Eis que se afirma mais um ismo, sendo cada vez mais os seus adeptos.
Esta onda que se acentua nos fins de semana, aplaude entusiasticamente quem aparece a dizer ou escrever que este país está condenado a afundar-se sem solução. Faça-se o que se fizer para resolver os problemas e procurar viver melhor...
Perturba-me a actual dimensão do tremendismo - que se tornou moda exibida sempre com anúncio prévio nas passerelles mediáticas -, há uns tempos meramente semântica, como assinalava aqui Suzana Toscano. Expressava pelas palavras o estado de espírito geral negativo, quase depressivo, que se veio a acentuar à medida que se acentuaram as dificuldades resultantes da crise e da incapacidade das lideranças em substituir o pessimismo pela esperança, ainda que fosse em unidoses...
Hoje, porém, o fenómeno assume foros de verdadeira ideologia. Hipnótica para uns tantos a quem a ideia da falência ou da proximidade de um apocalipse nacional provoca frémitos de verdadeiro histerismo. Nota-se bem este efeito neste mundo da blogosfera que assiste a momentos de grande agitação sempre que uma dessas pitonisas da desgraça se pronuncia, anunciando as sete pragas com uma convicção biblica.
É verdade que não nos dão grandes motivos para otimismos. No 4R, faz-se o exercício cívico de anotar e comentar as razões para o desconcerto em que vivemos e para os riscos de, continuando assim, dificultarmos a vida desta geração e das que nos seguem. Mas por aqui também acreditamos no país de que somos parte. É por isso que reclamamos por uma nova república. Sempre com o espírito de que é possível dar a volta por cima.
Foi assim noutros momentos difíceis de uma História que nos orgulha.
Mude-se, pois, l´air du temps ...
3 comentários:
Um dos "Novos Contos da Montanha" de Miguel Torga, recheia-se da personagem (apaziguadora) do Alma-Grande.
«Alto, mal encarado, de nariz adunco, vivia no Destelhado, uma rua onde mora ainda o vento galego, a assobiar sem descanso o ano inteiro. Quem vinha chamar aquele pai da morte já sabia que tinha de subir pela encosta acima a lutar como um barco num mar encapelado.»
Decorre o conto, até que entra em cena uma criança.
«Quando a hora do Isaac chegou, foi um filho, o Abel, que trepou a ladeira. O garoto vinha excitado, do movimento desusado de casa, da maneira estranha como a mãe o mandara chamar o Tio Alma-Grande, e da ventania.»
«Calado, o Alma-Grande avançou. Mas quando de mãos abertas e joelho dobrado ia a cair sobre o Isaac, fê-lo parar uma voz diferente de todas as que ouvira em momentos iguais, que parecia vir do outro mundo, e dizia:
- Não... Ainda não... Ainda não…»
Uma nova República urge, caro Dr. José Mário, mas... sem sangue, sem a asfixia do joelho e das manápulas do "Alma-Grande". E o momento ainda não é o certo.
"Não... Ainda não... Ainda não..."
Optimistas sim, devemos manter-nos sempre, atentos e motivados tambem. E sempre conscientes do valor e do poder da palavra.
Para finalizar este comentário, de Eugénio de Andrade:
"As Palavras"
São como um cristal,
As palavras
Algumas um punhal,
Um incêndio
Outras,
orvalho apenas,
Secretas vêm, cheias de memória.
Inseguras navegam:
Barcos ou beijos,
As águas estremecem,
Desamparadas, inocentes, leves.
Tecidas são de luz e são a noite.
E mesmo pálidas
Verdes paraísos lembram ainda,
Quem as escuta?
Quem as recolhe, assim,
Crueis, desfeitas,
Nas suas conchas puras?
Caro Drº Ferreira de Almeida:
Tem toda a razão, é preciso realmente “dar a volta por cima”, sob pena de ficarmos uma nação cada vez mais pobre e descrente da capacidade de melhorar. Mas, para que isso aconteça há que substituir os actuais políticos, responsáveis sem dúvida por este descrédito em tudo e todos, por outros que consigam falar verdade de modo a aglutinar as ideias e as sinergias de maioria dos portugueses. É urgente que uma nova onda se levante, sem isso não me parece que saiamos deste marasmo…
José Mário
Somos um povo pessimista, estamos sem fé, são os “brandos costumes” a funcionar.
É expectável que depois de tantas crises, umas atrás das outras, se instale um clima de descrédito e de desconfiança. Para contrariar esta atitude seria necessário ganharmos forças para transformar as adversidades, de que temos grandes responsabilidades, em oportunidades.
Temos falta de líderes, e os que temos não aparecem, precisamos de pessoas em quem se reconheça autoridade e credibilidade para desafiarem o país a mudar, a ter um desígnio nacional. A crispação a que se chegou na sociedade portuguesa, trazida por um combate político às vezes com contornos suicidas, não ajuda à união, a olharmos em conjunto para o futuro.
Não é com “tremendismo” que vamos ultrapassar as dificuldades que temos. O “tremendismo” só serve a mediocridade, para nos enterrarmos ainda mais!
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