Esta é mais uma história do país do "Simplex".
Numa Conservatória do Registo Predial, uma pessoa entregou um conjunto de documentos tendo em vista o registo de algumas propriedades rústicas.
Um dos documentos, oriundo da Direcção-Geral dos Recursos Florestais, estava incompleto: o funcionário que o elaborou esqueceu-se de colocar a data quando o assinou e havia umas caixinhas para por umas cruzes que não estavam preenchidas.
Vai daí, a Senhora Conservadora exigiu que o documento fosse corrigido.
Apesar de saber que o documento tinha sido elaborado num serviço que ficava a mais de 100 Km do local da Conservatória, a Senhora Conservadora foi totalmente intransigente - "o documento tem que ser rectificado naquele serviço".
Em desespero, e para não andar mais de 100 km, a pessoa dirigiu-se ao serviço da Zona Agrária que ficava num edifício contíguo ao da Conservatória e explicou o problema ao seu responsável.
O responsável pela Zona Agrária começou por lançar uma série de impropérios sobre a Conservadora. Depois agarrou no telemóvel e ligou para o serviço que elaborou o documento.
Falou com o chefe.
Seguidamente, agarrou no documento, preencheu a data, colocou as cruzinhas e disse: "o problema está resolvido, pode entregar o documento".
Sabem o que aconteceu?
Na Conservatória nem sequer perguntaram onde é que o documento fora rectificado...
... a Senhora Conservadora aceitou-o!
4 comentários:
Obrigado pela "dica". Nunca se sabe o que poderá acontecer amanhã...
Já agora, vai dando uns palpites para agilizar o "complex"! Tu tens muita experiência!
A questão real é que se a pessoa não tivesse ido ao edifício do lado, tinha feito os 100 km e a conservadora continuaria a dormir descansada.
Por isso nunca vou a um serviço público sem começar logo a falar de forma arrogante (às vezes até me assusto a mim) e já com a mão a tender para o livro (palavra mágica, "livro"). Desde que comecei a tratar mal os funcionários públicos nunca mais fui mal tratado. Experimentem, para mim foi uma surpresa e já não quero outra coisa. Chamem as pessoas por "oh fachavôr, chegue aqui!" com o dedo em riste, falem alto e digam que está tudo errado antes de verem se está ou não. Dá um resultadaço!
LOL :)))... Pois dá! :)
De qualquer forma, também há que haver algum cuidado porque nem todos os serviços funcionam assim. No entanto, como não é possível fazer essa identificação à partida, o melhor é mesmo usar a táctica do Tonibler.
No que diz respeito ao post do Vítor Reis é assim, compreendo perfeitamente a posição da «sinhora» conservadora e acho que ela fez o que devia ser feito. Nós aqui, embora noutro contexto, fazemos exactamente a mesma coisa. Quem procedeu mal foi o funcionário da Direcção-Geral de Recursos Florestais.
Quem elabora documentos tem o dever e a obrigação de se certificar que entrega tudo como deve de ser, mas quem recebe os documentos também tem o dever de verificar se os documentos estão todos em ordem, visto que a parte mais interessada, em que tudo esteja conforme, é a própria pessoa.
Na minha óptica, a única pessoa que não tem qualquer responsabilidade nessa questão é a Conservadora, porque ela cumpriu, de facto, o seu papel mesmo quando mandou a pessoa - que queria registar as propriedades - para um serviço a 100 km de distância.
Agora, se o indíviduo está disposto - ou não - a percorrer 100 km para corrigir um erro, isso já é outra história, até porque o mais fácil era; abancar numa esplanada, pedir um cafézinho e colocar as datas e as cruzinhas enquanto se fumava um cigarrinho. Assim como assim, o documento já estava assinado!
O Simplex é um enunciado de boas intenções que admite logo, no seu intróito, não ser perfeito nem completo.
Porém, em meu entender, constitui um esforço meritório no sentido de aumentar a eficácia e a eficiência dos serviços da administração pública na sua relação com os cidadãos, com as empresas e outras organizações.
Trata-se, pois, de um documento que merece o benefício da dúvida, quando não mesmo um apoio vigilante relativamente à operacionalização das medidas previstas. Porque isto de boas intenções está o inferno cheio.
Aliás, na prática, já existem alguns sinais contraditórios por parte da Administração. Por vezes a tendência dos serviços é criar mais e pior burocracia a pretexto do combate à burocracia.
Qualquer reforma administrativa implica normas injuntivas e penalizações para os funcionários prevaricadores. A definição de indicadores de produtividade para os serviços públicos, realistas mas exigentes, pode também estimular a criatividade e contribuir para a simplificação administrativa. Importa, porém, não negligenciar o factor qualidade.
O “pequeno poder” consiste, frequentemente, num exercício de demonstração de que as coisas são mais difíceis do que aparentam. Qualquer pequeno procedimento ou inócua diligência tem, para quem a realiza, o valor da “teoria da relatividade”. Só quem evidencia a complexidade das suas tarefas valoriza o seu desempenho - pensam muitos funcionários. Nesta esteira, muitos dirigentes entendem que a sua importância depende, não da satisfação de necessidades, mas do número de subordinados. Raramente algum dirigente diz que tem funcionários a mais. Na sua óptica, faltam sempre funcionários em quantidade e em qualidade. Ninguém avalia e compara, de forma rigorosa e isenta, os resultados. Neste contexto, é pouco comum um dirigente pronunciar-se sobre a agilização de processos e métodos de trabalho. As recentes notícias sobre o aumento de funcionários quer na Administração Central quer no Municípios são um testemunho vivo de que as palavras dos governantes não têm correspondência prática. São um mero exercício de ilusionismo. Neste sentido, também, os milhares de jovens que durante este último ano entraram como estagiários na Administração Pública. O estágio, como todos sabemos, é a antecâmara do ingresso. Nada tenho contra os estágios dos jovens, antes pelo contrário, mas em empresas ou instituições privadas. Assim, estamos só a adiar ou mesmo a agravar a resolução dos problemas. No entretanto vamos iludindo os números do desemprego.
A burocracia é uma marca genética do português. A principal fundação da burocracia é a desconfiança. E nós, na dúvida, desconfiamos! Pior ainda, perante o prevaricador intencional acabamos quase sempre por desculpar ou tolerar. Mas, perante o erro involuntário entendemos frequentemente que ali há gato (com rabo escondido). «- Hum, este está a querer dar-me a volta. Vai lá vai, logo vês o que te espera.»
Concluo, este comentário já vai longo, concordando com o Vítor Reis.
A senhora Conservadora tinha a razão formal mas não a funcional. Dever-se-ia ter colocado no lugar do contribuinte. Antes de o mandar “bugiar” deveria ter esgotado todas as hipóteses de resolver ali, naquele momento, o problema. Por exemplo, telefonando para o serviço público que emitiu o documento a fim de superar as eventuais lacunas. È assim que qualquer pessoa de bem deve proceder. E ainda mais se o “seu cliente” é quem contribui para lhe pagar o vencimento.
O Anthrax tem razão quando afirma que o principal responsável foi o funcionário da Direcção-Geral de Recursos Florestais. Mas quer a senhora Conservadora quer o referido funcionário são membros da mesma empresa, a Administração Pública. E, se de uma verdadeira empresa se tratasse, ninguém chutaria para o lado. É certo que também existem más empresas. Com mais dificuldade aceito a tese de que caberia também ao cidadão verificar se o documento continha erros ou omissões. É que as pessoas até têm medo de questionar a Administração que, por qualquer motivo inopinado, pode sempre retaliar. O melhor é pegar no papelinho e zarpar, antes que o funcionário mude de humor.
Mudar as mentalidades não é nada “simplex”.
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