Na semana passada, o Presidente da República reconduziu, por proposta do Governo, o Presidente do Tribunal de Contas, Guilherme Oliveira Martins para um novo mandato de três anos.
Esteve bem o Governo ao propor; esteve bem o Presidente da República ao reconduzir. E fica Portugal a ganhar com a renovação de funções de Oliveira Martins.
Sou insuspeito para abordar o tema: Oliveira Martins é próximo de um partido diferente (o PS) daquele a que pertenço (o PSD) e o facto de ter passado directamente do Grupo Parlamentar do PS (onde era Vice-Presidente) para a Presidência do Tribunal de Contas não foi propriamente tranquilizante, se é que me faço entender…
Pela minha parte, transmiti, nessa altura, a Guilherme Oliveira Martins, de forma privada, as felicitações pelas funções que iria desempenhar, devido às características de independência, honestidade e isenção que, já nessa altura, via na sua pessoa. Mas, também nessa ocasião, na minha qualidade de Vice-Presidente do Grupo Parlamentar do PSD, critiquei a forma como entrou em funções no Tribunal de Contas, com uma divulgação que foi entendida como pouco adequada da Conta Geral do Estado de 2004, quer em termos de conteúdo (com menções a operações que não tinham sido propriamente pacíficas, mas que tinham sido realizadas em 2003, como a titularização de créditos fiscais e da Segurança Social, e também a integração das responsabilidades em pensões dos CTT), quer de forma, com a divulgação desse relatório a ter lugar numa sala de conferências em plena Assembleia da República, uma sala reservada a Deputados e não a outras personalidades… Ora, tendo sido Oliveira Martins Deputado do Partido Socialista até ter entrado no Tribunal de Contas, percebe-se que a gestão daquele primeiro momento mediático não terá sido a mais cuidada.
Entretanto, o tempo foi passando – e, como sempre acontece, isso permite-nos encarar as coisas de outra forma, e traz a verdade ao de cima.
Assim, não me caem os parentes na lama se admitir que, vista hoje, à distância, a reacção do PSD foi manifestamente exagerada…
… e que “aquela” entrada de Oliveira Martins no Tribunal de Contas se tratou, mesmo, de um mero – e pequeníssimo – acidente de percurso. Daí para cá, creio não estar a cometer nenhum exagero, por um lado, e a resumir tudo o que queria referir, por outro, se afirmar que toda a independência e seriedade que na altura achei que iria pautar a sua actuação no Tribunal de Contas têm sido amplamente confirmadas. Isto, claro, para já não falar na competência…
E como chegámos, agora, à justíssima recondução de Guilherme Oliveira Martins – toma posse amanhã, 26 de Novembro –, pareceu-me da mais elementar justiça publicar este post. E desejar, apenas, que o Presidente do Tribunal de Contas continue a desempenhar as suas funções como aconteceu até agora!...
11 comentários:
Quantas mais pessoas o PSD achava boas para o cargo e criticou-as e quantas mais pessoas o PSD elogiou e eram más para os cargos?
Justa recondução e justo reconhecimento pela isenção de Guilherme de Oliveira Martins!
Seria também, seguramente, um excelente Presidente da República.
Em 13 de Setembro de 2005, em comentário a um post do Ferreira de Almeida louvando a nomeação do Dr. Oliveira Martins para o Tribunal de Contas, escrevi:
"Conheço o Dr. Oliveira Martins.
É um homem culto e sério.
Não duvido que exercerá com toda a dignidade as suas funções.
Mas o cargo é também a sua circunstância.
E, nas actuais circunstâncias de nomeações incompreensíveis, Oliveira Martins corre o risco de não parecer sério e de não ser levado a sério..."
Felizmente, Oliveira Martins ultrapassou esse risco.
É levado a sério, parece e, acima de tudo, é sério, como sempre foi.
Há nomeações que nos dão alguma paz de espírito.
"Esteve bem o Governo ao propor; esteve bem o Presidente da República ao reconduzir. E fica Portugal a ganhar com a renovação de funções de Oliveira Martins":
subscrevo totalmente.
Recordo o que escrevi há 4 anos no post a que se refere Pinho Cardão sobre a polémica da nomeação de Oliveira Martins para presidente do Tribunal de Contas, apontamento que deu lugar, aliás, a um breve mas interessante debate sobre a independência dos tribunais:
"Sobre a indigitação de Guilherme d´Oliveira Martins para a presidência do Tribunal de Contas
Ouço os ruidosos protestos da oposição pela anunciada indigitação do Dr. Guilherme d´Oliveira Martins para presidente do Tribunal de Contas. Parecem-me injustos para o indigitado. E alguns dos argumentos que se avançam parecem-me absolutamente tontos.
Não aceito que digam sem mais que alguém não é isento para o exercício de uma função desta natureza, pelo facto de ser alinhado com determinado partido e ter exercido cargos de nomeação política, designadamente governamentais, pela mão desse partido. Começa a assumir foros de doença social este anátema permanente que se lança sobre a verticalidade das pessoas, quando não sobre a sua honorabilidade, só pelo facto de militarem ou colaborarem com partidos políticos. Parece que quem é sério e capaz deixa de o ser no exacto nomento em que, no pleno uso da sua liberdade, resolve aderir a um partido ou com ele colaborar mesmo que mantenha formalmente a sua independência, com julgo ser o caso de Oliveira Martins...
Não deixa de ser, aliás, patológico que sejam os próprios partidos políticos a fazer esta crítica, que equivale a afirmar que nas suas fileiras não existem afinal mulheres e homens capazes de exercer, com imparcialidade e seriedade, funções públicas que exijam um especial respeito por estes valores.
Conheço há muitos anos o Dr. Oliveira Martins. Se há coisa que lhe reconheço, para além de uma inteligência e cultura fora do que é comum, é uma honestidade e rectidão comprovadas, um enorme sentido de Estado e uma sólida formação, qualidades necessárias ao desempenho daquelas funções no respeito pelos princípios que o acusam de não ter condições para respeitar.
Acresce que o Dr. Guilherme d´Oliveira Martins é um estudioso e um conhecedor, como poucos, das finanças públicas portuguesas, o que particularmente o habilita para presidir à mais alta instância do controlo financeiro do Estado e das demais entidades públicas.
Agora o que me parece caricato é que se venha dizer que para o tribunal não deve ser nomeado um político mas um juiz!
Nem o combate político explica ou justifica que se ignore o carácter específico deste concreto tribunal, que, claro está, não exclui juizes, mas não obriga nem tão pouco aconselha que a sua presidência seja exercida por magistrado.
Admira-me que esta demagogia fácil - que descredibiliza sobretudo quem a faz, não quem visa descredibilizar - hipnotize ao ponto de não fazer perceber a quem dela faz uso, que para este cargo fundamental para o funcionamento saudável do Estado na medida em que o Tribunal de Contas não julga só da legalidade mas igualmente da economicidade, da eficácia e da eficiência da despesa pública, é mil vezes preferível um político honesto, capaz e competente, do que um juiz cinzento e impreparado.
Finalmente espanta-me esta súbita preocupação veiculada pelos partidos da oposição. São eles que há muitos anos detêm o poder de afastar definitivamente estas suspeições, fazendo com que a lei confira exclusivamente à Assembleia da República, através de uma maioria qualificada, a nomeação do Presidente do Tribunal de Contas.
Vale a pena perguntar porque nunca terão feito uso desse poder?"
Já agora, o que escrevi não significa que concorde com alguns aspectos do modelo de fiscalização que tem o Tribunal de Contas como peça central, nem com muitas das decisões onde tenho constatado uma tendência para ultrapassar funções que constitucionamente pertencem a outros órgãos. Mas essas são contas de outros rosários...
É justo reconhecer que de vez em quando as escolhas saem certas e os titulares do cargos públicos desempenham-nos como deve ser.
Já agora, não o tirem de lá, que está a fazer um óptimo papel.
Caro Ferreira de Almeida:
É também verdade o que diz no seu último comentário. Para além disso, muitos Relatórios do TC evidenciam um formalismo técnico exagerado, sem qualquer pequeno esforço de interpretar de forma adequada situações que derivam muitas vezes de legislação confusa ou até conflituante. Como em todos os Tribunais, a experiência de vida é importante para analisar os factos.
O commonsense coloca o dedo na ferida ao dizer que "de vez em quando as escolhas saem certas".
É assim que temos um regime que tanto permite a nomeação de um Oliveira Martins, que seria boa, como a de um José Penedos, que seria má, o que significa que algo estará mal.
Seria pois de esperar que os deputados da Nação corrigissem essa falha do sistema e criassem um esquema de escrutínio prévio sobre a idoneidade dos propostos titulares, à semelhança do que ocorre noutros sistemas políticos.
Cordialmente
Caro insatisfeito, desculpe o reparo, mas acho que não devemos julgar as pessoas antes de tempo, não é pelo facto de as televisões exporem até à náusea a cara de quem não tem forma de se lhes esquivar que podemos passar já à condenação.Sobretudo se nada, até agora,legitima essa antecipação.
Cara Suzana Toscano
Pelo seu reparo deduzo que não me terei feito entender devidamente.
Não "julguei" ninguém. Tentei apenas ilustrar, e de passagem, uma parte daquilo que diz, e muito bem, sobre os efeitos de "as televisões exporem até à náusea" certos casos, suscitando um julgamento popular indevido - "seria" disse eu.
Sendo como sou um apreciador do que os distintos autores do IV R têm a amabilidade de compartilhar com os seus leitores, incluindo a elegância de atitude demonstrada neste post, apenas pretendia dar uma achega - sugestão, de natureza política, para que se evitasse doravante uma situação que se me afigura um erro no nosso actual sistema constitucional : o de bastar uma decisão governamental para se nomear alguém para um cargo importante sem haver um escrutínio prévio por parte, por exemplo, de uma comissão da AR, com poderes para aceitar, ou não, a pessoa indigitada, e assim se assegurar a transparência e a isenção na escolha de pessoas reputadamente reconhecidas como "certas".
Dito de outro modo, MF congratula-se com a recondução de Oliveira Martins (e eu também aliás), mas a meu ver, e aproveitando a menção do accionamento desse mecanismo da recondução, seria de se considerar uma mudança constitucional no sentido referido.
Cordialmente
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