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quinta-feira, 12 de março de 2009

Money, money,money


A realidade mostra-se na sua crueza de formas muito variadas, em geral bem mais explícitas do que uma infinidade de alertas gerais. Em dois dias, três episódios que pude testemunhar demonstram como a vida real se vai enredando numa teia cujo fio ninguém consegue desembaraçar.
O primeiro foi uma conversa com um pequeno empresário, que me contou que vive momentos de grande dificuldade, não porque tenha deixado de ter os habituais clientes mas porque o banco, junto do qual tem um crédito, aumentou pela 3ª vez, sem qualquer cerimónia, o spread contratado. Perante a minha incredulidade, quer porque me parecia que um banco não devia poder mudar o contrato sem ao menos falar com o cliente, quer porque as taxas de juro, como ouvimos até à agonia, têm descido todos os dias, o empresário mostrou-me a carta/circular do dito banco que, de uma forma seca e impessoal, argumentava com a crise de financiamento para comunicar que o preço do dinheiro em dívida tinha sofrido um novo aumento, passando agora a taxa a ser de…mais de 10%! A alternativa era ele liquidar a dívida. O empréstimo tem uma hipoteca como garantia e o devedor nunca falhou um pagamento, mas vai ter que fechar a empresa porque o "seu" banco não quer saber dele para nada.
O segundo foi o caso de uma jovem gestora de conta que há dias propôs por mail uma aplicação financeira num produto maravilha qualquer, e ao qual nem sequer demos resposta. Recebemos dias depois um mail com o título Favor/Ajuda, em que ela pedia, por favor, que aceitássemos a proposta, ao menos no mínimo possível de aplicação de 500€, porque era o que bastava para cumprir o objectivo que lhe estava marcado. Era uma grande ajuda!, terminava em tom comovente, deixando-nos um enorme sentimento de culpa.
Finalmente, ao abrir a caixa do correio deparei com um envelope desdobrável todo colorido, anunciando que eu tinha "ganho um crédito de 5€" para "trocar no jogo de apostas sem quaisquer riscos ou obrigações" através do endereço electrónico com o sugestivo nome de bet-at-home, subtítulo life is a game, seguido do código e das instruções para abrir a conta pessoal de apostas. Não me dei ao trabalho de ver o site, mas o anúncio garante que já tem mais de 1,5 milhões de apostadores na Europa.
Money, money, money!Um empresa asfixiada com as decisões cegas do banco credor; a manutenção pelos bancos dos objectivos cegos que levam ao desespero de quem tem que os cumprir sem pensar um segundo se está a servir o cliente; e as iniciativas despudoradas para incitar os incautos a dissipar o pouco que lhes resta sem sequer sairem de casa, três casos que mostram bem como ainda estamos tão longe da mudança de comportamentos, de mais ética, de mais responsabilidade, de mais decoro. Que longa caminhada a percorrer!

3 comentários:

jotaC disse...

Money, Money, Money…tema de tantas canções que aguçam o desejo de o possuir, tanto pelo trabalho como por formas expeditas isentas de quaisquer príncipios éticos. É o velho provérbio: o dinheiro não dá felicidade mas ajuda muito!

Bartolomeu disse...

Intriga-me cara Drª. Suzana, o facto de, perante estas situações que relata e outras que nos chegam ao conhecimento, inclusivé através dos orgãos de comunicação, o nosso estado não assumir uma posição de controlo, ou de regulação, limitando-se a assumir uma posição autista, relativamente a estes atentados e ainda ter a distinta lata de "esganiçadamente" pedir (exigir)aos empresários que invistam, que inovem e que exportem.
Robin wood!!! where are you my friend?

Margarida Corrêa de Aguiar disse...

Suzana
Em relação aos episódios que nos conta envolvendo bancos, até não me admiraria que fosse o mesmo banco, o que se passa é a total inversão de comportamentos e valores, continua a ser o primado do objectivo/resultado imediato ainda que comprometendo o futuro, porque não importa que futuro, agora há que cuidar do presente, depois logo se verá, custe o custar. Sem futuro, sem empresas, sem criação de riqueza, não haverá spreads para praticar nem poupança para captar!