Parece que somos o País que mais aposta no euromilhões, cerca de 9 milhões de apostas, segundo ouvi recentemente. As 6ªs feiras ganham uma emoção especial porque é o dia em que se anunciam os prémios, cada cidadão com os olhos brilhantes de ansiedade a seguir as bolinhas a rolar, para logo se deixar cair de desânimo, “logo vi que não me ia calhar a mim, eu não tenho sorte…”. Vai ser preciso arrastar a melancolia mais uma semana, ir pagar o tributo na fila dos apostadores, isto já é uma rotina, mas que outra esperança resta senão a de nos sair a sorte grande?
Não sei o que se passa nos outros países, mas a publicidade que promove o euromilhões em Portugal é bem o espelho de uma mentalidade. Para que quer uma pessoa ser milionária?, qual é o sonho que estimula, qual é a imagem que associamos a quem dispõe de muitos milhões? É a figura de um empreendedor, de um homem de negócios, de alguém que irá contribuir para o bem estar dos outros? Nada disso. O euromilhões serve para “criar excêntricos”, a riqueza é o direito ao esbanjamento, ao luxo absurdo, é a entrada no paraíso de ter quem lhe satisfaça os caprichos a uma simples ordem.
Não sei o que se passa nos outros países, mas a publicidade que promove o euromilhões em Portugal é bem o espelho de uma mentalidade. Para que quer uma pessoa ser milionária?, qual é o sonho que estimula, qual é a imagem que associamos a quem dispõe de muitos milhões? É a figura de um empreendedor, de um homem de negócios, de alguém que irá contribuir para o bem estar dos outros? Nada disso. O euromilhões serve para “criar excêntricos”, a riqueza é o direito ao esbanjamento, ao luxo absurdo, é a entrada no paraíso de ter quem lhe satisfaça os caprichos a uma simples ordem.
De acordo com o estereótipo nacional, que a publicidade aproveita, um milionário é um inútil que gasta a rodos o dinheiro que não lhe custou a ganhar. Não deixa de ser um paradoxo que aceitemos com bonomia, e até com aplauso, que alguém possa obter milhões nas apostas de poucos euros e decida desbaratar a sorte sem construir nada de duradouro, como se o modo como o ganhou signifique um interlúdio inesperado no rame rame da mediania triste, essa sim, a condição genuína a que a fatalidade condena o comum dos mortais.
Nada disto se confunde com o modo como olhamos os ricos que progrediram à custa do seu trabalho e do seu sucesso. Esses, que criam emprego e trazem progresso, são olhados com desconfiança, com uma inveja disfarçada sempre pronta a descobrir o podre que, lá no fundo bem no fundo, poderá explicar esse sucesso que outros não conseguiram. Um rico que cria empregos é escrutinado nos seus hábitos de vida, um automóvel caro ou uma casa de luxo é quase uma indecência, um insulto a quem é pobre ou vive do ordenado que ele se digna pagar para quem trabalha para ele. Ser um destes ricos é difícil e arriscado, mais vale desdenhar ou hostilizar para que haja uma boa razão que nos dispense de tentar ser como eles.
Já com um “euromilhões” só a sorte é que dita o destino, nem trabalho, nem talento, nem risco, podia ser aquele como ser um de nós, justiça mais democrática não existe, só esperamos é que o dinheirinho seja gasto à farta num egoísmo mais que justificado, pois se saiu de borla porque é que não há-de estoirá-lo?, para que a felicidade do sortudo não dure para sempre…
Nada disto se confunde com o modo como olhamos os ricos que progrediram à custa do seu trabalho e do seu sucesso. Esses, que criam emprego e trazem progresso, são olhados com desconfiança, com uma inveja disfarçada sempre pronta a descobrir o podre que, lá no fundo bem no fundo, poderá explicar esse sucesso que outros não conseguiram. Um rico que cria empregos é escrutinado nos seus hábitos de vida, um automóvel caro ou uma casa de luxo é quase uma indecência, um insulto a quem é pobre ou vive do ordenado que ele se digna pagar para quem trabalha para ele. Ser um destes ricos é difícil e arriscado, mais vale desdenhar ou hostilizar para que haja uma boa razão que nos dispense de tentar ser como eles.
Já com um “euromilhões” só a sorte é que dita o destino, nem trabalho, nem talento, nem risco, podia ser aquele como ser um de nós, justiça mais democrática não existe, só esperamos é que o dinheirinho seja gasto à farta num egoísmo mais que justificado, pois se saiu de borla porque é que não há-de estoirá-lo?, para que a felicidade do sortudo não dure para sempre…
10 comentários:
A propósto do assunto deste, assinalo com alguma estranheza um outro "fenómeno" comum a esta "coisa" de concursos e de prémios, que muita estranheza me causa.
Assisto esporádicamente e aos "bochechos" a um concurso que passa se não estou em erro no canal 1 da RTP, ititulado "jogo duplo" e que é apresentado por José Malato. O vencedor de cada sessão deste concurso, durante a semana, concorre novamente no final da semana, onde pode ganhar um prémio de €10.000, acumulado com o prémio da sessão anterior.
Resumindo: no decorrer da sessão o apresentador vai conversando com os concorrentes, e colocando-lhes questões relacionadas com a profissão. Dessa forma, ficam os espectadores a conhecer detalhes da vida dos concorrentes, como seja por exemplo o facto de estarem desempregados e ainda, tencionarem gastar o dinheiro crrespondente ao prémio que hipotéticamente irão receber, viajando.
Na verdade, e a publicidade esplora esse estereótipo que a cara Drª. Suzana refere, o modesto cidadão, potencial jogador, sonha com o esse dia mágico de verificar que os números em que apostou coincidem rigorosamente com os que foram sorteados, para dar azo e asas a uma total e completa manifestação de excentricidade.
Verifico algumas faltas de letras e troca de "s" por "x", provávelmente derivados da grande ansiedade que sinto face à probabilidade de vir a ser o próximo milionário excêntrico... excentricidade já possuo q.b., considero que me encontro no caminho certo...
;))
Parecemos uma tribo indígena à espera que um deus qualquer da chuva lhes traga boas colheitas. Em vez de nos metermos ao trabalho e fazermos um "euromilhões" para cada um de nós com o esforço do nosso suor, preferimos ir arrastando os problemas eternamente, e esperar que um golpe de sorte, um acaso, um fenómeno qualquer transcendente, nos tire desta modorra.
E depois temos todo este conceito de que viver bem é não trabalhar. Olhem se o Buffet, o Gates ou o Ingvar Krampad tivesse parado aos primeiros milhões que fizeram, muito menos gente teria oportunidade de partilhar o seu sucesso e riqueza.
Enquanto esta mentalidade mesquinha, preguiçosa e fatalista não for varrida do panorama nacional, não iremos muito longe.
Há pessoas que nasceram com o dom da escrita, disso eu não duvido, e a prova está neste belíssimo texto (talvez devesse dizer análise sociológica sobre o fenómeno euromilhões) da Dra. Suzana Toscano.
Sou daqueles que todas as quintas feiras (é o meu dia da sorte), contribuo com a minha quota-parte para engrossar o bolo que um dia, penso eu e mais não sei quantos milhões, será meu. E todas as sextas-feiras, lá estou eu, com um olho na Marisa Cruz e outro naquelas bolinhas totalmente esféricas, que fazem a alegria de tanta gente. Mas até agora, nada!
O que eu faria com aquele dinheiro todo? Muita coisa, menos comprar um “jarvas” e uma caravana para ir ao Paris-Dakar...
Será que estou a pedir muito?
Caro Bartolomeu, mais x, menos x, os seus comentários são sempre muito impressivos, deixe lá as gralhas que se faz entender muito bem :)Isso dos concursos é que não vejo mesmo,enerva-me que as pessoas se sujeitem àquilo, geralmente quando estão quase a ganhar perdem tudo e depois, é como diz, vão dando confiança ao entrevistador, que faz bem o seu trabalho, e expõem-se imenso, é mesmo preciso querer muito comprar um carro ou o que quer que seja, senão for mesmo desespero.
Caro rxc, não é por acaso que ainda estamos à espera do D. Sebastião, que havia de chegar num dia de nevoeiro, para o choque ser ainda maior, só dávamos por ele quando estivesse mesmo perto, o nevoeiro havia de ocultar a esperança até ao fim. Ainda por cima um rei que nos levou à ruina total,até morreu a fina flor dos jovens de então, num erro de estratégia absurdo. Será um anátema?
Caro jotac, então queria ser uma raridade? Quem não joga no euromilhões não acredita na sorte, por isso não a merece!Mas aposto que quando ganhar o grande prémio vai ser um excêntrico como deve ser, a abrir empresas, fundações de solidariedade,mecenato artístico, coisas assim...ou seja, vai ter saudades do tempo em que não lhe dava para ser original! :))
Cara Suzana Toscano, os meus sentidos e muito sinceros PARABENS por em tão poucas linhas ter conseguido dizer tanto e tão acertadamente. Esses e outros aspectos são precisamente aquilo que é a Portugalidade. E por causa de muitas das coisas que aponta Portugal tem perdido muito do seu sangue diferente e empreendedor que prefere investir o seu dinheiro em paragens mais amigaveis do que no seio desta sociedade hostil para quem se dispõe a ir mais além.
Um grande, grande bem-haja a si!
Caro Zuricher, obrigada, ainda bem que gostou, o 4r serve para isto mesmo, para irmos conversando de coisas sérias meio a brincar...
Suzana
Com a mentalidade que está instalada, como é que os Senhores Silvas de Portugal conseguiriam resistir à publicidade "tóxica" do convite à excentricidade? Lembro-me de uma dessas campanhas da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa que incentivava ao jogo no euromilhões, fazendo crescer a água na boca dos Senhores Silvas com um passeio de limusina no deserto, com motorista, acompanhante, ar condicionado e bar aberto. Vende mesmo!
Pelo tipo de publicidade se vê bem a nossa mentalidade. Em vez de convidar as pessoas a jogar por uma causa social, fazendo alguma pedagogia e informando e formando, o que interessa é criar a fúria de ser rico e ganhar todo o dinheiro do mundo!
Belo retrato do País!
Um excelente retrato, Suzana.
O sentimento que boa parte da população tem em relação às fortunas, tende a valorizar aquelas que se obtêm sem esforço, pela sorte ou pela herança, e a desconfiar e desprezar aquelas que conseguiram com trabalho e pelo génio.
É estranho, mas em certos aspectos somos um povo estranho...
Caros Margarida e Zé Mário, o que acontece é que é o lado estranho que é explorado e instigado, o lado bom é abafado e acaba por desisitir de tentar sobreviver.É muito mais difícil de governar um povo exigente, ciente dos seus direitos e defensor dos seus interesses, é muito mais fácil separar quando não há laços solidários nem sentido de comunidade. E é muito mais fácil humilhar quando já não há autoestima e as pessoas se contentam com pouco e mesmo assim acham que lhes foi dado porque não ousam pensar que o merecem. Séculos disto, é o que dá, basta ver o que os portugueses podem brilhar e expandir-se quando saem do quadradinho...
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