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sexta-feira, 22 de agosto de 2008

Insegurança - realidade ou criação mediática?

Os telejornais de ontem dividiram-se entre a boa nova da medalha de ouro conquistada para Portugal por Nelson Évora, e repetidos casos de criminalidade violenta e organizada, numa onda que dá a sensação não ter precedentes.
O repetido zapping encontrou sempre a notícia de mais situações de carjacking, assaltos á mão armada a estações de serviço, a bancos e ourivesarias, tiros disparados sem qualquer hesitação em direcção a quem pretendeu defender o que era seu, apreensões de armas ilegais, agressões a agentes da autoridade, detenções, perseguições e meliantes a monte.
Jornais de hoje dão conta que nos últimos tempos, já depois da alteração da lei que prometia tornar mais dificil a aquisição e detenção de armas de fogo, aumentou substancialmente o número de cidadãos portugueses que sentiram necessidade de comprar e licenciar uma arma de defesa pessoal.
Consequência de um aumento real da criminalidade organizada e mais violenta? Ou mera sensação de insegurança resultante, designadamente, da exposição e exploração mediáticas dos casos que vão fazendo o dia-a-dia das notícias?
A edição do ´Expresso´ de amanhã analisa o fenómeno olhando para as estatísticas. E chega á conclusão que não existe hoje mais criminalidade violenta do que a registada há cinco anos. O que se passará é, assim, segundo as conclusões a que chega o ´Expresso´, a criação de um ambiente em que as pessoas se sentem mais inseguras.
Mesmo que se admita que as estatísticas criminais permitem esta ilacção, a verdade é que os portugueses não podem ficar descansados com ela. A ser assim, significa que os factores que nos últimos anos têm posto em causa a brandura dos costumes nacionais e o tradicional clima de paz e segurança (de que se alimentava o melhor turismo, por exemplo) não foram erradicados, antes se mantêm mesmo que não se tenham agravado. Significa, no fundo, que os atentados à liberdade, à integridade e até à vida das pessoas, como aos bens, não infletiram em número e não se alteraram em gravidade.
Seria espantoso que o resultado fosse outro.
Com efeito, nos últimos tempos é notório que o Estado enfraqueceu. O Estado de Direito é fraco e esta democracia encolhe-se perante a violência que, em situações extremas, reza a História que a põe em causa. Fraco, seja pela perda constante da credibilidade e da confiança públicas nos aparelhos de justiça e de segurança. Seja pela vulnerabilidade a que a abertura das fronteiras no espaço da UE expôs o País, ainda recentemente anotada, de modo implícito, pelo General Leonel de Carvalho a propósito de um últimos casos de crimes sofisticados.
Ora, o primeiro sintoma de um Estado fraco é esta sensação de insegurança, extraia-se o que se extrair das estatísticas, que leva cada vez mais pessoas de bem a adquirir armas de fogo para se protegerem. Sintoma agravado por uma onda politicamente correcta segundo os melhores canones da doutrina bloquista: (i) pelo crime é sempre a sociedade a responsável, nunca o criminoso (sobretudo se pertencente a uma minoria); (ii) qualquer medida de reforço do aparelho repressivo, por via normativa ou por reforço de meios materiais das forças encarregadas de manter a ordem e combater o crime, é de comum entendida como o trilhar a passos largos do tenebroso caminho do securitarismo; (iii) a falta de apoio e estímulo ás polícias sempre suspeitas (e não raras vezes acusadas) de propenderem para a desproporção na utilização dos meios, atitude que chega ao ponto de se condenar nos agentes da lei o que sociológos, psicologos, juristas, analistas mais variados e até políticos imediatamente procuram compreender e até justificar quando se trata dos mesmos meios empregues pelos criminosos.

Não faltará quem pense que o Estado se tornou cobarde na luta contra a criminalidade violenta. E que as máquinas da justiça e da segurança parecem mobilizar-se mais com os apitos dourados e outras questões do género, do que com estes fenómenos que fazem com que um País, outrora tranquilo, tenha receio de sair à noite ou coloca em sobressalto os pais ou os conjuges sempre que os seus se atrasam no regresso a casa. Amanhã ler-se-à no semanário que esse receio não é hoje mais justificado do que o era nos últimos anos. Pode ser que não seja. Mas é isso que nos faz dormir mais descansados?

4 comentários:

Margarida Corrêa de Aguiar disse...

José Mário
Em matéria de segurança não basta debitar estatísticas e com elas convencer os cidadãos que as coisas estão bem e não pioraram, que a situação está estacionária e controlada, que somos melhores que os piores, que não há razões para preocupação.
A opinião pública quer ver no dia a dia as estatísticas. E ultimamente isso não está a acontecer. Os cidadãos não sentem as estatísticas. Sentem o que ouvem e o que vêem, levam a sério os jornais e as televisões e levam ainda mais a sério os casos que vão surgindo de pessoas inocentes que de um minuto para o outro são mortas porque há crime.
O receio de "sair à rua" vai-se instalando, mesmo que as estatísticas digam que podemos fazê-lo porque só de vez em quando é que um cidadão leva um tiro!
A maior visibilidade dada ao crime, através da comunicação social, em directos ou quase directos, é uma inevitabilidade. Contrariar com estatísticas esta visibilidade não é um caminho para recuperar a confiança e a segurança.

Bartolomeu disse...

Neste caso, caro Dr. JMFA, quem estará desapontado serão todos aqueles que nos últimos 5 anos não foram vítimas de qualquer acto de roubo, vandalismo ou agressão, pois não integram as estatísticas do Expresso.
Tzzz, que desaire!!!
Como não somos patetas (alegres sim, patetas não) percebemos a intenção do jornal ao publicar estas estatísticas e apresenta-las aos leitores com um efeito alucinogénio. É o ganha-pãozinho deles. Um dia publicam estatísticas foscas, depois aguardam que os restantes jornais publiquem as reportagens dos assaltos e eles então arranjam mais uma estatística mirabolante e assim vão mantendo o barco a flutuar.
Se conseguirmos imaginar o mundo sem assaltos e sem crimes de outra espécie, conseguimos tambem imaginar a aridez que se criaria nas páginas dos diários e semanários. Portanto, convem manter a máquina oleada, ou como diria um pescador à linha, é necessário ir engodando, para manter o peixe iludido, depois... tungas, o bicho morde a isca e é só puxa-lo... dando voltas ao carreto.

Jorge Oliveira disse...

Não existe hoje mais criminalidade violenta do que a registada há cinco anos …!?
O Expresso de vez em quando descobre umas coisas.
Por sinal, ultimamente umas coisas que ajudam o executivo de Sócrates.

Adriano Volframista disse...

Caro Dr JMFA

Excelente post, mas algumas precisões que me parecem importantes.
a) É necessário esperar pelas estatísticas do ano, para saber se a criminalidade aumentou. Se os números globais, forem favoráveis, como o têm sido nos últimos anos, o governo vai usar como arma de arremesso contra a oposição. Aparentemente existe um aumento de alguns tipos de criminalidade, o que se se confirmar são preocupantes.
b) Mais do que a cobardia do estado, parece-me (e se estiver correcto, é muito preocupante) que estamos a assistir a, por um lado, uma apatia (voluntária ou não), de quem tem por missão manter a segurança da sociedade e, por outro a uma internacionalização do crime- fenómeno novo em Portugal, mas não em outros países, como a Bélgica, por exemplo.
c) Dito isto duas notas finais:
1. O facto do PSD ( com a actual direcção) pedir a cabeça do ministro, mais do que evidenciar um desnorte, como pretende a narrativa oficial, é um alerta para os reais problemas que existem na área da segurança deste país.
2. O facto descrito em 1 só tem adquire maior importância, quando o responsável político governamental vem "confessar" publicamente que podemos estar a assistir a um aumento da criminalidade.

Cumprimentos
João