Acaba de ser divulgada informação da balança de pagamentos externos em 2006.
Verificamos que o défice das transacções correntes (medida das necessidades de financiamento externo da economia) subiu em relação ao valor registado em 2005 – passou de € 12.733 milhões para € 13.300 milhões, um agravamento de 4,5%, representando quase 9% do PIB.
Em relação a 2004, o tal ano da “horrível” gestão económica do governo presidido por Santana Lopes, o agravamento é apenas de 50%....O défice cifrou-se, nesse ano, em € 8.871 milhões.
É este um dos enigmas mais curiosos do desempenho actual da nossa economia.
Depois de um ano em que o marketing oficial, com a esmagadora colaboração de quase todos os media, nos vendeu a ideia de uma política financeira orientada para a contenção das despesas, para medidas estruturais que visam corrigir a viciada relação entre a oferta e a procura.
Depois de um ano em que o mesmo marketing oficial nos quis também convencer do grande sucesso das nossas exportações de bens e serviços, cuja evolução foi, deve reconhecer-se, bastante positiva.
Depois de tudo isto, que logicamente nos devia conduzir a uma significativa redução do défice externo, somos confrontados com este resultado final de agravamento do défice que contraria, de forma chocante, as expectativas criadas.
Parte da resposta a este enigma encontra-se no comportamento da rubrica Rendimentos, cujo défice, como há algum tempo aqui assinalei, continua a agravar-se fortemente.
Em 2006, o défice dos Rendimentos ascendeu a € 5.358 milhões, ou seja 3,5% do PIB, 40% acima do valor registado em 2005 (€ 3.830 milhões) e 83% acima do tal “anus horribilis” de 2004 (€ 2.922 milhões).
Como já expliquei noutra altura, este défice dos Rendimentos é a resultante do nosso endividamento externo que continua a aumentar velozmente, obrigando a economia a um esforço cada vez maior para servir a dívida externa.
Por este andar e tendo em conta as subidas de taxas de juro a que continuamos a assistir, este défice em 2007 pode muito bem ficar acima de 4% do PIB, passando a constituir talvez o nosso maior problema estrutural.
Se não for corrigida esta situação a breve prazo, restar-nos-á uma solução (aliás já em curso): vender todos os activos que puderem ser vendidos e depois, se mesmo assim continuarmos endividados...Vender a alma?
A esta luz, a opção por projectos como o da OTA, para além da sua fraqueza intrínseca, da sua má qualidade económica e estratégica, afigura-se clara e perigosamente contrária ao interesse nacional.
esta luz, a decantada teoria dos “centros de decisão nacional” não passa de uma elaboração quimérica...
8 comentários:
Mmmmm? Qual economia?
Nós também temos uma?
Achei estranha esta notícia, do Público, segundo a qual o nosso poder de compra terá aumentado em relação aos nossos parceiros comunitários(?).
Coloco aqui o link, na esperança de que seja comentada por quem será muito mais competente do que eu para o fazer. http://www.publico.clix.pt/shownews.asp?id=1286483&idCanal=63
Caro Antrax,
Posso pedir-lhe que leia bem o post e um comentário do seu "lado sério", aliás normalmente muito inteligente?
Caro Nuno,
Já ouviu falar de marketing oficial? Não me diga que ainda toma essas notícias como a expressão de outra coisa?!
Caro Tavares Moreira,
A questão da dívida, sendo obviamente importante, não acho problemática. Dinheiro custa 4 ou 5 ou 7% ao ano. Todos os nossos males deveriam ser esses.
O grande problema, na minha modestíssima opinião, está naquilo que fazemos com o dinheiro: Alocar recursos raros (Portugueses) a coisas sem importância (económica) nenhuma e isso vai reflectir-se no fim do dia nestes défices absurdos de "gente rica".
Há uns tempos tentei começar uma discussão lá no blogue sobre o verdadeiro custo de oportunidade do investimento público (certamente que o meu caro teria dado um contributo interessantíssimo). O grande erro continua a ser olhar para o investimento público como se fosse dinheiro a única coisa "alocada". Dinheiro é barato quando comparado com o valor do tempo de um português.
PS: Português tem aqui um sentido lato de pessoa que vive em Portugal e que contribui para a economia portuguesa.
Caro Tavares Moreira,
Com efeito, não duvido que se trata de marketing oficial. Não estou a imaginar como é que o nosso poder de compra pode ter aumentado com um crescimento económico claramente inferior à média e com uma taxa de inflação superior à média - sobretudo quando temos a mesma moeda que a maior parte dos grandes países europeus, o que torna impossível a existência de flutuações cambiais que nos sejam favoráveis.
Por isso, nem entendo bem o mecanismo associado ao indicador mencionado na notícia. Imagino que seja daqueles indicadores "à Coelhone", mas enfim...
Caro Tonibler,
A dívida´"só" é problemática, mas é problemática, porque reflecte todos os erros de opção política cometidos "a montante".
A dívida é o vazadouro onde vão parar os resíduos dos equívocos económicos que temos insistido em manter e nos quais vamos gloriosamente insistindo - veja-se o caso da formidável OTA.
Com a OTA, a dívida (pública ou privada é irrelevante) dará um grande salto e o défice dos Rendimentos agradece.
Nem parece que o meu Amigo tem preocupações como contribuinte quanto mais não seja. Eu tenho, sou-lhe franco.
Caro Tavares Moreira,
Para a dívida "só" vai uma pequena parte dos resíduos. A maior parte vai continuar armazenada sob a forma de trabalho inútil.
Eu não sei dizer isto em "economês", mas o maior custo da OTA, vai ser o empenho de recursos que poderiam gerar riqueza de outra forma, sendo que o dinheiro será o menor dos problemas.
Aliás, estou certo que o project finance da OTA revelará um sucesso financeiro, como diz o Mário Lino, até "vai dar dinheiro". Só que vou dar, além de dinheiro, um aeroporto que já tenho e tempo de gente que poderia fazer coisas que realmente preciso e que têm realmente valor. Aquele que é o real custo de oportunidade do investimento público.
A desmaterialização deste trabalho inútil para o reservatório da dívida só se vai fazendo ao longo dos anos quase de forma "imperceptível"(não é grande palavra para a dívida que temos, mas pronto). Se eu construir uma A1, exactamente ao lado da A1, e destruir a A1 que tenho, o project finance vai revelar um projecto de sucesso, o PIB vai subir nos anos de construção e destruição, o estado vai ganhar em impostos e a dívida para construção do projecto vai ser amortizada num prazo relativamente curto.
Só que a nação empenhou uma autoestrada que já tinha e o tempo de centenas de pessoas durante anos. E este custo não se vai recuperar nunca, embora a dívida (pública ou privada) se amortize rapidamente.
Está perceptível? Eu não sei dizer isto em "economês" mas fisicamente, é isto.
Caro Tonibler,
Na verdade, se não existisse essa estranha criatura chamada Dívida, os problemas a que o meu Amigo se refere, essas diabruras keynesianas que caricatura - e muito bem, acredite - seriam irrelevantes. Poderiam sempre ser pagas sem custo ou com obrigações islâmicas (sem juro).
O "diabo" é mesmo a tal dívida, que nos vai levar não duvide - já começou, em grande escala - todo o património mobiliário que for vendável.
E muito imobiliário, também, juridicamente agarrado ao mobiliário.
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