A firmeza com que o Ocidente procura manifestar a sua oposição ao reconhecimento pela Rússia da independência da Ossétia e da Abcásia está obviamente abalada na sua credibilidade. Carecendo de credibilidade, não tem efectividade. É a efectividade que domina nas relações entre Estados.
No início do ano as principais potencias europeias e os EUA rejubilaram com a declaração unilateral da independência do Kosovo, desprezando a aquisição de séculos de diplomacia que ensina que nas relações internacionais o gesto mais delicado é justamente o reconhecimento de novas soberanias, sobretudo - como neste caso - quando tal gesto é susceptível de alterar equilíbrios regionais.
Na Europa, poucos líderes revelaram a prudência e a sabedoria que o caso justificava. Um deles contrariou o clima de excitação que se gerou com a ideia do nascimento de mais um Estado e com as promessas de fornecer a incubadora, tal era a fragilidade do nascente, ao dizer que «toda a declaração unilateral de independência gera grande preocupação. Devemos continuar a analisar a evolução da situação e, em devido tempo, envolvendo todos os órgãos de soberania, tomar uma decisão». Avisou que o seu País não tinha de se precipitar no reconhecimento de um Estado numa região onde a autonomização plena daquele território era factor de agravamento de uma estabilidade precária.
Foi em 22 de Fevereiro de 2008, o líder chama-se Cavaco Silva e é Presidente de uma das repúblicas com menos influência na União Europeia...
3 comentários:
Muito oportuna esta citação. Nem sempre os acontecimentos se sucedem a uma rapidez tão grande que permitam reconhecer o abismo entre a precipitação e os efeitos de curto prazo e a capacidade de parar para pensar nas consequências da decisão.
Estou como a Suzana: muito oportuno texto, caro Ferreira de Almeida.
Seria difícil dizer tanto em tão poucas palavras. Há dias, sobre o mesmo assunto, escrevi:
«Ossétia e Abcásia
Perguntava eu há dias qual a diferença entre a situação do Kosovo, independentado à força contra a vontade do país em cujo território se integrava, e a Ossétia do Sul, integrado juridicamente num país que não tem qualquer controlo sobre o seu território ou a sua população (quando tentou à força retomar o controlo, deu no que deu).
A mesma dúvida assaltou o espírito do presidente da Rússia, e vai daí resolveu fazer o mesmo que a OTAN tinha feito no Kosovo.
Assim se confirma que o precedente do reconhecimento da independência do Kosovo foi perigoso e irresponsável.
Como Santos Pereira afirmou há pouco na SIC-Notícias, a escalada de violência verbal e a impossibilidade de qualquer das partes em confronto, Rússia por um lado e Estados Unidos acompanhados pela OTAN e por muitos países ocidentais, voltar atrás sem perderem a face leva a temer que se possa passar da violência verbal para outros tipos de violência.
Como pano de fundo, a dependência energética da Europa, principalmente do centro e Leste, da Rússia vem complicar o problema.
Fala-se no regresso da guerra fria. Esperemos que se mantenha o mais fria possível.»
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