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quarta-feira, 14 de agosto de 2013

"Coisas"...


Reconheço que a principal característica de um ser humano é a sua tendência para a espiritualidade. Uma forma de se encontrar, uma forma de saborear o mundo, uma forma de fazer poesia, uma forma de criar, uma forma de amar, uma forma de ajudar, uma forma de compreender, uma forma de justificar o futuro e o passado. Sentir essa força não é sinónimo de religiosidade nem sinónimo da aceitação de um Deus maior ou de deuses menores. É uma enorme responsabilidade senti-la, sobretudo na ausência de um Deus a quem se atribui princípios e dons capazes de explicar o inexplicável. A dialética da religião, seja ela qual for, é muito elaborada, mesmo sofisticada, com argumentos complexos e difíceis de entender, tudo serve para a justificar e para fazer entender a sua existência aos que não aceitam entidades divinas. A dialética da espiritualidade, não, é simples, é fácil de entender, embora por vezes seja um pouco complicada na atuação. Não tenho nada contra os que têm fé e se alimentam dela. Eu também me alimento, mas de espiritualidade humana, mais comezinha, mais terrena, mais compreensível. O comportamento dos que têm fé seduz-me, mas não os invejo. Olho-os com curiosidade e com respeito. É o meu dever, aceitar as diferenças. Relativizo muito dos seus comportamentos, equiparando-os a uma forma de poesia, nada mais do que isso.
Escrevinho estes pensamentos devido a várias circunstâncias que este período normalmente me desperta. Mas hoje, o motivo é um pouco diferente. Li a notícia segundo a qual uma pequena criança de três meses e meio, que sofre de um grave problema cardíaco, foi sujeita à implantação de um coração artificial, encontrando-se à espera de poder receber um transplante. Situação complexa e muito delicada. Um esforço enorme de homens e mulheres que querem salvar um semelhante, talvez a forma mais pura de espiritualidade humana. Neste caso uma pequenina que merece viver. O conhecimento, o empenho, a dedicação e o fervor da ajuda merecem ser realçados. Neste momento, de festas, de alegrias, de calor, de descanso, há quem sofra, há quem corra risco de vida, há quem se agarre a outros seres humanos na esperança de poderem partilhar as suas vidas e os seus desejos. São tantos os que desejam amar e não conseguem. São tantos os que querem viver e vão morrer. São tantos os que lutam pelo seu semelhante. No fundo, são os representantes máximos da beleza e da espiritualidade humanas, fazendo e dizendo coisas que só os humanos, esta estranha espécie que ainda anda por aqui, conseguem dizer uns aos outros. Compreendo os humanos, na grandeza ou na miséria, e é com eles que me vou encontrando e descobrindo. Para mim é suficiente.

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