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segunda-feira, 13 de janeiro de 2014

"Oração"

Telefonaram-me há dias perguntando se a podia ver. Lembrei-me de imediato quem era e fiquei surpreendido, ainda estava viva. Explicaram-me os motivos, e eu, naturalmente, disse que sim. -Tem 97 anos e está com alguns problemas motores. Pensei que queriam que fosse a casa vê-la. - Então, nesse caso vamos aí para a semana. As surpresas somavam-se umas atrás de outras. Tratava-se de uma senhora que vive sozinha há muitos anos, fina, delicada, mas que que trabalhou no duro no estrangeiro durante muitos anos. Apesar de não ter muita instrução, tinha, e continua a ter, traços de uma espontânea e encantadora aristocracia, a que não é estranho a inteligência, superior aos demais, e uma alma verdadeiramente cristã. Não é comum recordar a vida das pessoas, mas neste caso, talvez pela singularidade da sua vida e forma de estar, recordei as últimas vezes que a vi há cerca de oito anos. Vi-a mentalmente, uma senhora socialmente soberba, quer no raciocínio quer no trato e na forma como se exprimia. 
Fisicamente não me foi difícil verificar que a sequela de um acidente vascular cerebral impedia-a de executar as suas lides domésticas e cuidados pessoais. Não tem ninguém, nenhum familiar direto ou afastado. Não tem dificuldades financeiras, apesar de não ser rica. Presa e amante de sua casa, recusa-se, obstinadamente, de acordo com a acompanhante, a ir para uma instituição. A sua situação causou-me não perplexidade mas uma profunda perturbação. Fiquei num estado de ansiedade. A situação era mais social do que médica. A senhora queria que lhe desse "força" naquela perna para poder fazer o seu dia-a-dia. Depois de inspirar fundo tive de lhe dizer abertamente que não podia continuar a viver sozinha. Não foi fácil, reagiu, debateu-se, chorou, e implorou para continuar a viver na sua casa. As mãos juntaram-se e elevaram-se na prece mais sentida que vi, ouvi e senti até hoje, colocando-me num hipotético altar de um qualquer nobre templo, como se fosse um representante do divino. Comoveu-me aquele pedido e oração. Desci do altar e expliquei-lhe as razões da minha decisão. As lágrimas brotaram-lhe dos olhos e o carinho e respeito como continuava a tratar-me perturbaram-me sobremaneira. Senti estranhas sensações, cumprir com o meu dever, tentar demovê-la dos seus intentos sem a ferir, criar confiança no futuro e não a fazer sofrer foram algumas das minhas intenções. Tinha que fazer algo, tentar justificar que as instituições que se dedicam a cuidar de idosos são idóneas, cristãs e respeitadoras das necessidades de qualquer pessoa que precise de carinho, cuidado e atenção permanente. Foi difícil, muito difícil, tive que personalizar a situação descrevendo a minha experiência a vários níveis, coisa que habitualmente nunca faço. Fi-lo com o objetivo de a convencer. Fi-lo e prometi-lhe que até ao último dia da sua existência lhe daria todo o cuidado e atenção que necessitasse, mas em troca teria de aceitar o meu pedido. Foi dramático, muito dramático. Conversámos. As suas mãos, sempre na posição de oração, viraram-se mais uma vez para mim, acompanhadas de belos olhos que lacrimejavam gotas de compreensão, e, finalmente, um doce e tranquilo sorriso resplandeceu naquele velho rosto, agradecendo e dando a entender que ouviu ou sentiu a força de alguém ou algo que eu não ouvi nem senti. Quando vi o novo olhar e o sorriso brilhante, lançados através de um longo beijo atirado com as suas mãos enrugadas, senti um agradável conforto no silêncio da despedida. Respirei fundo.

17 comentários:

Anónimo disse...

Caro Professor, dizer a alguém com essa idade que não pode continuar a viver sozinha na sua casa, no seu canto, no seu sítio, tem que ser das coisas mais horriveis e duras na sua profissão. Tirar alguém dessa idade das paredes que são suas e sempre lhe foram familiares deve ser horrivel.

Vá-nos dando notícias da evolução dessa boa senhora. Fiquei interessado no caso...

Suzana Toscano disse...

A vida é muito dura, caro Zuricher, por mais que se faça para pouparmos os nossos mais velhos às agruras do fim da independência e da capacidade de acabarem os seus dias como desejariam, acabamos por ficar derrotados. É quase impossível arranjar quem queira, saiba e possa tomar conta de um idoso na sua casa, mesmo pagando, mesmo vigiando, mesmo fazendo tudo o que possa imaginar. Há uma infinidade de coisas que acontecem, as casas que precisam de arranjos, as compras diárias, o frio, o calor, as zanagas, as doenças, os fios de várias vidas que é preciso voltar a juntar. A certa altura perguntamos-nos, angustiados, se estamos a proceder bem, se não seria mesmo melhor um lar, mas se a pessoas não quer deixar a sua casa, as suas recordações, se passa mal e ainda assim prefere, o que fazer? O que fazer? Se alguém souber responder, agradeço...

Anónimo disse...

Bem sei, cara Suzana, bem sei. Também tenho uma avó... E bem complicada neste campo. Há quem aceite ter alguém em casa o que é uma alternativa ao lar, realmente. Mas também há as que nem isso aceitam e aí os problemas avolumam-se.

Lidar com os mais velhos é dificil. Muito dificil.

Bartolomeu disse...

Quando era criança e, até já crescidote, a necessidade de alguém ser sujeito ao internamento hospitalar, representava para o próprio, para a família e os amigos, como que uma certidão de óbito antecipada. As pessoas tinham horror aos hospitais e ainda mais às cirurgias e aos internamentos, os quais, geralmente, duravam semanas e meses. Hoje, a "coisa" banalizou-se de tal forma que por uma simples constipação, ou uma ponta de febre, muita gente corre para o hospital mais próximo. A maioria das cirurgias, algumas até, consideradas de maior risco, têm uma recuperação por vezes, de dias. É claro que a morte surge a qualquer momento, quer se sofra de uma doença grave, como de uma simples infeção, ou até... de nada. Quero dizer com isto, e espero não estar a fazer um juízo errado, que: do mesmo modo que as pessoas atualmente venceram a resistência ao recurso ao internamento em hospitais, dentro de uma geração, vencerão também a resistência ao internamento em instalações para idosos. A questão cada dia mais comum e transversal da solidão, e da incapacidade física de poder estar na própria casa ( o que nas gerações atuais, já não possui o mesmo valor sentimental familiar como foi nas gerações anteriores em que na casa de família, mandada construir pelo bisavô quando casou, onde nasceu o avô, onde casou e onde nasceu o pai e se casou) será com certeza motivo mais forte para o próprio optar pelo internamento num lar, que pela permanência na própria casa, sujeito muitas vezes à caridade alheia de uma simples visita.

Anónimo disse...

Interessante ponto de vista, Bartolomeu, muito interessante. Não sei, porém, se o partilho. Pelo menos pensando em mim... É que eu realmente não tenho apego a casas mas sim às minhas coisas. Efectivamente mudo-me de casa muito facilmente mas tenho uma série de coisas que andam sempre atrás de mim e que num lar evidentemente que não poderia ter.

Aliás, muito embora ainda seja novo, por vezes penso o que vai ser das minhas coisas a que tanto carinho tenho no dia em que morrer...

Margarida Corrêa de Aguiar disse...

Caro Professor Massano Cardoso
Uma das minhas Avós partiu com 99 anos. Viveu lúcida até ao fim, nos últimos anos foi perdendo a visão. Viver na sua casa com as suas coisas deu-lhe muitos anos de vida. Como poderia a minha Avó tocar piano todos os dias, quando mais lhe convinha, dependendo da sua inspiração e vontade, se tivesse sido "institucionalizada" num lar? Felizmente, sempre teve o apoio da família, com momentos de dificuldade, é verdade, mas compensados pela sua garnde alegria de viver.
Nem sempre é assim, nem sempre é possível...

Bartolomeu disse...

Compreendo o seu ponto de vista, caro Zuricher e, acerca da questão que realça; a relação que ao longo dos anos vamos estabelecendo com determinados objetos e o que eles podem representar para cada um de nós e a consequente vontade de os manter na nossa posse, à nossa vista, ao alcance da nossa mão, é uma questão que em minha opinião, poderá ser perfeitamente compatível com a vida num lar.
Sabe; desde alguns anos, alimento a ideia de construir uma residência coletiva para idosos. Elaborei um projeto em que a ocupação e a interação entre residentes, funcionários e técnicos, visa o bem-estar físico e psicológico e ainda a auto-sustentabilidade. O meu projeto será implantado numa zona rural, num terreno que já selecionei, plano, com um excelente acesso, ótima exposição à luz solar, e uma vista ampla. A construção será simples, confortável, e funcional, imperarão as energias renováveis, a luz natural. Trabalharemos em conjunto com técnicos empenhados e sensíveis à questão da estrutura social em ambiente de interatividade entre a pessoa e o ambiente. Para concretizar este projeto, falta-me aquilo com que se compram os melões, mas... chego a acreditar que o facto de esse pequeno óbice não ter sido ultrapassado, ainda, tem uma razão de ser; tem servido para amadurecer mais a ideia e acrescentar novas ideias à inicial.

Anónimo disse...

Bartolomeu, estamos a falar de MUITOS objectos e muitos dos quais volumosos. Só é compativel te-los numa casa. Jamais num lar.

Massano Cardoso disse...

Apraz-me registar este debate. Concordo com as opiniões, todas válidas e interessantes, mas, na prática, existem certos aspetos a quem eu tenho de dar prioridade, manter no patamar da dignidade a vida das pessoas, mesmo que tenha de sacrificar certos laços. Dói? Dói. Mas não posso aceitar certas situações em que o respeito e a dignidade humanas sejam vexadas perante as insuficiências físicas ou cognitivas. Mesmo num lar, mesmo fora de casa, mesmo sem os seus objetos, ainda é possível dar carinho, atenção e respeitar a vida humana. Eu sei do que falo, sei e muito. Não me importo de sacrificar o meu tempo e o meu silêncio em troca de um sorriso, de um carinho e de uma atenção, nem que tenha de descer as pálpebras sobre os olhos que deixaram de ver a luz e sentir a presença de um ser semelhante ao seu. Não me importo!

Pinho Cardão disse...

Caro Professor:
No lançamento do último livro com textos do 4R, As Farpas da Quarta, o apresentador, Dr. Proença de Carvalho, referindo-se aos textos do meu amigo, dizia que eles prosseguiam a bela tradição dos médicos escritores, onde confluíam o amor da medicina e o culto da escrita literária.
A cada texto que passa neste Blog isso é cada vez mais verdade. Pelos seus escritos perpassam perfis, tempos, lugares, sentimentos, amores e dissabores, descritos com mestria tal que todos os vamos sentido no decorrer da leitura.
Obrigado, meu amigo. Pelos textos e por ser seu amigo.

Suzana Toscano disse...

Caro Zuricher, uma avó não chega, peço -lhe desculpa, é preciso sentirmos isso com um pai ou uma mãe, sem ninguém no meio que nos dispense de sermos nós a tomar decisões e a viver com elas nas nossa consciência, será que fiz bem? Será que devo teimar? Será que? Além disso também já aprendi que com a dependéncia crescente as pessoas vão-se desligando a pouco e pouco do que antes era "seu" vão renunciando primeiro, com sofrimento, depois desistem mesmo, como se tudo tivesse deixado de lhes pertencer. Não podem decidir nada, não têm nada de que os outros não possam dispor ou de que não decidam dispor sem que possam impedi-los, acabam por não se importar. Isso a propósito da importância dos objectos que nos são queridos. A velhice, e a dependência que em geral lhe está associada, é um despojamento total, material e afectivo, não se tem nada e já pouco se espera, recebe-se quando se tem essa sorte. Proteger alguém disso, desse sentimento e desse abandono, é uma tarefa ciclópica, não basta o amor, embora indispensável e já ajude muito, mas não basta.Há tanta coisa que interfere com a sorte de cada um.

Anónimo disse...

Cara Suzana, neste caso e com esta avó não há ninguém no meio. Sou eu quem tem que pensar na melhor forma de dar a volta, sobretudo a ela própria.

É uma pessoa que toda a vida esteve habituada a mandar e ser obedecida. Admite plenamente a idade que tem mas não aceita que ter essa idade trás consigo algumas limitações. Não quer ninguém com ela e insistir é complicado dado que tem o condão de conseguir fazer a vida negra aos demais quando contrariada. Nem a mim! Aliás, quando passo muito tempo em Lisboa começa a enxotar-me porque bem por dentro tem noção das suas limitações e não quer que eu as veja. Para além das limitações físicas, as da mente. Penso que se apercebe delas mas jamais em dias da vida quer dar parte de fraca. Tem empregada doméstica. Vamos a ver até quando... A anterior um dia foi-se embora. Deixou de aparecer, simplesmente. E eu sou capaz de a entender. Nenhuma mulher casada e mãe de filhos aceita ser tratada como uma criança. Aceita que lhe dêem ordens num tom duro e autoritário ou que a repreendam como a uma criança. Agora imagine o que não seria com alguém ali ao lado o dia todo e acompanhando-a para todos os lados. Dum lar tenho medo. Não posso obrigar minha avó a ir e eu próprio, digo, não quero. Tudo menos isso. Seria algo a considerar só numa situação limite como conheci uma há muitos anos. Temo que a alguém com aquele feitio lhe dêem comprimidos para acalmar ou coisa do género só para não terem que a ouvir. Assusta-me muito tudo isso. E, claro, não sei como seria possivel mante-la lá. Impedi-la de meter-se num carro de praça e voltar para sua casa. Mas também, como digo, é hipótese que não considero.

As limitações físicas e mentais são sempre frustrantes. Para alguém com personalidade forte e que toda a vida pôs e dispôs é um grau mais adiante.

Quanto aos objectos, Suzana, espero nunca chegar a esse grau de despojamento. São coisas a que tenho um profundo carinho. E mais as que hão-de vir quando as minhas mais velhas morrerem, a minha avó e a minha mãe. Não tenho filhos ou sobrinhos nem terei. Esse sentimento de indiferença, antes a morte que tal sorte.

Bartolomeu disse...

Caro Zuricher, quanto aos nossos idosos; avós e pais, compete-nos assegurar-lhes o maior conforto, físico e psicológico, articulado com o nosso. Não nos podemos esquecer de que: para estarmos aptos a resolver da forma mais adequada, os problemas que lhes forem surgindo, temos de estar em melhor forma que eles.
Quanto a nós próprios e servindo-nos das experiências que formos vivendo com os mais velhos, compete-nos também, enquanto conhecedores daquilo que nos dá maior prazer e aquilo que nos arrelia, preparar a velhice, prevendo o máximo de hipotéticas situações possíveis. Quanto a objetos, apesar de possuir vários que me contam histórias, não dependo emocionalmente de nenhum deles. Somente pelos livros sinto apreço, mas de lê-los nada mais. Guardo-os e releio-os, ou procuro neles partes que por um motivo qualquer desejo relembrar, mas não sinto necessidade de os carregar comigo para qualquer parte. Sou sobretudo um consumidor de leitura. Quanto ao ingresso num lar, já tive uma conversa com os meus filhos e pedi-lhes duas coisas: que me coloquem num lar sem qualquer problema de consciência, mesmo que na altura eu não concorde e que se entretanto for aprovada a eutanásia deem a necessária autorização para me limparem o sebo, caso chegue a uma idade avançada, ou passe a sofrer de um problema de saúde grave e sem hipótese de tratamento. Quanto a estas questões, vivo sem preocupações e seguro que não virei a ser a causa de transtorno na vida daqueles que mais amo.

Anónimo disse...

Caro Bartolomeu, sou o mais possivel a favor da eutanásia em certas circunstâncias. Há alturas em que é preferivel morrer do que viver.

Quanto aos objectos, tenho-lhes efectivo apego. Ligação emocional como lhe chamou. O meu sistema de som de 1954. O meu robot de cozinha comprado em 1952, um modelo alemão da década de '40. A minha balança amarela dos anos '30. E, também dos anos '30, a minha picadora de carne manual, em ferro, enorme. Tudo funcional, tudo em uso diário e de que faço tremenda gala de usar diante das visitas. O meu serviço de jantar e mais o que me virá parar às mãos quando a minha avó morrer e que tem história. O meu serviço de jantar que uso na cozinha. Os meus serviços de chá e café. A minha almoçadeira que herdei da minha bivó. O meu sofá orelhudo de 1940 e qualquer coisa. O meu outro sofá, modernista, anos '60. Os meus peluches. Os meus quadros. Os meus bibelots e pratas que já fui herdando antecipadamente e mais o que receberei quando a minha avó morrer. A minha coluna de alabastro electrificada com candeeiro a condizer. As tropecentas coisas que fui trazendo um pouco de todo o mundo. O meu conjunto completo de bar. Os meus serviços de copos. E isto é apenas uma parte da imensa babel de que vivo rodeado. Deixo para o fim os meus livros. Os meus, que são muitos, mais a biblioteca do meu avô que também cá virá parar e que só ela, quando for o momento, obrigar-me-á a mudar de casa. Não concebo a minha vida longe de tudo isto, Bartolomeu. Repare, eu nos ultimos 18 anos, desde os 18 até aqui, já vivi em 6 casas diferentes. Boa parte desta tralha tem andado atrás de mim de casa para casa.

Não concebo a minha vida sem estas coisas por perto. São parte de mim, do que sou e das minhas memórias. Como disse, embora seja novo penso muitas vezes no que será disto tudo quando eu morrer. Mas com sinceridade lhe digo. Que desbaratem depois de eu morrer. Quem cá ficar que faça o que quiser. Mas só depois de eu me ir. Há coisas que prefiro não ver e o desbaratar dos objectos a que tenho carinho é uma delas.

Com tudo isto acha viavel eu ir viver para um lar? Ser o velho dos suspiros? Permanentemente a suspirar pelas minhas coisas, pelo meu conforto, pelo que me tem rodeado toda a vida? Era a maneira de eu ir mais depressa para o outro mundo!

Suzana Toscano disse...

Caro Zuricher vai certamente poder gozar e dispor das suas coisas por muitas e generosas décadas, e só lhe desejo que saiba sempre apreciá-las com o entusiasmo com que aqui as descreve, num "brevíssimo" das suas memórias acumuladas e estimadas que nos deixou espreitar. Quanto à avó, percebo bem demais o que refere, vivo uma situação muito semelhante, incluindo a personalidade e a rapidez com que se sucedem as empregadas e a zangas e a forma como nos fazem sentir uns intrometidos quando tentamos por água na fervura, prevendo os problemas seguintes. Adoptei agora a decisão de só me preocupar com um dia de cada vez, já que não serve de nada procurar soluções duradouras, de um dia para outro lá volta tudo a embrulhar-se e a minha "mais velha" a lamentar-se por andar a ter que aturar "desconhecidas" dentro de casa a mandar nela. Enfim, desejo-lhe paciência e boa sorte, o facto é que quando gostamos muito de uma pessoa a preocupação e o sofrimento com o que lhe possa acontecer faz parte da equação. Antes isso do que nunca gostarmos de ninguém.
O caro Bartolomeu é um espírito prático e um pensador, as duas coisas trazem sensatez e coragem, impressionou-me a tranquilidade com que enunciou as suas disposições, o mais que desejamos é sermos senhores de nós próprios até ao fim.

Bartolomeu disse...

Estimados amigos, penso que acerca do mesmo, teríamos assunto de conversa suficiente para preencher o tempo que nos resta até ao fim das nossas vidas, suspeito até, que durante toda a conversa, não correríamos o risco de nos repetir.
;)
Mas, voltando ainda à questão da posse dos bens, vou-lhes contar uma pequenina história pessoal: há menos de uma ano, faleceu o meu sogro. Entre outros, o meu sogro possuía um mercedes SL 190 de 1954 que era conservado com todos os cuidados, encontrava-se novo. Após o falecimento, juntaram-se os 3 filhos e fizeram (quase) pacificamente a divisão dos bens. Chegados à parte do mercedes, ficaram todos "nas encolhas" ninguém levantava o dedo, nessa altura, a minha mulher perguntou-me se eu queria o carro; respondi-lhe imediatamente que não. O carro é lindo, é um modelo desportivo e tu gostas tanto de carros, disse-me ela. É verdade, gosto de carros, mas se ficasse com este, assumia conjuntamente a obrigação moral de o manter e conservar, da mesma forma que o meu sogro fazia. E eu, que já achava tão mal empregue as fortunas que ele gastava com a manutenção dos carros... Como diz a Drª Suzana, penso que possuo um espírito prático, talvez não seja em muitas ocasiões "politicamente correto", mas é aquele que mais me dá a sensação de realidade e de coerência de mim para com o mundo em que vivo.
É claro que não estou a querer dizer com isto, que ache errado o Zuricher adorar os seus objetos e não querer de forma nenhuma separar-se deles. Para mim, um objeto serve enquanto isso mesmo e nada mais para além de um utensílio que, tal como a palavra indica, deverá ser útil, a partir daí...

Anónimo disse...

Cara Suzana, espero efectivamente disfrutar dos meus tarecos durante muitas e boas décadas! Quanto às senhoras mais velhas e com personalidade intrat... leia-se, forte, vejo que me entende! Boa sorte também com o que tem aí por casa, eheheh!
Caro Bartolomeu, consigo ver a perspectiva utilitária na maioria das coisas e objectos... tirando nas minhas velharias que efectivamente fazem parte de mim. Se as perdesse e o carinho que lhes tenho tornar-me-ia ainda mais frio do que já sou. E nem comecemos a falar em carros. :)