1.Vão-se acumulando os sinais de insatisfação pela forma como a zona Euro tem vindo a responder às dificuldades causadas pelos graves desequilíbrios com que as economias e as finanças públicas de alguns dos membros se defrontam.
2.Sinais de insatisfação que se concentram em dois pólos opostos: (i) aqueles que ainda sonham com uma Europa Social, que não fazem contas e desde sempre assumiram como dogma, no conceito "Europa", a sustentação de um “Welfare State” em que as preocupações de eficiência e de utilização criteriosa dos recursos públicos são aspectos marginais, depreciativamente apelidados “preocupações de contabilista”; (ii) os países do norte da Europa em geral, com as suas opiniões públicas exercendo crescente pressão, parecendo cada vez menos dispostos a “abrir os cordões à bolsa” para financiar as necessidades dos estados-membros que, por força de uma reiterada indisciplina financeira e de um nível de endividamento excessivo precisam da ajuda/resgate dos demais para sobreviver (no Euro).
3.Como é hábito acontecer, a tensão entre estas duas posições, que tem vindo a agravar-se a cada dia que passa, deverá quebrar pelo lado mais fraco - não tendo os países endividados outra solução que não seja acomodar-se às exigências daqueles de quem depende a sua própria sobrevivência financeira.
4.As últimas duas semanas, após o acordo atingido na cimeira europeia sobre o alargamento da capacidade de intervenção do Fundo Europeu de Estabilidade Financeira, celebrado então como um importante passo em frente, têm sido férteis em episódios que mostram a fragilidade do acordo obtido.
5.Destacarei apenas dois episódios aos quais atribuo especial significado: em 1º lugar a decisão do BCE de comprar dívida pública italiana (sobretudo) e tb espanhola no mercado secundário, e 2º as (recentíssimas) propostas alemãs que apontam na direcção de uma união fiscal e financeira.
6.A decisão do BCE de voltar ao mercado para comprar dívida soberana, em especial a italiana, terá apanhado alguns observadores de surpresa, conhecedores da forte relutância alemã em relação a esse tipo de “negócio” do BCE.
7.No entanto, os alemães terão percebido que muito pior do que isso seria cair numa situação em que, por pressão dos mercados, tanto italianos como espanhóis se vissem na contingência de pedir apoio ao FEEF que como se sabe não dispõe de recursos para prestar a qq desses países uma assistência similar à que prestou à Grécia, Irlanda e Portugal – daí que, aparentando relutância, aceitaram que o BCE se tivesse lançado “às compras” de dívida italiana e espanhola para evitar males maiores.
8.Quanto às propostas alemãs que visam (i) passar a aplicar aos países do Euro testes de “stress” para se saber como se comportam as suas economias e para agravar as sanções por desvio à ortodoxia económica e financeira e (ii) impor limites constitucionais às dívidas públicas - parecem apontar claramente na direcção de uma união financeira e fiscal embora ainda longe da fase final dessa união.
9.Veremos, a seguir a estas conturbad(íssim)as férias de Verão, como vão os demais países reagir às propostas alemãs...mas, como acima referi, é bem provável que acabem por não ter alternativa a não ser aceita-las.
10."Manda quem pode, obedece quem deve”: e poucas vezes à palavra “deve” terá sido dado um significado tão profundo como neste caso tem...
3 comentários:
Caro Dr. Tavares Moreira;
Desde ha muito, que vários analistas de diferentes "bandas" acreditam que a zona euro, caminha para adesagregação. Saramago, foi talvez a primeira "figura mediática" a vaticinar esse desmoronamento, tento criado até uma metáfora que intitulou de "Jangada de Pedra" a qual, após se ter fracturado e separado da Europa rica, derivou oceano fora, quase colidido com os Açores.
Para Portugal, verificamos hoje, que a adesão à moeda única, consequência da entrada para a UE, resultou nefastamente. Após uma caminhada no sentido que parecia ser o do progresso, o terreno começou a inclinar-se cada ano mais acentuadamente, até à quase vertical.
Para onde caminhamos...?
Se ao menos soubéssemos de onde vimos e por onde passámos... mas a memória dos povos é curta.
A verdade é que a única coisa que mantém o estado português vivo é a mal que nos faz sem proveito que nos traga. A solução é aquela que Mário Soares, Freitas do Amaral, Álvaro Cunhal e tantos outros lutaram toda a vida. O fim!
Portugal morreu, hoje sobra a república portuguesa, uma espécie de SPV onde todo o tipo de activos tóxicos e passivos difíceis foram colocados à espera de ser liquidados. Hoje a república portuguesa é um conjunto de más leis, péssimas administrações e horríveis serviços comuns que todos vivíamos "better off". Liquidados os passivos e feito o write-off dos activos, nunca mais ninguém vai querer a república portuguesa.
Hoje, com notícia da nomeação de Santana Lopes para a Misericórdia, penso que todos concordarão que chega e que nem Sócrates Dos Últimos Dias se atreveria a zombar desta forma de um povo. Feche-se então e homenageiem-se os "históricos" atrás referidos que tanto fizeram por isso. Seremos certamente melhores europeus que fomos portugueses...
Caro Bartolomeu,
Esse "desde há muito que..." parece-me algo desajustado, se me permite...
Não me recordo, a não ser nos últimos dois anos, com o fogo já bem dentro de portas, de algum oráculo dos mais conhecidos vaticinar a desagregação desta belíssima zona monetária...
Esta gente viveu sempre na ilusão de que a entrada no Euro representava o último patamar da felicidade colectiva, constituia uma conquista irreversível dos europeístas, estava tudo garantido em especial a perenidade do Welfare State...
Até que a realidade acabou por impor a sua lei e agora estão desorientados sem saberem o que se passa e sem cartilha nem bússola que os possa orientar...
Por isso se agarram aos grandes símbolos que adornaram o modelo europeu - com destaque para a desfesa "intransigente" do Estado Social - e tentam desesperadamente que os outros continuem a pagar as nossas facturas, acusando-os de falta de visão "estratégica" se o não fizerem...
Caro Tonibler,
Ora aí temos uma penetrante análise social e política, tipicamente "à Tonibler", em período estival sempre muito propício à expressão dos nossos sentimentos mais profundos...
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