Não é a primeira vez, nem será, por certo, a última. Colocar as expectativas demasiado elevadas, fazendo da vitória uma tábua de salvação não pode dar bom resultado. A ambição é necessária, mas a sua gestão sobre quem lhe pode dar rosto não é indiferente. Há toda uma questão de imagem, inclusive do país, que não escapa ao compromisso e entusiasmo. Talvez seja demasiada a carga que é colocada num atleta ou numa equipa, em particular quando a equipa é reduzida e os bons resultados estão centrados em poucos atletas. É o nosso caso. O stress provocado pela responsabilidade pode ter um efeito contraproducente. Não sabemos o que correu mal. Questiono-me se os nossos atletas para além da preparação física e técnica recebem também preparação psicológica para disporem de mecanismos de defesa que lhes permitam lidar equilibradamente com as dificuldades que a alta competição coloca. Certo é que Telma Monteiro, uma das melhores judocas do mundo, foi eliminada no primeiro combate. Em Pequim, não conseguiu também chegar ao pódio das medalhas. Fez naturalmente o seu melhor, esforçou-se, não correu bem, desiludiu, mas não ganhamos nada em exagerar…
8 comentários:
Definitivamente má gestão das expetativas. Ser a lança-em-Áfrina não ajuda ninguém...
África
Não há preparação psicológica para alguém ser uma aberração, porque existir um atleta português com possibilidade de ganhar medalhas é uma aberração e uma enorme injustiça para todos aqueles países onde a prática desportiva é parte integrante da educação e não meter bandeiras na janela. Devíamos, em primeiro, lamentar a enorme injustiça que foi feita com a educação holandesa(?) ou dinamarquesa(?) que perdeu um lugar nos JO para ir uma portuguesa. Isso é que deve ser uma enorme desilusão...
Caro Tonibler, no entanto já temos ganho medalhas, mesmo sendo uma aberração, mas concordo consigo, quando se olham aqueles desfiles todos logo na abertura é de desanimar qualquer um. Mas parabéns à telme Monteiro e aos atletas portugueses que lá nos representam, ganhar medalhas não é tudo, embora fosse uma alegria para todos e certamente um grande prémio para eles. A Margarida tem razão, temos esta mania de achar que ou ganhamosuma medalha de ouro ou não prestamos para nada, se calhar é isso mesmo que nos torna umas aberrações.
Pessoalmente, vejo o desempenho em prova de uma forma diferente.
E tenho 3 exemplos pessoais que ilustram aquilo que digo.
Pratiquei várias modalidades desportivas, até casar e, cheguei a competir em algumas. Pratiquei atletismo (fundo e meio-fundo) no Belenenses, treinado pelo professor Rui Mingas, como já referi. Parte dos treinos eram efectuados nos trilhos da mata de Monsanto, onde variadíssimas vezes me juntava ao grupo onde já corriam o Carlos Lopes, o Fernando Mamede (o mais velho de todos) e o Aniceto Simões. Destes 3 atletas consagrados, Carlos lopes era de todos o que possuia uma força de vontade e uma perseverança que suplantava todos os outros, por seu lado, Aniceto Simões, dono de uma compleição física muito mais talhada para a prática da modalidade, possuía uma força anímica muito mais frágil e que o fazia baixar de forma a meio de uma prova, coisa que fazia desesperar o Professor Moniz Pereira. Pratiquei também vela e remo modalidades em que competi na classe de snipe e na de yole de 4 com timoneiro. Na primeira, um dia, numa regata ao largo de Sesimbra, em que competiam tripulações de vários clubes do país, na final, devido à força do vento,à altura das vagas e ao cansaço acumulado, deixámos o barco virar-se. O meu proa quis imediatamente desistir, eu não. Berrei-lhe que tinhamos de continuar, apesar de nos acharmos esgotasdos, voltamos a colocar o barco na posição e retomámos a corrida, como ainda tinha bastante água dentro, poucos metros depois, voltou-se novamente. Aí o meu proa declarou que já não voltava à competição. Nessa altura, dei a volta ao barco lancei-lhe uma mão ao pescoço e ameacei-o que se não voltasse à competição, o afogava. O rapaz amedrontou-se e contrariado lá colaborou a colocar de novo o barco direito e com muito jeitinho lá retomámos a prova até que a água saísse por completo. Terminámos em segundo lugar, porque levávamos um bom avanço dos restantes. No remo, também numa regata, no rio tejo, o sota-proa que ía à minha frente, partiu o carrinho. Íamos em luta pelo primeiro lugar. Nesse momento, o remador parou o remo e desistiu. Depois de uma rápida discussão, decidimos, eu tirei os pés dos apoios e segurei o carrinho dele, fixando-o ao máximo, continuando assim a prova e conseguindo chegar em primeiro com um ou dois palmos de vantagem.
Em competição aquilo que determina os vencedores é a força de vontade de ganhar, de ultrapassar as capacidades que sabemos possuir.
Esta é a minha opinião.
Não, cara Suzana, "nós" não ganhámos medalha nenhuma. Quem ganhou foram eles, nós não fizemos nada para isso tirando pagar-lhes umas camisolas e a viagem. Não vamos agora tomar para nós uma honra que só nos cabe por razões geográficas. Porque nós não lhes dedicamos sequer 5 minutos de zapping para que possam ir buscar patrocínios, temos uma televisão pública que só passa as modalidades deles se a respectiva federação pagar (porque a RTP2 só faz transmissões de futsal. Serviço público...), porque as altas figuras do estado só aparecem quando a qualificação está feita para ficar nas fotografias, etc. Por isso eu gosto de dizer que a única medalha que ganhámos foi uma de bronze num mundial de futebol quando ainda jogava o Eusébio. Essa foi merecida.
Eu não tiro nenhum dos méritos aos que lá estão e àqueles que não estão, porque dos meus companheiros da esgrima haviam dois pares deles que se esforçaram tanto como estes e, por força das circunstâncias, não conseguiram entrar. Mas muitas das nossas expectativas derivam exactamente do facto deste ser o único momento em que ligamos a judo (ou esgrima, ou vela, ou hipismo, ou...). Por exemplo, na esgrima que conheço melhor, dos 30 que estão em competição, 20-25 são candidatos à medalha de ouro. Se nós dedicássemos 10 minutos da nossa vida por ano ao judo, se calhar sabíamos (não sei se é o caso) que dos 30 à competição havia 10 candidatos. E com 10 candidatos, a expectativa está mais relativizada, certo?
Tudo isto para dizer que não são eles que precisam de preparação psicológica, nós é que precisamos de preparação desportiva. E muita, porque a nossa educação depende disso.
Cara Margarida,
Em boa verdade, passa-se nos JO o mesmo que já se passou no Europeu de futebol: embandeirar em arco, deitar foguetes antes do tempo...
Quando vamos competir criamos - ou melhor criam esses inexcedíveis orgãos de comunicação social, que existem fundamentalmente para vender ilusões ou a banha-da-cobra - a ficção de que na competição só estamos nós, do outro lado é o vazio...
E com isso vem a ideia de que podemos ganhar tudo, temos a vitória "no papo", quando no final é sempre a mesma coisa, não ganhamos quase nada.
Caro Nelson Mendes
Tudo indica que sim, neste caso como em outros.
Caro Tonibler
Já temos ganho medalhas, não me parece uma aberração. Muitos dos nossos atletas fazem grandes sacrifícios para poderem chegar à alta competição. Penso que não estamos organizados para sermos um país com desporto de alta competição. Com tantos pavilhões desportivos que construímos por esse país fora bem que podíamos tirar deles maior proveito.
Tem muita razão, Caro Tonibler, quando diz que precisamos de preparação desportiva, de levarmos a competição a sério, como acontece (ou não) em muitas outras coisas.
É isso Suzana, se não ganhamos ficamos deprimidos, em especial os atletas e quem está próximo deles. Li que a Telma Monteiro chorou convulsivamente durante meia hora, faz pena, mas a maioria dos portugueses já se esqueceram, tenho impressão que já não acreditam muito.
Caro Bartolomeu
Não o sabia um verdadeiro desportista, combativo, com vontade ganhadora e vencedor. A vontade é fundamental, mas creio que não é a única condição. As circunstâncias várias têm muita influência. Temos visto que colocamos nos ombros dos nossos atletas uma pressão terrível.
Dr. Tavares Moreira
Lembra muito bem a comunicação social, está sempre presente a vender sonhos e ilusões e de seguida a explorar o desastre.
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