Convidado para participar numa conferência, abordei o tema do stresse laboral, porque no contexto em que vivemos e trabalhamos estamos sujeitos a pressões e a situações muito stressantes com consequências funestas. No dia aprazado, com auditório cheio, falei, dissertei e provoquei alguns dos presentes. A multidão ouvia-me com olhos de ouvir, o que me agradou, perspetivando que em muitas cabeças começava a fervilhar ideias e reações às minhas observações. Tentei explicar que o trabalho é a principal fonte de stresse e que os trabalhadores correm consequências nefastas quando expostos a exigências psicológicas elevadas, aliadas a reduzida capacidade de decisão e sem um adequado suporte social por parte das empresas.
A atual situação do país, e do mundo em geral, assim como as medidas que andam a ser tomadas, vão, invariavelmente, agredir os trabalhadores com consequências graves para a saúde e com astronómicos custos económicos.
No final decorreu um interessante debate. Um dos interlocutores, responsável por uma empresa de limpeza urbana, fez considerações sobre a vigilância e controlo do abuso de substâncias e de álcool aos trabalhadores. Informou que já tinha sido acordado com os mesmos e, até, com o sindicato no sentido de procederem ao planeado, mas que não conseguiram efetuar a implementação das medidas devido a não terem tido autorização da Comissão Nacional de Proteção dos Dados (CNPD), o que considerou ser um erro, uma atitude difícil de compreender. Fazia estes comentários mostrando uma certa indignação. Queria saber a minha opinião, na expectativa de concordância nestas matérias. Deve ter ficado surpreendido com a minha resposta, ao dizer que a CNPD - que só concordou com o controlo apenas para os motoristas -, tinha tomado uma decisão correta, já que as liberdades, direitos e garantias individuais sobrepõem-se a quaisquer outras medidas de caráter regulamentador mesmo que tenham como objetivo o bem-estar e a segurança das pessoas.A liberdade é o supremo bem de qualquer um e não pode ser posta em causa, mesmo que certas medidas tenham finalidades positivas como era o caso. Se enveredássemos por esses caminhos correríamos o risco de regulamentar e controlar tudo e mais qualquer coisa num crescendo que, mais tarde ou mais cedo, poderia acabar com tão precioso bem. As leis penais já contemplam o que fazer às pessoas que violem certas regras e que possam originar problemas a terceiros. Notei que não ficou muito convencido da minha argumentação, facto que levou um outro ouvinte a criticar a minha defesa das liberdades, direitos e garantias individuais que mais lhe fazia lembrar o Canal Parlamento. Tinha aspeto de ser empresário e não deverá ter ficado muito agradado com as causas atribuídas ao stresse laboral, talvez porque se revisse estar, também, na origem das mesmas. Retorqui-lhe na medida em que a apreciação, aparentemente negativa, sobre a equiparação ao Canal Parlamento constituía um elogio, porque o que se passa na Assembleia da República, o que tem de bom e o que tem de menos bom, e apesar dos defeitos e insuficiências atribuídas a muitos deputados, é a garantia de podermos estar naquele espaço a falar e a debater livremente. Presumo que o senhor não saberia que já tinha sido deputado, mas também não fiz alarde dessa experiência. O que me agradou, no final, foi ter sido interpelado por um participante, que, com sotaque estranho, me disse que era médico e cubano. Os olhos denotavam alegria e uma satisfação difícil de traduzir, mas, emocionado, agradeceu-me a forma como tinha abordado o assunto e dirimido a discussão, porque ele sabia o significado da liberdade que eu, ao defender com tanta ênfase, não fui capaz de sensibilizar alguns dos presentes. Disse-me o colega que atrás de um controlo vem outro e depois outro e mais outro e quando damos por ela já não somos livres. Vale a pena correr alguns riscos, mesmo para terceiros, do que enveredar por comportamentos que possam por em causa o supremo bem do homem, a liberdade. E nada melhor do que o contributo de alguém que sabe o que é viver sem liberdade....
2 comentários:
A liberdade é, de facto, o supremo bem do homem e da mulher. O que é de lamentar é que muitos usem e ab usem dessa liberdade, e que, em nome dela, tenham atitudes, acções e “liberdades” sem qualquer consideração pelo seu semelhante ou pelo seu próximo.
Liberdade faz-me recordar:
Epíteto: “Só as pessoas educadas são livres.”
George Bernard Shaw: “Liberdade significa responsabilidade e é por esta razão que tanta gente tem medo dela”.
Interessantíssimo tema caro Professor Massano Cardoso, e interessantíssima Conferência, sem dúvida.
Tenho pena de não ter assistido, para poder no final, "armado" em D. Juan Carlos, dizer àqueles dois empresários "porque no te callas?".
Estou obviamente a brincar. Estou certo que apesar de contraditórias, as opiniões dos discordantes empresários foram importantes, tanto que o caro Professor aqui as relata, assim como para eles terão sido as suas alegações, espero que profícuas também.
Em minha modesta opinião, a causa de tanto stress, tem origem nos métodos de produtividade adoptados ha algum tempo atrás. A competitividade e o estabelecimento de objectivos sempre num horizonte cada dia mais distante, ditaram um alienamento social, uma desconfiança e agrassividade, relativamente ao outro, que adulteraram a forma desejável de comportamento social.
Sempre achei e continuo convencido que a competitividade é importante na medida em que resulta em enovação, em melhoramento mas, se de uma forma consciente, adaptada à realidade da sociedade e do indivíduo. De outro modo, a competitividade, resulta em agressividade e em embrutecimento.
É necessário que, governo, empresários e trabalhadores, tomem consciência destes factos e que tracem novos rumos, menos agressivos, mais coerentes e sobretudo mais humanizados.
E... que se perca o terrível habito de ser como as ovelhas em rebanho que , quando soltas no pasto, correm à "maluca" de um lado para o outro, pisando a erva viçosa, sem a aproveitar convenientemente.
;)
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