Bem longe de Guimarães, acompanhei alguns ecos do que por lá se foi passando durante este fim-de-semana no que ao Congresso do PSD diz respeito.
Pareceram-me oportunas e de um modo geral merecedoras de aprovação as duas intervenções, inicial e final, de M F Leite (MFL).
Na final, MFL endereçou uma forte crítica ao “Programão de Obras Públicas” que tem vindo a ser anunciado pelo Governo, pondo em causa a sua prioridade política e questionando mesmo a existência de recursos financeiros para o realizar.
Como eu aqui dizia há poucos dias, este “Programão” constitui mais uma prova – talvez a prova final, se esta for avante dificilmente iremos ter outra - da iliteracia dos nossos “responsáveis” políticos em matéria de regras de convivência numa zona monetária com as características da zona Euro.
Na situação de exaustão financeira em que o País se encontra, (i) com o Estado Central, as Autarquias, as Famílias e as Empresas em dependência financeira já aflitiva mas em agravamento acentuado nos tempos mais próximos, (ii) a economia estagnada, (iii) uma política monetária própria de um ciclo expansionista, (iv) uma moeda muito forte, totalmente desajustada para uma economia com graves problemas estruturais nos quais sobressai a fraca competitividade externa dos bens (sobretudo) e também dos serviços produzidos internamente – um Programão de Obras Públicas é mesmo a última coisa de que nós precisamos.
Por outras palavras, esse Programão pode ser a coisa de que nós precisamos para acabar de vez com quaisquer perspectivas – actualmente já muito ténues, tenho de admitir – de algum dia a economia portuguesa vir a ter um comportamento dentro da zona Euro que não seja o empobrecimento gradual e irreversível.
Assim sendo, o Programão acabará lamentavelmente por suscitar a questão de saber se a economia portuguesa tem condições de se manter na zona Euro ou se não será preferível uma terapia de choque, do tipo da que sofreu a Argentina há cerca de 10 anos, com custos enormes durante dois ou três anos mas que acabou por produzir resultados…
Parece-me pois que, sem prejuízo da correcção e da justeza do seu discurso político e das boas intenções de que se encontra possuída, MFL enfrenta um problema muito sério caso venha a ter responsabilidades de Governo, como parece cada vez mais provável: onde estão os recursos para dar resposta às prioridades políticas que elege?
Com o Programão a todo o vapor, o País hipotecado até “à ponta dos cabelos”, sufocado debaixo de um défice de rendimentos nessa altura na casa de 7 a 8% do PIB – a “ajudar” um défice GLOBAL de qq coisa como 15% do PIB sem fundos estruturais - o que restará a MFL fazer?
Numa situação dessas nem um Bloco Central – se é que vale a pena reedita-lo - terá soluções para um País frustrado, brutalmente endividado, desencontrado com a sua história, incapaz de acreditar no futuro.
O “Day After” vai ser mesmo o grande problema de MFL…
E tudo a coincidir com os 100 anos da República – as comemorações prometem!
7 comentários:
Desta, concordamos a 99,9%. Só não concordo que isto se deva iliteracia dos responsáveis, mas isso é um detalhe.
Para que passe a frustração, o desencontro com a história e a descrença no futuro, aconselha-se a leitura do artigo abaixo tantas vezes, quantas as necessárias:
http://dn.sapo.pt/2008/06/21/centrais/chumbar_e_ve_rgonha_leste.html
de preferência "ler" nas entrelinhas ...
Bom Dia Dr. Tavares Moreira !
:-)
Bom dia Dr. Tavares Moreira,
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"de algum dia a economia portuguesa vir a ter um comportamento dentro da zona Euro que não seja o empobrecimento gradual e irreversível."
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O que me mantém num estado de interrogação são alguns factos da micro-economia:
* 80% da produção de mobiliário é para exportação (e não são móveis que competem com os chineses e tailandeses, já estão a um nível superior);
* 90% da produção de calçado é para exportação (e não é calçado que compete a 18€ o par, com o calçado chinês a 3€ o par);
* as exportações têxteis voltaram a aumentar com produtos de maior valor acrescentado.
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Há um número de empresas pequenas e escondidas, longe dos palcos, que estão a dar a volta. No entanto, o lastro da sociedade que gira em torno dos bens não-transacionáveis é impressionante, e enquanto não se lançarem fora esses "sacos de areia" o balão nunca conseguirá subir muito.
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Corre-se mesmo o risco de sufocar esses campeões escondidos.
Caro Tonibler,
Ter a sua concordância a 99,9% é uma honra Tonibler, quase diria uma sorte grande!
O único ponto de discordância, a iliteracia, só vale 0,1%? Quer então dizer que a explicação pode ser outra? Porventura menos aceitável do que iliteracia?
Caro CCz,
A sua observação é inteiramente pertinente, as empresas, muitas PME's, que conseguem sobreviver no mundo concorrencial dos negócios, são obrigadas a suportar toda uma série de sobrecustos resultantes da ineficiência dos sectores protegidos e do peso asfixiante do Sector Público Administrativo e Empresarial...do que seriam capazes se estes fardos fossem aliviados...
Mas a tendência, pleo monos nos anos mais próximos, é para o peso destes fardos se vir a agravar e não o contrário, infelizmente!
Porventura...
Caro Tavares Moreira,
Retiro do seu texto o periodo que me parece sintetizar bem os seus avisos e a sua proposta de alternativa:
"Assim sendo, o Programão acabará lamentavelmente por suscitar a questão de saber se a economia portuguesa tem condições de se manter na zona Euro ou se não será preferível uma terapia de choque, do tipo da que sofreu a Argentina há cerca de 10 anos, com custos enormes durante dois ou três anos mas que acabou por produzir resultados…"
E fico confuso.
Nao fico confuso quanto ao "programao", se o "programao" complica o que ja esta muito complicado, esquecamos o programao.
O que me confunde e a argentinizacao.
Nao e a primeira vez que ouco falar na saida argentina. E, sinceramente, nao sei bem por onde passa.
Passa pela saida do euro, diz-me o meu Amigo. O euro e a nossa desgraca, segundo percebo. Saimos do euro, voltamos ao escudo, e no momento seguinte quem tinha 100 passa a ter 50, salvo se tiver fortuna abrigada nas Caraibas ou por la perto ou investida em bens de raiz.
Os salarios cairao para quanto? Metade chega?
Como a economia portuguesa funciona a duas velocidades, a primeira e a sexta, a sexta vera os seus lucros aumentados a curto prazo mas sustentar-se-a por quanto tempo a primeira, aquela que compete com a China e arredores?
Por tudo isto, e mais nao acrescento para nao abusar do espaco, agradeco-lhe muito o favor de esclarecer este seu confundido Amigo.
Caro Rui Fonseca,
Admiro e invejo o optimismo que perpassa da sua frase "Se o Programão complica o que já está complicado, esqueçamos o Programão...".
Quem vai esquecer o Programão? O ilustre Rui Fonseca e este seu pouco ilustre amigo?
Acha que isso adianta alguma coisa? Acha que alguém nos ouve no adiantado estado de desvario que por aí grassa?
Quando se fala em terapia de choque, que pens o meu Amigo, que se trata de suspender a merenda dos meninos da escola?
Fique sabendo que nunca serei eu a advogar a saída do EURO - quanto mais não seja por respeito pelo muito que trabalhei, devotadamente e sem qq interesse pessoal, para a criação de condições que permitissem a nossa entrada em condições minimamente aceitaveis.
Mas fique tb sabendo que, não tarda muito, não faltarão vozes a clamar por isso, advogando uma nova doença da economia portuguesa a que me referirei em próximo POST - a claustrofobia do Euro.
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