar num mundo diferente em que a euforia de um País a crescer não faz esquecer a imagem do nosso, lá longe, que empurra para aqui muitos dos seus. Para aqui e para muitas outras paragens. Digo para mim próprio que o mundo mudou, é hoje plano e fácil de conhecer e de percorrer, as fronteiras são sobretudo as que os homens impõem e que por isso o movimento de pessoas é um fenómeno natural que as crises só tornam mais sentido. As distâncias já não são entrave, mas os sentimentos, esses sim, podem sê-lo. As fronteiras físicas podem ter sido vencidas, as fronteiras políticas vão caíndo. Mas as fronteiras das afetividades são laços que nos ligam ao sítio onde nascemos, à família e aos amigos, não desaparecem assim, ou pelo menos a sua destruição não pode assim ser explicada.
Aqui ouvi de quem de Portugal para cá veio viver, um provérbio que não conhecia mas que retrata com crueldade o que se passa com Portugal: pai galelo, filho fidalgo, neto pedinte. Gerações de filhos fidalgos de pais esforçados legam aos mais novos o empobrecimento e a desesperança. Os que não se conformam com a condição de neto deserdado transformado em pedinte, vão à procura de oportunidades de vida que preencham as suas ambições, onde quer que elas surjam. Encontrei-me aqui com muitos deles. Recém-licenciados uns, cansados de lutar sem sucesso por um posto de trabalho outros, desempregados sem esperança de perder esse estatuto, ainda outros. Alguns com família recentemente constituída, mulher e filho pequeno lá longe, a muitos e muitos quilómetros. Encaram de frente o amargo da saudade mais que certa, o afastamento da terra que lhes fecha as portas.
Ele há provérbios que deveriam ser uma fantasia. Este, desgraçadamente, retrata bem a realidade.
6 comentários:
Os países africanos não me atraem.
Talvez por isso, quando tive oportunidade de visitar alguns, rejeitei-a.
Basta-me conhecer um conjunto de circunstâncias em que os povos desses paises vivem, sujeitos à ganância de um punhados de agentes ligados aos governos, os quais lhes impõem uma ditadura que escravisa dentro da sua própria terra, para que qualquer fraca vontade de para lá viajar, se desvaneça.
Quanto ao provérbio, caro Dr. José Mário e quase plagiando Sttau Monteiro, diria que felizmente ha provérbios que são fantasias.
O país a que está prestes a regressar, continua frio, estamos sob a influência de uma massa de ar polar, aumentam os casos da gripe H1N1 e a situação económica do país, teima em manter-se a baixo da linha de àgua. Mas como somos um país de mareantes, esse talvez seja um mal menor.
Voltando ao provérbio, queria dizer-lhe que não é forçoso que o filho de um galego, ou de um moiro,venha a ser um fidalgo, assim como o seu filho, caia na desgraça da indigência.
O fundamental é que tanto os avós, como os pais, e os filhos, conheçam a realidade, a interiorizem e encontrem forma de a combater e alterar.
PS:
Desejo-lhe uma excelente viagem de regresso.
O "Quarta" e os "Quartinhas" aguardam-no com saudade.
Ditado da Arábia, tambem certissimo: o meu pai andou de camelo, eu ando de carro, o meu filho de avião, e o filho dele andará de camelo.
José Mário
Não conhecia o provérbio, muito bem apanhado para descrever o empobrecimento e a desesperança que graça em Portugal que obriga muitos dos nossos a irem embora à procura de um "abrigo", desconhecendo ainda assim o futuro, mas na esperança de encontrarem uma solução para as suas vidas. O povo é sábio, os provérbios também nos dão algumas lições.
De facto, a geração dos avós emigrou em massa para África, porque por cá as perspectivas eram nulas. E África, nessa altura, ficava à distância de viagens de um mês de barco, as cartas levavam outro tanto para cá e para lá, não havia como telefonar. Os pais nasceram por lá, voltaram com as independências com a vida às costas, o país fez-se grande para os acolher, apesar do sofrimento, os netos retomam o caminho, às vezes parece mesmo que o mundo anda às voltas e volta ao ponto de partida. Oxalá sejam bem acolhidos e possam voltar com uma vida mais promissora do que a que imaginavam antes de partir.
A diferença - penso - está no "espírito" que guiou aqueles que no início dos anos 60 imigraram em massa para Angola e Moçambique. Aquela, era a "terra prometida" para aqueles que viviam no interior do país e ouviam falar de terrenos ferteis que podiam produzir 3 e 4 vezes por ano.
Essa promessa, somada à promessa de um governo que tinha como objectivo povoar e explorar as riquezas de um território imenso, fizeram com que milhares de portugueses abandonassem as suas aldeias e rumassem sem nada de seu, até uma terra que lhes prometia - e até certo ponto cumpriu a promessa, e só não lhes foi mais madrinha devido à ganância dos homens - prosperidade.
Mas esses homens e sobretudo os homens que se lhes seguiram, olharam para a terra como uma segunda pátria e alindaram-na, adomaram-na ao seu gosto, construiram lugares aprazíveis, infraestruturas que lhe conferiram o estatuto de país evoluído e civilizado, não se limitando a explorar-lhe as riquezas e, preocupando-se em criar os alicerces da sustentabilidade.
E hoje?
Qual é o espírito que guia aqueles até lá se dirigem?
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