O Ministro de Estado, das Finanças e da Economia defende uma reforma do Banco de Portugal (BdeP) que reforce os poderes de supervisão sobre o sistema financeiro. Faz bem em defendê-lo, e faz muito bem ao resistir à tentação de, perante as críticas que foram dirigidas à instituição a propósito do BPN e não só, julgar que as coisas deveriam ficar como estão, ou mesmo retirar ao BdeP parte das competências no domínio da supervisão, perante a desconfiança na instituição que nos últimos tempos se acentuou na opinião pública.
O que se percebe do inquérito parlamentar à nacionalização do BPN, tal como do que se conhece dos casos do BCP e BPP, é que alguns dos responsáveis do BdeP se terão distraído dessas funções, distracção que seguramente ficará cara aos contribuintes. A solução, porém, não deve ser a da desresponsabilização futura do BdeP, mas, ao contrário, o aperfeiçoamento dos mecanismos de controlo do sistema e de cada um dos componentes. Primeiro, porque as instituições não podem ser confundidas com as pessoas que, conjunturalmente, respondem por elas. Em segundo lugar, para que, no futuro, não haja a desculpa da falta ou inadequação dos meios jurídicos.
4 comentários:
Caro Ferreira de Almeida,
Subscrevo na íntegra o seu post.
Chegou a hora de olhar a sério para a instituição, de avaliar o que realmente falhou, porque falhou e tomar medidas para a apetrechar convenientemente. Com discrição, como devem ser estas coisas. Agora, que já nos vimos livres do folclore da comissão parlamentar, palco de campanhas eleitorais, chegou ao fim e só deixou ruido. E o pior é que já todos sabíamos que ia ser assim, uma coisa ad hominem, como aqui no 4R foi vaticinado na altura. Mas pronto, são estes os deputados que temos.
Caro JMFA,
Reforçar os poderes de um regulador é dizer ao mercado que as falhas de regulação serão menos prováveis. É mentira, porque a maioria deriva do estado da arte. Por isso, o reforço dos reguladores é o primeiro passo para uma nova crise igual à que temos que, em boa medida, foi criada pela validação dos reguladores a algo que, no passado, passaria por uma avaliação mais rigorosa de cada banco. Aquilo que deveria acontecer é exactamente o contrário.
Caros JMFA, SC e Tonibler,
Em psicologia, a catarse consiste numa terapeutica por intermédio da qual se pretende expugar sintomas patológicos, através da exteriorização emocional de traumatismos recalcados.
Parece-me que é, malfadamente, a este tipo de exercício terapeutico que se vêm entregando os diferentes governos ocidentais, geralmente no rescaldo de escândalos que os (e que nos) ultraspassam.
A produção legislativa a partir do caso concreto constitui, todavia, o pior exemplo de legística, justamente porque a Lei se pretende geral e abstracta.
Reformar o Banco de Portugal para que passe a exercer, de forma eficiente e eficaz, os amplos poderes de que já dispõe (o que, manifestamente, não faz), parece-me bem.
Reforçar poderes, só para se dizer que "da próxima é que vai ser", não passa de um exercício de catarse, que cria uma ilusão de segurança que nos conduzirá, serenamente, até ao próximo descalabro.
Entretanto, sob o invólucro da "independência", a autoridade de supervisão tornar-se-á, temo-o bem, menos acessível, menos transparente e, consequentemente, ainda menos responsável.
E, à boa moda portuguesa, veremos adiada "ad aeternum" a resposta à questão fundamental que emergiu dos três casos citados:
"Quis custodiet ipsos custodes"?
Caro Henry:
Percebo bem o seu ponto de vista e subscrevo-o. Penso ter o Henry toda a razão quando alerta para os excessos de independência do BdeP (e já agora, dos demais reguladores) e o que, na penumbra dela, pode no futuro acontecer: algo de sentido inverso ao que ocorreu no passado e se detectou no presente, com os efeitos asfixiante sobre as actividades financeiras o que seria quase tão pernicioso como o já diagnosticado laxismo.
E tem também razão quando assinala uma das patologias mais graves que atingiu o poder público: o virus da pulsão legisferante crónica. Que não é endógeno, atinge todo o mundo ocidental e infectou sobretudo a UE.
No caso da anunciada reforma do BdeP, se bem entendi as intenções do Ministro - e se não forem estas, devê-lo-iam ser - pretende-se aperfeiçoar os mecanismos de controlo e supervisão. Parece-me ser um daqueles casos em que o legislador não pode faltar: quando, reconhecendo que certos efeitos indesejados são determinados pela falta, incompletude ou inadequação de soluções legais, procurar as que se mostrem mais ajustadas.
Agradeço-lhe a sua nota, que corresponde a um ponto de vista muito importante.
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