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terça-feira, 29 de setembro de 2009

Aranhas, moscas e outros insectos impertinentes


"Há algo mais desumano e destruidor do que o cinismo que procura negar a grandeza da nossa procura da verdade e o relativismo que corrói os verdadeiros valores que inspiram a construção de um mundo unido e fraterno?", Bento XVI, em Praga.


O Papa fez um discurso em Praga, perante diplomatas e políticos e os jornalistas puderam assistir à cerimónia perante um écran gigante, suponho que para poderem noticiar e desenvolver o tema da intervenção do Papa. Mas eis que uma aranha negra começou a passear nas brancas vestes papais oferecendo de bandeja a emoção do dia, e tanto bastou para que a cerimónia passasse a segundo plano.
A teia comunicacional teceu-se num instante, seguindo fascinada o percurso do animal, suspensa da reacção do Papa, quem sabe mesmo se cochichando apostas sobre se Sua Santidade teria a impaciência e a pontaria de Obama e lhe assentaria uma palmada certeira. Nada, a aranha campeou livremente, o Papa estava concentrado no que tinha para dizer, numa atitude certamente considerada pouco moderna, não é um bicharoco qualquer que o desvia do que considera importante, lá ficou a cena sem remate, que pena, foi preciso compor frases para terminar as crónicas.
Uma breve pesquisa na Net mostra que o que foi notícia, daquele magno encontro, foi o passeio da aranha, nada do discurso nem do seu impacto.
Nem Obama, nem mesmo o Papa resistem à intromissão de insectos impertinentes que ocupam o palco e distraem do que é importante, num culto absurdo da pequeníssima coisa, da intriga ou da anedota. O que seria no máximo um incidente torna-se notícia estrondosa, o resto para que é que interessa?, já está feita a notícia e marcada a agenda do dia. Pouco trabalho e muita espuma, e as páginas vão-se cobrindo de letras e palavras que até parecem notícias.

8 comentários:

jotaC disse...

Cara Dra. Suzana Toscano:

Pessoalmente abomino aranhas, não gosto mesmo nada, e imaginar que um dia uma se atreva a passear-se no colarinho da minha camisa, assim à vista de toda a gente, causa-me repulsa!... Quanto mais imaginar uma aranha nas vestes alvas de Sua Santidade! Não, a sério, não consigo.
Mas não é por dá aquela palha que tenho esta repulsa. Não! Bem pelo contrário, tenho motivos que considero sérios, que me escuso aqui a contar. Um dia talvez…

Claro que não tenho a veleidade de considerar que uma aranha no meu colarinho seria motivo de notícia. Não, quando muito, alguém diria: coitado, dorme nem palheiro, é um sem abrigo que puxou uma camisa branca de um estendal…

Notícia, notícia, é esta que a Dra. Suzana Toscano nos conta, e, igualmente seria notícia, se uma aranha se passeasse no colarinho branco da camisa do Srº Presidente da República…

Mas como é possível que uma aranha tão insignificante, não é sequer uma tarântula e muito menos uma viúva negra, a tal que mata o macho após a cópula, se tenha tornado um obstáculo imenso na passagem da mensagem!?

António Transtagano disse...

Dra Suzana Toscano

Vá lá, Dra Suzana, não é Eminência mas Santidade. Não se iniba de atribuir ao Papa o título dos Cardeais, que ele também é, de resto.

Mas o seu interantíssimo post, ao demonstrar como é que uma aranha negra nas alvas vestes papais consegue relegar para plano secundaríssimo outras coisas importantes, lembrou-me, curiosamente, o episódio da notícia do Papa a Portugal, difundido pela Presidência da República a poucos dias do acto eleitoral...

Bartolomeu disse...

Sua Excelência O Presidente da República, terminou agora a sua comunicação ao país.
Foi claro na exposição dos seus pontos de vista e nos esclarecimentos que eram devidos ao povo português.
Mais não é preciso que o Presidente diga, para que todos os que dúvidas mantinham acerca do seu carácter, compreendam que ali está um verdadeiro e completo Chefe de Estado e que, se o governo se empenha em se apresentar como pessoa de bem, deverá retratar-se de todas as duvidas levantadas e alimentadas a respeito da sua pessoa.

Margarida Corrêa de Aguiar disse...

Suzana
Abençoada aranha, pensaram os jornalistas!
Primeiro porque é coisa rara uma aranha, ou qualquer outro bicho, atrever-se a passear nas vestes do Papa. Uma aranha com estes atributos deveria correr mundo e fazer do acontecimento um verdadeiro sucesso.
Segundo porque um tal acontecimento obviou à parte trabalhosa de analisar e comunicar a essência da intervenção do Papa.
Entre a passagem do Papa que a Suzana escolheu "Há algo mais desumano e destruidor do que o cinismo que procura negar a grandeza da nossa procura da verdade e o relativismo que corrói os verdadeiros valores que inspiram a construção de um mundo unido e fraterno?" e o passeio de uma aranha o que é mais fácil e mais mediático? A resposta parece ser fácil.
A reflexão do Papa é profunda e sábia. A mentira e o cinismo minam a confiança e destroem as relações. Procurar a obtenção de vantagens usando estas técnicas prejudica, como lembra o Papa, a união e a fraternidade que tanta falta fazem no mundo em que vivemos. Não li a intervenção do Papa, pelo que me fico por aqui...

António Transtagano disse...

Bartolomeu (20:18)

Ai que mauzinho...!

Anónimo disse...

Suzana:
Oportunissimo apontamento. O episódio revela bem que, no espaço público, a disputa entre a mensagem e o insecto ganha sempre o insecto. Mas é assim, queiramos ou não, porque a larguíssima maioria das pessoas prefere sempre a leveza do insecto do que uma mensagem que apelava justamente à profundidade dos valores.

Anónimo disse...

Já agora, Suzana. E por cá não tem sido assim? Não tem havido quem se tenha especializado em criar insectos para que as pessoas neles se fixem, poupando-as a pensar em coisas sérias?

Suzana Toscano disse...

Caro jotac uma aranha calha bem porque é mais raro, mas qualquer mosquinha serve, sobretudo se passar a morta em directo.
caro António Transtagano, já emendei, muito obrigada!
Caros Margarida e Zé Mário, acho que em todo o lado é assim mas é preciso que se tenha a consciência disso para só nos deixarmos distrair quando quisermos e não sempre que os outros queiram.