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quinta-feira, 24 de julho de 2008

Que investimento público?

"Mas será esta a única discussão que queremos fazer, sobre as obras públicas, a do debate financeiro? Evidentemente que não. Foi por causa da obsessão "tem de se pagar a si mesma" que a virtuosa Expo 98 degenerou no ladrilhado Parque das Nações. Todos são santos e pecadores na tese financeira. Do PSD, que analisa o tema num microscópio, ao Governo, que adiciona variáveis na equação para tornar “sustentável” o que é “inviável”.
(…)
O País não vai recuperar o dinheiro investido nestas obras. O Governo tem a obrigação de deixar isso claro e, depois, de explicar porque ainda assim as faz. É para isso que se elegem políticos em vez de analistas financeiros, para tratar do País. A economia não é apenas finanças”

As palavras são retiradas do editorial do Jornal de Negócios (JdN) e têm a assinatura do seu director, Pedro Santos Guerreiro. O editorial é uma síntese interpretiva do que o JdN publica hoje em parceira com a Antena 1: os resultados de uma investigação, baseada em alguma da informação disponível sobre o programa de investimento público lançado pelo Governo. Os títulos escolhidos pelo JdN são, por si só, significativos: “Nem TGV nem novas estradas de Sócrates são rentáveis”; “TGV e estradas sem retorno”; “Estradas: Governo garante que portagens cobrem rendas”; “TGV só é rentável com mais 3 milhões de passageiros”; “Projecto (do TGV) não é lucrativo mas pode ser sustentável”.
O tema do “programão” das obras públicas – como aqui o baptizou Tavares Moreira – tem sido abordado no 4R nalgumas das perspectivas de análise adoptadas no JdN de hoje. É um debate que se impõe que se aprofunde. Decerto na perspectiva da utilidade e rendibilidade de cada projecto de per si. Mas tendo como pano de fundo o modelo de desenvolvimento que queremos para o País. Só assim será possível saber-se se projectos com utilidade marginal decrescente, como é manifestamente o caso das estradas e autoestradas, fazem sentido numa óptica de desenvolvimento regional apoiado, exigência da coesão nacional se não pretendermos reduzir cada vez mais o País ao litoral. Ou se, conjunturas à parte, os benefícios indirectos dos projectos (ambientais, sociais ou outras) que o Governo contabiliza – quando contabiliza – sem se perceber de que premissas quantitativas parte, justificam o ónus que se está hoje a lançar sobre as gerações futuras. Ou, mais prosaicamente, se muitas das obras não são, afinal, tiques de um País que se quer dar ares de rico, sacrificando o investimento por exemplo num melhor funcionamento da Justiça, de cujo salutar funcionamento e eficiência depende em boa parte a competitividade, ao encurtamento das distâncias-tempo quando não parece ser este em Portugal, 2008, o factor crítico do desenvolvimento.
Nós, por aqui, não partilhamos a opinião de que o País só perde com estas discussões. Que o que importa é decidir, bem ou mal. Não nos incomoda que o que estava consolidado há uns anos atrás seja hoje posto em causa. Ao invés, esta dinâmica parece-nos essencial para o acerto das decisões. E não deve incomodar quem, tendo de decidir, não se queira tornar surdo ou autista. Pelo contrário, deve servir de estímulo. O exemplo do abandono do aeroporto da Ota está aí para o demonstrar. Até o Governo, sem o dizer, aceita que se evitou um erro quando pela discussão se obrigou a estudar alternativas. Seria impossível reparar esse erro se se mantivesse surdo.

Por isso decidiu o 4R contribuir para esta reflexão, ainda que na modéstia do que pode, abrindo este espaço ao aprofundamento do debate. Assim, nos próximos meses aqui publicaremos, sem prejuízo de outras iniciativas, o depoimento de algumas personalidades de mérito reconhecido, naturalmente aberto ao comentário de quem nos vem acompanhando.

7 comentários:

Tonibler disse...

Por acaso, até acho que o país só perde com estas discussões. Não porque ache que os "investimentos" estão certos. Não estão, não servem para nada senão pagar favores a financiadores partidários.
No entanto, depois da discussão de anos sobre um novo aeroporto que não serve para nada, este passou da OTa para Alcochete tendo o país perdido a guerra na mesma, com a diferença que metade dos oponentes passaram agora a festejar uma vitória que não existiu. Resultado final? Mera perda de tempo.

Enquanto quem elege não entender que se eu construir uma A1, ao lado da que já existe, e destruir a que já existe, esta estupidez será sempre paga e dará lucro ao estado. Mas um enorme prejuízo ao país...

Carlos Monteiro disse...

Eu tão pouco acho que o País queira discutir a fundo o assunto do ordenamento do território, dos transportes e afins, caro Ferreira de Almeida.

O Governo propôs há dois anos atrás o debate público do Plano Nacional da Política de Ordenamento do Território. Seria um documento que nos iria definir como país. Qual foi o resultado prático da participação da "sociedade civil" nessa oportunidade de debater um documento tão importante? Zero.

Há oportunidade que se perdem, caro Ferreira de Almeida. Duvido que a sua proposta colha mais entusiasmo junto de cada cidadão do que a anterior, por muito meritória que seja. E é.

Num tempo em que está na moda a responsabilidade individual, se calhar até é injusto aqui, atribuirmos todas as culpas ao governo pela falta de debate.

Anónimo disse...

Apesar do tom dos vossos comentários, meus caros Tonibler e cmonteiro, estou certo que poderemos contar com os contributos de ambos para animar o debate.

Unknown disse...

"o ónus que se está hoje a lançar sobre as gerações futuras"
Até concordo consigo, mas sei que em Lamego, onde é Presidente da Assembleia Municipal, uma trapalhada de empresas municipais, parcerias mirabolantes com empresas privadas, despesismo compulsivo, vai deixar os munícipes a tinir por muitas gerações. Vejam-se as contas e entenda-se que bem prega Frei JM Ferreira de Almeida.

Anónimo disse...

É sempre uma grande satisfação perceber a atenção que em Lamego se dispensa a este blogue. Sem falsa modéstia, posso assegurar que se já são proveitosas as leituras feitas, se por aqui continuarem a aparecer estou certo que ainda mais aprenderão com as pregações no 4R ;)

Ruben Correia disse...

Caro Tonibler, não foi apenas mera perda de tempo. Foram 200 milhões em "compensações", que vão ser despejados aqui no Oeste, que tanta falta fazem a estes pobres autarcas (ler isto em tom irónico...) E o povão alarve aplaude, sim senhora que se fez justiça pela promessa desfeita, que nós merecemos investimentos (sejam lá quais forem). E eu pergunto-me: e os transmontanos foram compensados? ou os beirões e alentejanos? É que esses também nunca tiveram nenhum aeroporto planeado (nem sequer a especulação imobiliária pré-construção do dito puderam aproveitar, para "desenvolver" a sua região).
Mas num país em que um autarca prefere mudar de região (LVT para Leiria) porque assim podem receber mais fundos europeus, dado o PIB per capita ser inferior, nada é de estranhar...

Anónimo disse...

Apoiado, Ruben!