A cada Verão de chamas e incêndios reaparecem as imagens de aldeias e minúsculos povoados cercados pela ameaça de se verem reduzidos a cinzas. As populações ora se resignam ora resistem irresponsavelmente ao avanço das chamas. São na sua maioria idosos, alguns já incapacitados para o amanho regular da pequena leira de terra que lhes forneceu durante vidas o parco alimento que os faz subsistir numa miséria prolongada. Outros defendem, até à última gota de água, a casa que construíram a custo de uma poupança amealhada por terras de França ou do Luxemburgo. Escolheram o terreno herdado dos pais, muitas vezes no meio da floresta desordenada, longe de uma fiscalização mais apertada ou bem perto do silêncio complacente de fiscais e autarcas.
Esquecem-se todos e muitos de nós também que há décadas que estes povoados vêm sendo pasto de um outro incêndio sem chamas que lhes levam as almas para bem longe. A hemorragia demográfica rouba-lhes as novas gerações que aspiram a melhores condições de vida, esvazia-lhes a escola das crianças, quando não mesmo o cura da pequena capela plantada no adro cimeiro. Tudo se transforma em menos, salvo a floresta e o mato que avança em redor da aldeia, por baldios e leiras abandonadas.
Este é o verdadeiro drama das aldeias serranas e de tantas outras que polvilham o território. São o testemunho de um Portugal esquecido que apenas emerge para a opinião pública, quando a desgraça das chamas e as cinzas da sua passagem se revelam para que as câmaras de televisão registem o espectáculo indecoroso da incúria e da resignação.
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