Rezam as crónicas que o Ministro da Agricultura e Pescas, defrontado ontem com ruidosa manifestação de desagrado por parte de pescadores na lota de Matosinhos, se terá voltado para um dirigente sindical e afirmado “Se quiser, peça para sair da União Europeia”.
Tenho a clara noção de que a margem de manobra das autoridades nacionais em matéria de política agrícola e das pescas é actualmente muito reduzida.
Já é assim há muito, aliás: o melhor que os políticos nacionais podem fazer é conseguir à mesa das negociações, em Bruxelas, as melhores contrapartidas para os agricultores e pescadores portugueses, no âmbito da definição da política comum europeia.
A partir daí cabe-lhes executar, o melhor que puderem, a política definida em comum.
Acresce que a vigilância exercida pela máquina de Bruxelas à execução da política é muito apertada e que qualquer desvio à aplicação das regras comuns é objecto de um processo de infracções, com sanções normalmente pesadas.
Portugal teve dois excelentes negociadores, no quadro europeu: os ex-Ministros Álvaro Barreto e Sevinate Pinto, sem menosprezo para o grande trabalho de outros como o Dr. Arlindo Cunha.
Mas há partidos políticos em Portugal que continuam a discutir este tema como se não existisse política agrícola e das pescas comum: é tipicamente o caso do PCP, que parece ignorar a nova realidade e insistir num discurso nacionalista - sem qualquer sentido na actualidade - só para manter os seus apoiantes em estado de insatisfação permanente.
Compreendo, nesta perspectiva, que perante as demonstrações de desagrado e as exigências desprovidas de realismo dos dirigentes sindicais, o Ministro da Agricultura se tenha sentido à beira da impaciência.
Mas já não me parece curial que tenha respondido aos protestos com que se viu defrontado com o comentário “ Se quiser peça para sair...”.
Ao responder dessa maneira, o Ministro demonstra não ter “fair-play” para situações destas, em que é exigido grande sangue frio.
Ele sabe perfeitamente que a resposta que deu não tem sentido, é um desafio gratuito, só pode ser tomada à conta de piada de mau gosto, legitimando que a outra parte lhe responda, à letra, “porque não sai o Senhor do Governo?”.
E convenhamos que é mais fácil o Ministro deixar o Governo que o sindicalista sair da União Europeia...
6 comentários:
Ouvi hoje, na rádio, o diálogo entre o ministro e o sindicalista.
Percebo que um ministro tenha de ter sangue frio, mas deve ser exasperante não poder dizer na cara do sindicalista aquilo que ele merecia ouvir.
Primeiro o disclaimer:
Quanto à União Europeia estou mais próximo das ideias de Pacheco Pereira do que do mainstream; quanto ao governo de Portugal, apesar de PSL, não contribuí para a maioria parlamentar que o suporta.
O sindicalista fala, por exemplo, do envelhecimento das embarcações. Será que a pesca é um actividade nacionalizada?
Será que os barcos pertencem ao Estado?
Será que os barcos não têm dono?
Será que a pesca não tem empresários?
Será que a pesca moderna se compadece com uma gestão à antiga, uma gestão por cabotagem?
Na indústria, e numa economia decente, quem não evolui, quem não se aperfeiçoa deve sair!!!
Os clientes decidem, não os ministros e burocratas.
Se calhar, os subsídios da UE o que fazem é atrasar a saída do mercado de quem já devia ter saído, dificultando o acesso de gente nova (de ideias e métodos de gestão).
Pois eu acho que a atitude pateta do ministro revela bem a atitude dos portugueses face à europa. Temos que fazer o que os senhores querem ou então temos que sair, como se nós não fossemos a união europeia e não decidissemos o que a união europeia é ou deixa de ser, sem que com isso nos digam para sair!
Antes de nós saía a Polónia que acabou de entrar...
Caro CCzed,
As suas observações são pertinentes, em linha de princípio.
Os nossos vizinhos espanhois, por exemplo, parece que se adaptaram muito melhor à política comum de pescas, compraram muitas das nossas melhores embarcações e as suas capturas não terão diminuído assim tanto, se é que diminuíram...
Admito que nem todas as dificuldades, no entanto, sejam imputáveis aos agentes económicos, talvez o facto de as pescas serem o parente pobre da política tenha contribuído para as quebras acentuadas nas capturas.
Caro Virus, não esqueça que a Bulgária e a Roménia entraram ainda mais tarde, há seis meses apenas...
Caro Tonibler, estamos de acordo que a reacção do Ministro não foi sensata, embora em parte desculpável pelo calor da disputa verbal em que se deixou envolver.
Chamar-lhe-ia patética e não propriamente pateta...
Caro Tavares Moreira,
não é pela questão da antiguidade tanto como é pela questão da "vontade" de integração europeia demonstrada pela Polónia nos últimos tempos!
A sua dimensão não pode ser justificação para todas as atitudes que têm vindo a ter.
Os espanhóis estão onde estão porque os governos se empenharam nisso. Os nossos governos foram negligentes, por isso as queixas (desde sempre) dos pescadores. E quem fala das pescas, fala da agricultura e mesmo da indústria.
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