O conceito de “plutonomia” é de criação muito recente, devendo-se a um talentoso economista - Ajay Kapur de seu nome até há pouco tempo destacada figura (“strategist”) da equipa de “global equity” do Citigroup.
Kapur publicou há alguns meses um ensaio, que tive oportunidade de ler, no qual introduziu pela primeira vez o conceito de plutonomia: a economia caracterizada por uma muito alta concentração da riqueza.
Exemplos? Segundo Kaipur, os EUA, o Reino Unido, o Canadá, mais recentemente a Rússia...Por oposição às principais economias da Europa Central – França e Alemanha nomeadamente, em que a concentração da riqueza é bastante menor.
A plutonomia explica em boa parte, segundo Kaipur, a persistência dos desequilíbrios da economia americana, uma vez que uma parcela muito elevada do crescimento do consumo é devida às despesas de uma parcela ínfima da população – menos de 1% - a qual detém uma desproporcionada fatia da riqueza do País.
E essa fatia dos mais ricos continua a gastar a mesma parcela dos seus rendimentos, ou mesmo uma parcela maior, por exemplo quando os juros sobem ou quando aumentam os preços dos combustíveis. E porquê?
Porque em qualquer caso o aumento anual da sua riqueza (valorização de activos + rendimentos) supera sempre esse aumento anual de consumo, deixando-os indiferentes às dificuldades do momento.
Só para dar um exemplo elucidativo, segundo cálculos divulgados recentemente pela UBS, no período de 1997 até 2001, 0,1% de americanos mais ricos viram os seus rendimentos aumentar tanto como 50% da população com rendimentos mais baixos (a metade mais pobre da população, em linguagem simples).
Ora segundo Kaipur, são os comportamentos dos mais ricos que explicam as grandes mutações na economia.
E os mais ricos são pouco ou nada sensíveis às medidas de política económica – como as subidas de juros, as variações cambiais – que são receitas que pressupõem a existência de “consumidores médios” ou de “aforradores médios”.
Essas médias são, segundo Kaipur, simples noções estatísticas sem substrato real nas plutonomias.
Os dados agregados do rendimento, do consumo e da poupança são quase inúteis como instrumento de análise económica, nessa perspectiva, muito pouco podem explicar quanto à evolução futura da economia por exemplo.
Sem querer alongar-me mais nesta apreciação, devo dizer que nas últimas semanas encontrei referências a esta teoria na imprensa especializada (F. Times e Economist), reconhecendo-lhe uma forte capacidade explicativa.
Última questão: será Portugal uma plutonomia?
Observando os indicadores mais recentes parece-me bem que, se ainda não somos uma plutonomia perfeita, para lá caminhamos muito rapidamente.
Em próximo POST explicarei porquê, este já vai longo.
13 comentários:
Não, ainda que obviamente possamos argumentar que sim.
A "plutonomia" é possível em países muito ricos e bastante assimétricos ao nível da distribuição de riqueza. USA e Rússia são claramente um exemplo. UK tem vindo a tornar-se num.
Em Portugal, apenas verificamos uma das condições necessárias. Somos assimétricos, mas a riqueza não está de tal forma concentrada que transforme esses pólos de concentração em centros impulsionadores (ou não) da economia.
Aguardo o post com expectativa!
Sim, sem dúvida.
Somos assimétricos e temos um pólo de concentração de riqueza "que continua a gastar a mesma parcela dos seus rendimentos, ou mesmo uma parcela maior, por exemplo quando os juros sobem ou quando aumentam os preços dos combustíveis".
Simplesmente, esse polo de concentração é o estado que alimenta os seus fornecedores (individuais e colectivos) independentemente das condições macroeconómicas internas (recebem de acordo com a conjuntura média europeia).
Caro Tonibler,
Reconhecendo e admirando a subtileza e argúcia de grande parte dos seus comentários, permita-me que lhe diga, desta vez: frio, meu Caro, muito frio.
Já todos sabemos que o Estado se apropria de quase 50% da riqueza produzida - por convenção medida anualmente -, mas não é por isso que, na minha opinião, a economia portuguesa se aproxima vertiginosamente do modelo de plutonomia de Kapur.
Nos últimos dois anos em especial, assistiu-se a uma mudança curiosa na resposta da economia às medidas de política que só a plutonomia é capaz de explicar - "penso eu de que...", para parafrasear P. Cardão.
Como prometido, em próximo POST tentarei explicar.
Caro Tavares Moreira,
Ficarei à espera. Estou muito curioso.
Caro TMoreira:
Ora aí está um tema original, muito oportuno e porventura muito explicativo da nossa realidade.
Sem dúvida que existe plutonomia em Portugal. Belmiro de Azevedo, Américo Amorim são exemplos d quê? Disrtibuição assimétrica da riqueza? Esperava algo mais bem fundamentado por parte de andrew moke.
Só para dar um exemplo temos uma empresa que representa cerca de dois por cento do PIB nacional. O que podemos chamar a isto?Ausência de plutonomia?
Espero debate neste post muito interessante.
Caro Pinho Cardão,
Espero com este POST ter reforçado a minha candidatura, para já em lista de espera, às famosas uvas "Cardão de Colares".
Caro André,
Muito interessantes esses comentários, sem dúvida.
Mas A. Amorim e B./P. Azevedo são apenas aquilo a que se pode chamar a "ponta do iceberg", a plutonomia portuguesa tem já raízes muito profundas que ganharam um vigor inesperado (?) nos últimos dois anos.
E que, curiosamente, disparates colossais como o da OTA, se for para diante, acabará por acentuar muitíssimo.
Como prometido, em (não disse no) próximo POST tratarei de novo este tema
Com todo o devido respeito e considerando que tudo o que possa dizer em relação a este assunto é bastante suspeito (visto que a minha formação académica não é nem em Economia, nem em Gestão e logo falta-me o "background"), concordo com o Andrew Moke. Sabem porquê?
Porque todos os exemplos, de países, referidos pelo Dr. TM (que refere Kaipur), traduzem-se (excepto a Rússia até recentemente)em Países de forte tradição política anglo-saxónica, nos quais o peso e a intervenção do Estado na economia é muito pequeno. Por isso também é que o Dr. TM refere «por oposição às principais economias da Europa Central» e dá como exemplo a França e a Alemanha.
As políticas da Europa Continental assentam, de um modo geral, na intervenção do Estado na actividade económica (tipo: Imaginem um jogo de futebol em que o Estado é árbito e jogador ao mesmo tempo), ou seja, é uma espécie de Estado-Pai, protector, que nos dá uma mesada se a "malta" estiver aflita (não importa se é muito ou se é pouco, nem aonde é que ele vai buscar o dinheiro).
Em Portugal há assimetrias, disso ninguém dúvida, não têm é as mesmas origens que as dos países referidos, nem têm as mesmas características porque bem, ou mal, quando é preciso lá está o Estado a assegurar qualquer coisa (até ver pelo menos). Agora, Plutonomia, no sentido em que eu acho que percebi a coisa, não me parece que exista (até porque se houvesse, quanto mais não seja também estávamos na lista).
Iremos ver, caro Antrax, iremos ver.
Prometi explicar e espero cumprir.
Quanto a figurarmos na lista, não o tinha por tão optimista...
Nós já não figuramos em qualquer lista - veja por exemplo a ultima reportagem do Economist sobre os 50 anos da UE e a ignorância quase total a que somos votados...
Não é que isso me preocupe ou angustie - é-me rigorosamente indiferente - mas é apenas para lhe dizer que não figurar na lista, neste caso, nada significa e não consente qualquer ilação.
Ficarei a aguardar então :)
Quanto às listas, bem... pelo menos há um representante nacional na FORBES, mesmo que seja num lugar pouco expressivo.
Boas, Dr.Tavares Moreira,
Sobre esse conceito, não sei responder, porque a nossa Economia já está contaminada.Bem o conhece.
Pedro Sérgio (Palmela)
Mas isso, caro Pedro, já o está desde o tempo do D. Afonso Henriques. Só na época dos Descobrimentos é que a coisa andou mais animada (vai-se lá saber porquê).
Caro Pedro Sergio,
Embora esse conceito genérico de "contaminação" da economia seja de interpretação um tanto obscura, vreio que percebo aonde quer chegar.
O que lhe posso dizer, nesse ponto, é que a "plutonomização" acelerada da economia nacional, que se tem verificado - na minha opinião com forte aceleração nos últimos anos - tornará essa contaminação totalmente incurável.
Pelo menos na nossa geração.
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