A notícia, segundo a qual, o desemprego em Portugal poderá, pela primeira vez, em 2007, ultrapassar a média europeia, despertou-me a atenção para uma pequena nota que escrevinhei há cerca de 2 anos onde tentei analisar a relação entre esta preocupante situação e os acidentes de trabalho.
Portugal é um dos países que apresenta taxas de sinistralidade laboral das mais elevadas. Anualmente, ocorrem mais de 200.000 acidentes de trabalho dos quais cerca de 250 são fatais. O fenómeno não é só nosso. Na União Europeia, contabilizam-se, anualmente, em cerca de 4,7 milhões, o número de acidentes de trabalho que determinam absentismo superior a três dias; se incluirmos os que não exigem absentismo, então a cifra sobe para 7,4 milhões. A probabilidade de um trabalhador estar envolvido num acidente de trabalho é de 4,7% ou de 6,4%, conforme ocorra ou não ausência ao trabalho (superior a três dias) e a incidência anual de mortes por acidente oscila ao redor de 5 por 100.000 trabalhadores. Calcula-se em 150 milhões o número de dias de trabalho perdidos, facto que tem implicações sociais e económicas difíceis de quantificar.
Um dos fenómenos que caracteriza os acidentes de trabalho é o comportamento cíclico de subidas e descidas. Tem sido observada uma associação inversa com o nível de desemprego. Um dos determinantes utilizados para explicar este fenómeno consiste no facto de que, quando há um maior necessidade de trabalhadores (baixa taxa de desemprego), a exigência e a "pressão" exercidas sobre os mesmos serem consideradas os principais factores. Em contrapartida, o desemprego determina menos esforço e, consequentemente, menos acidentes.
No entanto, esta interpretação foi posta em causa por um investigador, Jan Boone, da Universidade de Tilburg, na Holanda (Centre Economic Policy Research). O estudo baseia-se na relação entre acidentes de trabalho e a taxa de desemprego nos 17 países da OCDE. O aumento do desemprego acompanha-se de uma redução dos acidentes não fatais, mas não se relaciona com os acidentes fatais.
Qual a explicação?
Quando aumenta o desemprego, a notificação de acidentes de trabalho diminui de forma significativa, porque o trabalhador tem receio de perder o emprego. A notificação dos óbitos não sofre alterações, por razões evidentes, justificando a ausência de variações cíclicas.
Os resultados encontrados neste estudo permitem concluir que os acidentes de trabalho não fatais estão inversamente relacionados com a taxa de desemprego, mas não com o número de horas de trabalho nem com as mudanças de emprego.
Ou seja, a determinante clássica para explicar este fenómeno, terá de ser substituída pela seguinte: o receio do desemprego determina uma sub notificação dos acidentes de trabalho (naturalmente os menos graves), por parte dos trabalhadores, nos momentos de crise.
Em Portugal, a taxa de desemprego tem vindo a aumentar. Sendo assim, é de esperar que, nos tempos mais próximos, possamos observar uma redução da sinistralidade laboral; mas não devemos considerar este fenómeno como resultado das melhorias de condições de trabalho, ou de um investimento sério em termos de segurança e higiene do trabalho, mas mais como um epifenómeno do aumento da taxa de desemprego que entretanto se observa entre nós.
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