No colóquio “Fiscalidade e Competitividade”, que teve lugar na Assembleia da República no passado dia 12 de Junho, a primeira intervenção esteve a cargo do Comissário Europeu para os Assuntos Fiscais e Aduaneiros, o húngaro László Kovács.
Esperava-se que não defraudasse as expectativas: afinal, não é todos os dias que um Comissário Europeu vem ao nosso país!… E a verdade é que, ao contrário do que costuma acontecer com “actores de Bruxelas”, Kovács foi bastante assertivo, tendo referido, preto no branco, que a concorrência fiscal é vista, também pela Comissão Europeia, como um instrumento fundamental para promover a concorrência e um ambiente mais favorável à actividade económica no seio da União Europeia.
Ou seja: não é intenção da Comissão avançar com qualquer proposta de harmonização de taxas em qualquer imposto que seja. No máximo, será proposta uma harmonização ao nível do método de cálculo da base tributável das empresas – o que, de resto, mesmo sendo muito mais suave do que a harmonização das taxas de impostos e aplicando-se apenas ao IRC, acho muito duvidoso que possa ir por diante. Porquê? Porque as decisões fiscais no seio da União Europeia têm que ser tomadas por unanimidade. E creio que alguns países – os mais competitivos em matéria fiscal, como a Irlanda, o Reino Unido, a Eslováquia ou a Estónia, entre outros – nunca tal permitirão. Acrescento eu: ainda bem. Se qualquer proposta de harmonização fiscal avançar, por mais suave que seja, diminuirá a concorrência no espaço europeu. Penalizando, em particular, pequenos países periféricos como Portugal, que têm (ou poderiam ter, no nosso caso…) no instrumento fiscal um aspecto diferenciador positivo na concorrência, quer com países mais centrais na Europa, quer com os grandes países – que, por força da sua dimensão, têm massa crítica própria e não precisam, digamos assim, de ser tão competitivos na atractividade de investimento como países mais pequenos.
Boas notícias, portanto. Assim os países interessados saibam agir, nesta matéria, da forma mais conveniente… para eles próprios.
E, para tanto, não é preciso “inventar a roda”.
Basta observar a tendência dominante a nível internacional. Que, resumidamente, é simplificar o sistema fiscal e, ao mesmo tempo, baixar as taxas dos principais impostos (IRC, IRS e IVA). De forma a minimizar (eventuais) perdas de receita que, de facto, não dão jeito nenhum em termos orçamentais – mas que, como se verá no próximo post, não devem ser avançadas como desculpa para nada fazer. Na Europa, depois da Irlanda, têm sido os países de leste que têm vindo a dar cartas, com os pequenos Estados Bálticos e a Eslováquia à cabeça – mas a tendência já se alargou aos países mais ocidentais, como a Holanda, a Finlândia, a Áustria, ou até os “grandes” Alemanha, França e Espanha. Destaco, em particular, a França, onde o recém-eleito Presidente Sarkozy prometeu – e já está a cumprir – um “choque fiscal” para tornar o país mais competitivo e alcançar um crescimento de 3% ao ano (ou muito me engano, ou de tradicionalmente conservadora, creio que a França, com Sarkozy, assumirá um papel de liderança reformista na Europa – e ainda bem!...).
E nós?... Infelizmente, como tem sido diferente a realidade neste domínio em Portugal!... Nem inovadores, nem sequer seguidores. Um zero absoluto. O que, claro, tem ajudado para a desoladora e frustrante realidade económica que se conhece.
8 comentários:
Só quero ver o que é que o Estado vai fazer quando acabar de trinchar o peito da galinha e reparar que afinal os ovos de ouro se acabaram!
Provavelmente vai dar um choque fiscal numa parede de betão... e o resultado não vai ser bonito!
"Bem pregam o Miguel Frasquilho e o Pinho Cardão, mas ninguém os ouve, o marketing oficial é infinitamente mais poderoso..."
Cito Tavares Moreira, no seu "post" de hoje ( A Alemanha de vento em popa) porque daquela afirmação se deduz que o marketing político obnubila o discernimento e andamos (quase) todos a reboque da fé oficial.
Que me perdoe o Amigo Tavares Moreira mas, pela parte que me toca, acho que há exagero da sua parte.
A propósito destas questões fiscais coloquei comentários aos posts de Pinho Cardão e Miguel Frasquilho, não porque não bata palmas com ambas as mãos às suas propostas de redução dos impostos (mas quem é que não bate?) mas porque não há redução de impostos que não seja suportada: 1) por redução da despesa 2) por aumento déficit 3) por crescimento económico.
Presumo que, de tão elementar, o que disse até agora nem é novo nem merece contestação.
Vamos então por partes:
Por aumento déficit - Suponho que concordam que não é possível. E não apenas porque Bruxelas o imponha. Suponho também que concordam que nem é possível nem desejável, porque aumentaria o desaforo com que nos defrontamos em matéria de contas públicas.
Pelo crescimento económico - Pode, mas não pode antes dele acontecer de forma sustentada. O que ainda não acontece.
Resta a redução da despesa - Foi, a propósito desta hipótese que julgo consensual, que disse no comentário ao "post" do Pinho Cardão: Sendo a maior fatia da despesa, as despesas com pessoal, há que reduzir estas. O Pinho Cardão respondeu que há muito por onde reduzir e, afinal, as despesas com pessoal não contam assim tanto. Miguel Frasquilho parece ter opinião diferente (as despesas com pessoal representam em Portugal 13% do PIB contra 10% na média europeia).
Pinho Cardão e Miguel Frasquilho devem, salvo melhor opinião, consensualizar os números com que lidam e as suas propostas. Para que não prevaleça o marketing político.
Vamos então, finalmente, à sugestão de Miguel Frasquilho: reduzir o pessoal com rescisões amigáveis, recorrendo ao aumento da dívida pública.
Aliás, este foi o mesmo remédio avançado para o financiamento do déficit intercalar que resultaria da passagem do sistema de segurança social actual para o de semi-capitalização.
Vejo um risco enorme: Aumenta-se a dívida, com reflexos incalculáveis sobre os encargos da dívida no futuro (ainda estamos em período de juros baixos)e não temos nenhuma garantia que um qualquer governo no futuro não venha a aumentar os efectivos da função pública para os níveis actuais ou superiores mesmo.
Salvo o devido respeito pela muito maior experiência que têm destas questões, as vossas convicções agradam-me mas não me convencem.
Ainda hoje o Público dá conta de um estudo (na realidade uma tese de doutoramento) que conclui pela diferença abissal entre o número (elevadíssimo) de funcionários da Câmara de Lisboa (e do Porto, etc. em Portugal) e o número de habitantes em Barcelona, Madrid, e várias outras cidades europeias.
Sabemos que a produtividade da DGCI medida pelo número de funcionários e os impostos arrecadados é, de longe, a mais baixa da Europa (mais baixa que no Brasil, até).
Sabemos que temos o maior número de tribunais por habitante, o maior número de juízes por habitante, o maior número de funcionários judiciais por habitante,
Sabemos que temos um dos mais elevados rácios de despesa com a defesa relativamente ao PIB
Sabemos que temos milhares de funcionários no Ministério da Agricultura e eu quero ter algum apoio técnico (nunca lhes pedi um tostão que fosse, nem vou pedir) e não encontro ninguém nas minhas redondezas.
Sabemos que a nossa despesa com a educação relativamente ao PIB é sensivelmente idêntica à média europeia e os nossos professores em fim de carreira têm vencimentos que excedem em 30% dos da Europa
Etc. etc. etc.
Acham, ainda assim, que resolvemos as nossas ineficiências e insolvências municipais, as nossas montanhas nos tribunais, os nossos excedentes de almirantes e generais, a inexplicável multidão de agrónomos que não estão nos campos mas nas cidades, sobretudo em Lisboa, as debilidades do nosso ensino, etc. etc?
Reduzam-se os impostos, e eu ganharei, pessoalmente, com isso.
E prometo que não vou a Cancun passar umas férias com o crédito.
O que farão, no entanto, milhões de compatriotas nossos com um alívio fiscal? Há alguma tendência que garanta que uma redução fiscal determine um crescimento do consumo com reflexos sobre a produção nacional?
O que os inquéritos à opinião pública têm demonstrado é que os portugueses valorizam pouco a redução fiscal. Há muita anestesia que os leva a muita insensibilidade.
Por outro lado não está demonstrado que o investimento se afaste de nós por razões fiscais. Há algum projecto de real interesse que tenha, por razões fiscais, procurado outras paragens?
Ficaria muito satisfeito se estivesse errado.
Então e as contribuições sociais (SS)?
Façamos um exemplo duma PME no sector da indústria:
Volume de negócios – 1.000.000€
Custos – 950.000€ da qual 40% é mão-de-obra
Lucro – 50.000€
IRC (25%) = 12.500€
SS (34,5%) = 380.000*34,5% = 131.100€
13% do volume de negócios foi para contribuições sociais.
No dia a dia das empresas deste país esta é a realidade dos números. A competitividade de grande parte das empresas está relacionada com as prestações sociais e código de trabalho (os dois temas estão obviamente relacionados). Agora mais ou menos 5% de IRC….
"O que os inquéritos à opinião pública têm demonstrado é que os portugueses valorizam pouco a redução fiscal."
Onde são feitos esses inquéritos?
Se formos perguntar aos funcionários da Câmara de Lisboa, se estão de acordo com uma baixa nos impostos, vão equacionar: menos impostos --> menos receita --> menos receita, menos dinheiro para salários ---> menos dinheiro para salários, mais desemprego ou menos aumentos salariais. Logo, "não, não estou de acordo!!!"
Se formos perguntar aos funcionários da Administração Pública... se formos perguntar aos funcionários das Universídades, Escolas, Institutos, Câmaras, ... o raciocínio é o mesmo, logo, "não, não estou de acordo!!!"
Se formos perguntar aos reformados se estão de acordo com uma baixa de impostos... menos dinheiro --> menos dinheiro para pensões... logo,...
Enquanto não se falar verdade, viveremos na ilusão de que o sistema é, será um dia, sustentável, até que a brutal realidade consiga rebentar com os diques do politicamente correcto e dinamite o status quo podre em que vamos definhando.
Repararam na noticia de um dos jornais recentes, em Viseu há corporações de bombeiros que deixaram de funcionar por falta de voluntários. Não, não é baixa na capacidade de altruismo das pessoas, as pessoas tiveram de emigrar...
Enquanto os políticos perdem o tempo em jogos de retórica e de ilusionismo, as pessoas votam cada vez mais com os pés... ainda hoje recebi um e-mail de alguém que está a acabar o curso de enfermagem e que me pede referências sobre a vida em Dublin pois está a pensar em emigrar... um aluno de uma pós-graduação que me pediu para ser o seu tutor, na preparação do trabalho final, comunicou-me que vai desistir do trabalho pois vai trabalhar para o Luxemburgo...
Caro Rui F,
A) já pensou também que se calhar o problema da DGCI ter o rácio mais baixo da Europa (e do Brasil) não terá forçosamente que ver com a fraca prestação profissional, mas sim com a elevada quantidade de pessoal que está alocado à DGCI para a quantidade de impostos a arrecadar?
B) já pensou que o o problema não é o de ter o maior nº de tribunais por habitante, e etc e tal, talvez seja o de ter o maior nº de processos por habitante da Europa (sei lá... tipo... aquele gajo chamou-me nomes vou meter um processo,...tipo...aquele gajo diz que eu não sou Engº e eu tenho um diploma - ora lá vai mais um processo). Isto não é um problema de recursos, é um problema de mentalidade mesquinha e mentecapta;
C) toda e qualquer redução fiscal que leve a um aumento do rendimento disponível para os agentes económicos irá forçosamente ser aplicado pelos mesmos em três coisas Poupança, Consumo e Investimento. A menos que os agentes económicos abram todos contas nos estrangeiro e vão fazer as suas compras a Badajoz ou a Ourense esse rendimento disponível irá forçosamente ser aplicado em Portugal, o que por seu lado gera movimento na economia e tem como consequência mais consumo (de bens e serviços) o que vai ser igual ao crescimento económico de que tanto se fala! Não é com o Estado a consumir recursos À economia que o crescimento económico acontece... isso só aparece se a economia tiver espaço para se desenvolver!
Terrível Vírus!
"não terá forçosamente que ver com a fraca prestação profissional, mas sim com a elevada quantidade de pessoal que está alocado à DGCI"
Não é a mesma coisa?
"talvez seja o de ter o maior nº de processos por habitante da Europa"
Não é não senhor. Antes, pelo contrário, muita gente, muita empresa, não recorre à Justiça porque sabe que ela não será feita em tempo útil. Há, no entanto milhares e milhares de processos de cobrança de dívidas que deveriam ser processados de modo muito diferente. Já foi referido por muita gente, mas continua praticamente tudo na mesma.
"toda e qualquer redução fiscal que leve a um aumento do rendimento disponível para os agentes económicos irá forçosamente ser aplicado pelos mesmos em três coisas Poupança, Consumo e Investimento"
Temos uma balança comercial altamente deficitária. Maior disponibilidade de rendimento aumentaria o déficit, ou não?
Grande Rui F,
aqui posso dizer que:
A) Não é exactamente a mesma coisa. Estamos a fazer o trabalho de 10 pessoas com 20, e isso gera desperdicio de recursos.
B) Estamos de acordo aqui... Não parece mas estamos... o que quis dizer foi tão simplesmente que o sistema judicial (Tribunais) gasta demasiados recursos a tratar de assuntos pouco graves e que poderiam ser tratados noutra instâncias. Mas é a velha máxima (a aplicar brevemente pelo Ministro das Finanças no caso da dupla tributação dos automóveis) enquanto o pau vai e volta folgam as costas e quem vem atrá que feche a porta!
C) O que contribui de forma mais significativa para o déficit é o crescente montante da Despesa Publica, não é o consumo privado, antes fosse, era sinal que pelo menos havia emprego e produzia-se alguma coisa (por produzir não me refiro apenas a bens, refiro-me também a serviços), e para quem adquira os produtos há sempre alguém que tem de os proporcionar, logo mais trabalho, mais dinheiro a circular, etc. e tal.
Terrível Vírus,
a)Pois gera. Estamos a dizer a mesma coisa, insisto. Até parecemos os velhos dos Marretas. Eu já estou nessa. Mas suspeito que para si é prematuro.
b)Idem, aspas
c) Depende de quem gasta o quê, e de onde. Em princípio, o consumo privado está a fazer crescer as importações sem excitar a produção interna; o que tem minorado o problema tem sido o aumento das exportações.
Mas volto a insistir: Também voto a favor da redução do número e das taxas dos impostos. Só tenho (muitas) dúvidas é da exequibilidade da proposta.
Enviar um comentário