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segunda-feira, 16 de março de 2009

Tremendismo: estado de espírito ou ideologia?

Eis que se afirma mais um ismo, sendo cada vez mais os seus adeptos.
Esta onda que se acentua nos fins de semana, aplaude entusiasticamente quem aparece a dizer ou escrever que este país está condenado a afundar-se sem solução. Faça-se o que se fizer para resolver os problemas e procurar viver melhor...
Perturba-me a actual dimensão do tremendismo - que se tornou moda exibida sempre com anúncio prévio nas passerelles mediáticas -, há uns tempos meramente semântica, como assinalava aqui Suzana Toscano. Expressava pelas palavras o estado de espírito geral negativo, quase depressivo, que se veio a acentuar à medida que se acentuaram as dificuldades resultantes da crise e da incapacidade das lideranças em substituir o pessimismo pela esperança, ainda que fosse em unidoses...
Hoje, porém, o fenómeno assume foros de verdadeira ideologia. Hipnótica para uns tantos a quem a ideia da falência ou da proximidade de um apocalipse nacional provoca frémitos de verdadeiro histerismo. Nota-se bem este efeito neste mundo da blogosfera que assiste a momentos de grande agitação sempre que uma dessas pitonisas da desgraça se pronuncia, anunciando as sete pragas com uma convicção biblica.
É verdade que não nos dão grandes motivos para otimismos. No 4R, faz-se o exercício cívico de anotar e comentar as razões para o desconcerto em que vivemos e para os riscos de, continuando assim, dificultarmos a vida desta geração e das que nos seguem. Mas por aqui também acreditamos no país de que somos parte. É por isso que reclamamos por uma nova república. Sempre com o espírito de que é possível dar a volta por cima.
Foi assim noutros momentos difíceis de uma História que nos orgulha.
Mude-se, pois, l´air du temps ...

3 comentários:

Bartolomeu disse...

Um dos "Novos Contos da Montanha" de Miguel Torga, recheia-se da personagem (apaziguadora) do Alma-Grande.
«Alto, mal encarado, de nariz adunco, vivia no Destelhado, uma rua onde mora ainda o vento galego, a assobiar sem descanso o ano inteiro. Quem vinha chamar aquele pai da morte já sabia que tinha de subir pela encosta acima a lutar como um barco num mar encapelado.»
Decorre o conto, até que entra em cena uma criança.
«Quando a hora do Isaac chegou, foi um filho, o Abel, que trepou a ladeira. O garoto vinha excitado, do movimento desusado de casa, da maneira estranha como a mãe o mandara chamar o Tio Alma-Grande, e da ventania.»
«Calado, o Alma-Grande avançou. Mas quando de mãos abertas e joelho dobrado ia a cair sobre o Isaac, fê-lo parar uma voz diferente de todas as que ouvira em momentos iguais, que parecia vir do outro mundo, e dizia:
- Não... Ainda não... Ainda não…»
Uma nova República urge, caro Dr. José Mário, mas... sem sangue, sem a asfixia do joelho e das manápulas do "Alma-Grande". E o momento ainda não é o certo.
"Não... Ainda não... Ainda não..."
Optimistas sim, devemos manter-nos sempre, atentos e motivados tambem. E sempre conscientes do valor e do poder da palavra.
Para finalizar este comentário, de Eugénio de Andrade:
"As Palavras"
São como um cristal,
As palavras
Algumas um punhal,
Um incêndio
Outras,
orvalho apenas,
Secretas vêm, cheias de memória.
Inseguras navegam:
Barcos ou beijos,
As águas estremecem,
Desamparadas, inocentes, leves.
Tecidas são de luz e são a noite.
E mesmo pálidas
Verdes paraísos lembram ainda,
Quem as escuta?
Quem as recolhe, assim,
Crueis, desfeitas,
Nas suas conchas puras?

jotaC disse...

Caro Drº Ferreira de Almeida:
Tem toda a razão, é preciso realmente “dar a volta por cima”, sob pena de ficarmos uma nação cada vez mais pobre e descrente da capacidade de melhorar. Mas, para que isso aconteça há que substituir os actuais políticos, responsáveis sem dúvida por este descrédito em tudo e todos, por outros que consigam falar verdade de modo a aglutinar as ideias e as sinergias de maioria dos portugueses. É urgente que uma nova onda se levante, sem isso não me parece que saiamos deste marasmo…

Margarida Corrêa de Aguiar disse...

José Mário
Somos um povo pessimista, estamos sem fé, são os “brandos costumes” a funcionar.
É expectável que depois de tantas crises, umas atrás das outras, se instale um clima de descrédito e de desconfiança. Para contrariar esta atitude seria necessário ganharmos forças para transformar as adversidades, de que temos grandes responsabilidades, em oportunidades.
Temos falta de líderes, e os que temos não aparecem, precisamos de pessoas em quem se reconheça autoridade e credibilidade para desafiarem o país a mudar, a ter um desígnio nacional. A crispação a que se chegou na sociedade portuguesa, trazida por um combate político às vezes com contornos suicidas, não ajuda à união, a olharmos em conjunto para o futuro.
Não é com “tremendismo” que vamos ultrapassar as dificuldades que temos. O “tremendismo” só serve a mediocridade, para nos enterrarmos ainda mais!