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segunda-feira, 9 de março de 2009

Enfrentar a verdade...

Revejo-me plenamente na reflexão ética de António Barreto publicada ontem no Público sobre “O direito à honestidade”, da qual transcrevo esta passagem:
"A ponto de se considerar que uma pessoa honesta “é parva” e “não sabe da poda”. Abundam os lugares-comuns que revelam que a honestidade não é um valor com muita saída. Quem defende a honestidade é considerado “ingénuo”. De alguém que perde tempo a escrever sobre a necessidade da honestidade na vida pública se dirá simplesmente que perde tempo com “sermões”. De um honesto se garante que nunca será rico nem irá muito longe na política. Um comerciante que não ”mete a unha” é palerma. Um corretor de bolsa que não usa informação privilegiada e não manipula os concorrentes é um mau profissional. Um político que, antes das eleições, não esconde as dificuldades, para só as revelar depois de ganhar, é um “tonto” e deveria mudar de profissão. Um empresário que nada oculta aos trabalhadores é um “samaritano” sem “killer instinct”. Um estudante que copia ou plagia só merece condenação se for descoberto. Aliás, se for “apanhado”, a complacência é de rigor."
Com efeito, vive-se hoje o primado do ter, relegando para segundo plano o ser. As pessoas avaliam as outras e são avaliadas pelo que têm e não pelo que são. Vencer na vida é o desejo exacerbado de ter, de ter poder e dinheiro, de enriquecer, consumir, ter sucesso e ganhar “medalhas” e fazendo-o, de preferência, muito depressa como que se o mundo acabasse hoje, utilizando abusivamente aquela máxima “não deixes para amanhã o que podes fazer hoje”.
A honestidade, que deveria ser um valor apreciado, respeitado e preservado, deu lugar à falta dela, refiro-me à desonestidade intelectual, à falta de verdade e de transparência, que vai muito para além do acto de roubar, atitudes que estão hoje muito presentes na vida pública e nos negócios. Atitudes reprováveis que prejudicam o bem comum. O que deveria ser tido como uma transgressão, socialmente sancionada e legalmente penalizada, transformou-se numa norma socialmente “premiada”.
Abunda a ideia de que as pessoas honestas “não vão longe” e, mais ainda, a ideia de que quem fala sobre estas coisas da ética, dos princípios e dos valores gasta o seu tempo para nada e faz figura de parvo, quando não, muitas vezes, essas pessoas são tidas como as piores, umas “fingidas” e “falsas”.
Reescrevo o que disse num texto que recentemente escrevi no 4R “A Ética e a falta dela…”, que o desmoronar do sistema financeiro é causa-efeito de uma inversão do padrão de valores tradicionais na condução dos negócios financeiros, os quais pela sua força e influência nas economias acabaram por contaminar as mentalidades das sociedades modernas.
Estou em crer que, depois da tempestade da crise, iremos por necessidade e razão reinventar um saber viver em que os cidadãos vão sentir a falta do “direito à honestidade” e, portanto, vão exigir que o mesmo seja respeitado.

4 comentários:

Anónimo disse...

Margarida, por mim não esperava pelo fim da crise que a insistência em determinados modelos parece adiar. Consagravacomo fundamental, já, esse direito à honestidade que propõe

Bartolomeu disse...

Em minha opinião, cara Drª Margarida, o resultado da revolução dos cravos, que pretendeu "oferecer" a todos o direito à igualdade e à livre expressão, foi o nivelamento por baixo da cultura popular.
Foram confundidos direitos e liberdades, com abusos e manipulações.
No entanto e no meu ponto de vista, esta crise está a produzir um efeito que me parece positivo. Esta a renovar e a potenciar o conceito de agregação e de construção recuperativa. Na verdade parece-me que a desgraça tema propriedade de tornar as pessoas mais coesas, talvez porque seja ela que efectivamente produz o sentido de igualdade.

Carlos Medina Ribeiro disse...

A quem possa interessar:

António Barreto publica as suas crónicas nos blogues «Jacaradá» e «Sorumbático»:

http://o-jacaranda.blogspot.com/
http://sorumbatico.blogspot.com/

Margarida Corrêa de Aguiar disse...

José Mário
As pessoas andam esquecidas deste direito porque do dever de honestidade também há muita gente que dele não quer falar.
Caro Bartolomeu
Pode ser que a desgraça a sério convença as pessoas que é preciso respeitar o padrão de valores tradicionais.
Caro Carlos Medina Ribeiro
Agradeço as indicações.