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quarta-feira, 10 de agosto de 2005

Original bolsa de estudo…


Loss of virginity - Gauguin


O Uganda não para de nos surpreender na sua estratégia de luta contra a Sida. Um país pobre, corrupto, para não fugir à regra da maioria dos países africanos, inserido numa zona de globo onde os conflitos armados são uma constante, em que os problemas dos refugiados são muito preocupantes, a ponto de justificar a primeira iniciativa do novo Alto Comissário para os Refugiados da ONU - o português António Guterres - conseguiu na última década e meia reduzir de uma forma ímpar a prevalência da Sida. Desconfio que mais nenhum país conseguiu atingir a expressão verificada entre os ugandeses. De acordo com os relatos públicos, as razões deste sucesso foram as medidas promovidas entre os locais, nomeadamente, os apelos à abstinência e à monogamia. O papel dos preservativos não foi considerado como tendo sido tão significativo face às outras duas medidas.
Não pondo em causa a honestidade dos promotores e divulgadores do programa, sempre achei intrigante como foi possível alcançar aqueles resultados. Como epidemiologista cheguei a questionar se a elevada prevalência e a consequente mortalidade não deveria ter tido um papel de relevo ao diminuir o número de infectados. Foi-me respondido, num forum internacional, que não. A razão prendia-se com a aquisição de novos hábitos. A abstinência e a fidelidade eram a chave do sucesso.
Recentemente, no âmbito de uma conferência internacional, Maria Vawer, da Universidade de Columbia (E.U.A.), apresentou os resultados de 10 anos de investigação, realizada no distrito de Rakai, tendo concluído que o aumento das taxas de mortalidade, mais do que as estratégias advogadas, seria a explicação para o fenómeno. O número de mortes excede as novas infecções (2 para 1). Das três medidas que fazem parte da estratégia de prevenção da Sida no Uganda, abstinência, fidelidade e uso de preservativos, somente este último é que coincidiu com o declínio do número de pessoas infectadas com HIV.
De qualquer modo, os políticos locais continuam empenhados em promover medidas que contrariem as tendências obscenas da epidemia da Sida em África. Desta feita, vão ser atribuídas bolsas às meninas que se mantenham virgens até final dos seus cursos universitários. E depois? No fim terão de ser submetidas a uma observação para provar que o hímen se mantém integro! Não sei o que acontecerá se o "selo" estiver violado. Provavelmente terão de devolver a bolsa! Genialidade africana. No entanto, não deixa de ser discriminatória face aos rapazes virgens. Espero que os autores, ou os “ideólogos”, não promovam a ideia no Ocidente, caso contrário, ficarão com a maior parte das bolsas de estudo nas gavetas...

1 comentário:

Suzana Toscano disse...

Houve há algum tempo um documentário na televisão sobre uma aldeia na Africa do Sul onde as mulheres se organizaram para proteger essa região do flagelo da Sida e era exactamente nos mesmos termos que o Prof.Massano nos relata.As meninas são levadas para uma vasta zona isolada, onde têm escola e onde são vigiadas pelas mulheres mais velhas. A regra é manterem-se virgens e terem em troca boas condições de vida, caso contrário são expulsas e "devolvidas" `a contaminação exterior. Os exames à virgindade são feitos em público e se o resultado não for satisfatório há um processo humilhante que pretende dissuadir todas as outras. Grandes males, grandes remédios? É claro que os homens casadoiros é lá que vão buscar as noivas, mas não constou que se submetessem a quaisquer provas de pureza.