As notícias sobre corrupção e tráfico de influências têm sido uma constante e não abonam nada sobre o estado de saúde da sociedade portuguesa. É indispensável uma cultura de responsabilidade e um comportamento ético que nos possam colocar numa posição cimeira. Recordo-me de um ensaio de um cientista francês que, há muitos anos, afirmava: “a proporção de desonestos, mentecaptos e corruptos é uma constante em todas as classes sociais”. Certo. Pode ser uma constante, mas temos a obrigação de contribuir para a sua redução. A este propósito, não posso deixar de contar uma pequena história. Não se passou comigo, mas sim com um colega britânico.
Nos anos setenta, um famoso pediatra britânico, conhecido pela sua erudição e muito respeitado, quer pelos doentes quer pelos colegas (chegou a exercer funções ao mais alto nível, inclusive, como pediatra da corte), foi convidado para se deslocar a um determinado hospital a fim de participar como elemento do júri de exame de médicos. O local e as instalações onde iria permanecer eram particularmente convidativos. Na mesma altura, um segundo examinador, igualmente bastante prestigiado, foi também convidado para participar nas provas.
O local paradisíaco e o hotel reconhecido pelas características luxuosas auguravam uma óptima estadia, não obstante o trabalho. Na véspera do exame final uma alta e muito distinta personalidade visitou o pediatra revelando, através de uma conversa muito complicada, que o seu querido sobrinho iria fazer exame no dia seguinte. Aproveitou a oportunidade para testemunhar o seu elevado apreço e estima por estar presente perante uma grande sumidade e, no seguimento, quis presenteá-lo como uma cigarreira de ouro cravejada de pedras preciosas, uma verdadeira jóia. O pediatra, homem de valores e de uma ética irrepreensível recusou a oferta. No dia seguinte, sentiu forte ansiedade na expectativa de poder encontrar o “sobrinho” e, eventualmente, o prejudicar – involuntariamente – na sequência do episódio da tentativa da oferta da cigarreira. Ficou satisfeito quando se apercebeu que não iria examinar o candidato.
No regresso de avião, refastelado na primeira classe, repisava mentalmente o episódio sentindo-se tranquilo por não ter feito o exame ao candidato, porque temia não ter sido capaz de imparcialidade. Durante estas lucubrações o colega que o acompanhava perguntou-lhe de supetão: - Philip, eu não me lembro, mas fuma? Enquanto fazia a pergunta retirava do bolso uma soberba cigarreira de ouro cravejada de pedras preciosas…
Hoje, não seria possível ter acesso a esta história, não só porque os médicos britânicos deixaram de fumar – numa elevadíssima percentagem – como também não é permitido fumar nos aviões.
Bom, entretanto o ouro e as pedras preciosas deverão continuar a ornamentar outros artefactos…
1 comentário:
...a corrupção faz parte da natureza humana, está inscrita na cultura adquirida durante muitas gerações..não é adequado pensar-se em eliminá-la...mas que se pode combater com relativa eficácia, pode com certeza. haja coragem e vontade política!
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