Mais um cidadão de Odemira faleceu após 4 horas de espera por ajuda médica numa situação que, tanto quanto se diz, era de emergência.
Não sei se - como ouvi de um dos responsáveis pela gestão da emergência médica - a pessoa acabaria por morrer ainda que vivesse em Lisboa e fosse rapidamente assistida. O que sei, perante dois casos em que cidadãos faleceram depois de aguardarem por assistência adequada que objectivamente não chegou a tempo, é que não é mais possível ao Governo, e em especial ao senhor Ministro da Saúde, ignorar que estes são sinais preocupantes que devem fazer repensar a política traçada e levada à prática, para uns com coragem, para outros com irracional teimosia.
Não ouvi até agora ninguém recordá-lo, mas é importante não perder de vista que a política de encerramento de estabelecimentos de saúde, o abandono do programa de localização de novos hospitais nas cidades do interior, o fecho de maternidades, bem como a reestruturação das urgências que tem sido levada a cabo e que atinge sobretudo essas terras menos relevantes na geografia eleitoral, tem sempre como fundamento, no discurso do senhor Ministro, o facto de termos hoje um país onde o tempo para percorrer as distâncias se encurtou, mercê da melhoria das infraestruturas rodoviárias.
Ora, apesar de não ser esta uma verdade absoluta uma vez que o senhor Ministro sabe bem quantas horas demora a percorrer 100 km nalgumas paragens do interior transmontano ou da beira interior, o argumento torna então mais graves e preocupantes os casos de Odemira. Porque, para além da ausência de qualquer condições de assistência para casos graves naquele concelho, poderão ter-se perdido duas vidas exactamente porque o tempo para vencer a distância não se revelou suficiente, nem é, a qualquer luz, razoável num país do primeiro mundo.
Serão suficientes estes casos (que, não sendo certamente os únicos, foram os mais mediatizados) para convencer o Governo de que a sua política está errada? Oxalá.
2 comentários:
Caro Ferreira de Almeida
As suas observações são mais do que pertinentes. Viver num interior isolado, com uma população envelhecida e, naturalmente, cada vez mais carenciada de cuidados médicos, obriga a repensar muito em termos de serviço nacional de saúde.
Para mim, e não obstante as “recomendações” técnicas, os interesses dos cidadãos estão em primeiro lugar. Adoro o interior do país. Viver no interior e estar ligado ao mundo é um privilégio indiscutível. Mas é preciso manter e desenvolver apoios e condições para os fixar. A saúde é uma delas.
O senhor ministro da saúde usa, abusa e assenta as suas decisões em “recomendações” técnicas. Mas sabemos, porque não somos estúpidos, que o que está em “primeiro lugar” ou melhor em “primeiríssimo lugar” são os euros! Claro que vai afirmar que não. Mas há alguém que acredita na sua bondade? Se analisarmos as atitudes tomadas ultimamente, tudo aponta para isso. Nem vale a pena enunciar o que já fez e, sobretudo, o que já disse. E diz cada uma! Chegou a afirmar que ninguém estaria a mais de quarenta minutos de um serviço de urgência de excelência! Nota-se! Depois, a arrogância com que foca cada um dos problemas é perturbador. A um político não basta ser conhecedor, determinado e competente. Também tem de ser humilde, o que não é o seu caso.
Podemos ter pouco meios, é um facto, mas com arte e engenho é possível cobrir todo o território com o mínimo de eficiência e de qualidade, porque face à lei todos os cidadãos têm os mesmos direitos. O que é certo, a prática demonstra-o, é que em Portugal começam a surgir cidadãos de segunda e de terceira categoria.
Não tenho dúvidas de que um “enfartezito” do miocárdio num ministro ou secretário de estado, para aquelas bandas, ou uma traulitada no toutiço, seria razão mais do que eficiente para melhorar a assistência…
Caro José Mário,
Partilho totalmente da sua análise e estou totalmente de acordo com a abordagem feita pelo Professor Massano Cardoso.
A política da saúde pública tem que ser capaz de disponibilizar os meios necessários - em cada momento - para que sejam assegurados às pessoas os cuidados de que necessitam e não sofram e morram por falta de assistência.
O autismo das "racionalidades" sistematicamente invocadas para fechar unidades de saúde, para cortar aqui e ali, e a teimosia ideológica em manter a saúde pública estatizada estão a conduzir o sistema nacional de saúde ao colapso.
Ou alguém ainda tem dúvidas?
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