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sexta-feira, 4 de setembro de 2009

Sócrates e TVI - a inesperada factura por um erro clamoroso

Sou dos que nunca apreciaram o tipo do chamado jornalismo praticado na TVI no telejornal das sextas-feiras. O que trouxe de novo em relação ao formato habitual dos telejornais representa tudo o que sempre achei condenável na comunicação social: exploração sem limites de factos da vida privada e absoluto desprezo pela intimidade, perseguição, julgamentos na praça pública, preconceito, parcialidade. Sempre que tive estômago para aturar a protagonista e o comentador dos jornais das sextas-feiras na TVI, foi para mim óbvio que o espectáculo montado sob o pretexto da informação e os comentários que iam sendo feitos, para lá do detestável estilo, assentavam numa confrangedora ignorância. Excepção feita a um ou outro trabalho de investigação jornalística que por lá desfilou. Nos últimos tempos, antes de intervalar para férias, servia-me do comando da TV para afastar a náusea.
Não lamento, pois, a decisão de acabar com a coisa. Discordo que o fim do jornal das sextas seja um atentado à liberdade - acho exactamente o contrário. Nem consigo ser hipócrita, dizendo que o produto era mau mas a altura para acabar com ele não é a adequada. O lixo, quanto mais depressa for removido, melhor.
.
Dito isto, não sei se o fim de um dos espaços mediáticos mais incómodos para Sócrates e para o PS, teve ou não a interferência do PM ou do partido. Ou se a pressão foi directa ou por interposta influência de partido irmão filiado na mesma Internacional, cuja ligação ao grupo espanhol que domina a Media Capital é conhecida. Do que eu não tenho dúvidas é que José Sócrates e o PS vão ser fortemente penalizados por algo que - também não tenho dúvidas - há muito tempo ardentemente desejavam. Mesmo que nenhuma interferência tivessem tido, não pode esquecer-se o que Sócrates foi proclamando inflamadamente em entrevistas, no congresso do PS, no Parlamento ou em comícios, sobre telejornal das sextas-feiras na TVI. Estou aliás certo de que José Sócrates estará hoje bem ciente do clamoroso erro político que constituiu o excesso das suas reacções, no passado, contra a TVI. Por isso, ainda que ponha o Doutor Santos Silva a exigir explicações da PRISA ou que jure de joelhos que nada teve a ver com o assunto, a realidade é que poucos serão os que confiarão nesses protestos.
Até porque, tratando-se de Sócrates, é impossível evitar que muitos se lembrem da fábula do "Menino e o Lobo".

13 comentários:

Misugi disse...

Pois..
" á mulher de César não basta ser séria...tem de parece-lo !
e seriedade é "coisa" que não parece haver neste caso !

Suzana Toscano disse...

"servia-me do comando da TV para afastar a náusea" ou seja, escolhia livremente.

Tonibler disse...

E, por falar na senhora do Júlio, isto tudo é tão conveniente ao PSD e tão juntinho ao apoio do sempre patriota Pina Moura, que me faz recordar uma conversa sobre como os partidos são todos iguais e sobre projectos diferentes....

jotaC disse...

Concordo que o jornal em apreço era um pouco exagerado, confundindo muitas vezes a função do jornalista…
Mas o que transparece deste episódio, considerando a forma abrupta como o mesmo foi suspenso, é uma “arteirice” que provocou um tiro no próprio pé. É acaso para dizer: o Engº Sócrates tem poucos mas bons amigos!

Margarida Corrêa de Aguiar disse...

José Mário
Interessante a declaração de Manuela Moura Guedes na anunciada entrevista hoje publicada na revista notícias TV: "Afastarem-me do ecrã? Só se fossem estúpidos".
Acabo de ouvir que a Peça do Freeport vai para o ar esta noite.
O caso está mesmo muito confuso.

Carlos Monteiro disse...

Cara Suzana Toscano,

Por essa perspectiva, nem sei porque nos preocupamos com códigos deontológicos, obrigatórios por lei, se o argumento é sempre o da livre escolha. E se um dia não pudermos escolher porque estão todos iguais (ou já estão!) o comando também tem um botão Off.

Não. Não me parece que seja assim. Ora conceda lá que o grau civilizacional de um país mede-se também pela forma como se faz jornalismo. Aconselho uma ida ao Canadá, ou à Austrália.

Anónimo disse...

Também acho. A liberdade índividual é o último reduto, e era o que faltava se nos fosse subtraído o direito de escolha. Mas pelo facto de optar por viver longe da poluição, não me é indiferente a sua existência.

Félix Esménio disse...

Estou de acordo, no essencial, com a substância do post, mas tenho uma curiosidade:
E o que pensa do jornalismo da RTP, designadamente do alinhamento das notícias, dos tempos do Governo versus Partidos da oposição, das entrevistas à medida dos membros do Governo, designadamente do Primeiro-Ministro? Na televisão paga por todos nós há isenção e pluralismo?
Ontem à noite, no alinhamento da RTPN a primeira notícia não era o fim do Jornal Nacional da TVI mas o depoimento do Primeiro-ministro sobre o assunto.
Todos os factos devem ser avaliados em perspectiva e não isoladamente.
Aliás, este Governo descontente com a linha editorial das televisões privadas, até determinado momento, ainda ensaiou o licenciamento de um 5.º canal de sinal aberto. Como quem diz: ou amocham ou vão à falência.
Num país em que o respeitinho é muito bonito, em que a vassalagem ao poder é avassaladora, em que o medo de represálias entorpece a denúncia pública do favorecimento e da corrupção, o Jornal Nacional quase parecia, passe o exagero, o último bastião de defesa da liberdade de comunicação. A forma era má, péssima talvez, mas a substância das denúncias convidava à reflexão ou mesmo à indignação.
São poucas as vozes com coragem para dizer que “o rei vai nú”. A nudez do rei não passa, para muitos dos seus súbditos aferrolhados ao poder, de um manto diáfano de virtudes que realça a erecta majestade do soberano maximus.
Por isso, acabar com o Jornal Nacional no actual momento político foi, objectivamente, um acto insuportável de censura.
E, caro cmonteiro, acima do código deontológico dos jornalistas está a lei e a Constituição. O poder instalado pode sempre reagir. Os pobres dos cidadãos - principalmente os mais desamparados - é que têm de comer e calar, pelo menos entre sufrágios eleitorais.
Prefiro viver numa sociedade mais aberta, com alguns abusos censuráveis, do que viver asfixiado pela censura dos que mais podem.
Infelizmente, em Portugal, as entidades reguladoras independentes revelam uma fraca capacidade de regulação e uma isenção que se subjaz à intendência.

Anónimo disse...

Ok...
Certo...
Estou pasmada...

No que respeita ao post, confesso que não faço juízo de valores sobre a qualidade do alinhamento e conteúdos do referido telejornal. Quem gosta, gosta. Quem não gosta, muda de canal, por isso é que existe TV cabo e mesmo que não existisse, sempre existiriam outros três canais de opção.

Em termos de gestão, os motivos para se terminar com um programa cuja taxa de audiência era grande, parecem-me no mínimo imbecis (a não ser que o excelso novo administrador tenha tirado um curso nas Novas Oportunidades).

Assim, a minha opinião vai na mesma linha da do Félix Esménio, com a diferença que aquilo que ele designa por "respeitinho bonito" eu designo por subserviência cega (e é porque estou bem disposta), ajoelhar e beijar o anel ao padrinho... enfim, há pessoas assim. Há pessoas cuja posição favorita é mesmo andar de joelhos, depois há outras que nem por isso.

Anónimo disse...

Meu caro Félix Esménio,
O mote do post era o decretado fim do jornal da TVI e as suas possíveis consequências. Higiénicas e políticas.
Mas não hesito em dizer-lhe o que penso do jornalismo da RTP, concordando na essência com o que opinou. Aliás, repetindo o que aqui no 4R foi dito e redito ao longo destes anos, no sentido de que a televisão do Estado não se preocupa em disfarçar a sua falta de neutralidade nem o carácter venerando e obrigado com que lida com o poder.
Com a agravante de a RTP ser sustentada fundamentalmente por recursos públicos em retribuição de uma coisa que se designou de "serviço público" e que ainda hoje não alcanço o que é, admitindo nesta parte ser problema meu. Vejo até mais programação de interesse público (que não de interesse geral) em canais privados, do que na RTP. E muito menos vejo a presença do serviço público nos espaços informativos.
Por estas e outras razões, sou um daqueles que, tendo até certa altura entendido que era útil manter uma televisão nas mãos do Estado, tem hoje muitas dúvidas sobre a bondade dessa solução.

PA disse...

O Poder político ... já era !

Quem manda é quem paga ....

Nos ... e aos media !

Suzana Toscano disse...

Caro cmonteiro, desculpe o atraso na resposta, só hoje é que reparei. Vejo pouca televisão e seleccciono o que quero ver, e faço muita questãod e ser eu a seleccionar e não quem concorda ou não com os programas. Quanto ao grau civilizacional, discordo em absoluto que ele seja "escondido" pela supressão dos programas que o demonstram ou não, era só oque faltava que alguém iluminado pudesse vir dizer o que é que é digno ou indigno do tal grau civilizacional. E lamento que ignore o grau de audiências, tal como também há muita gente que gosta do Big Brother ou dos Morangos com açúcar ou de milhentos outros programas que não me interessam nada ou que critico mesmo muito.Mas o grau de civilização mede-se precisamente pela capacidade de seleccionarmos, cada um,o que consideramos ou não digno de ser visto. O resto,se houver injúrias, insinuações ou ofensas à honra e dignidade das pessoas, então há os tribunais. E, já agora, o que pensaria se passassem a suprimir sites na net ou acessos a canais de outros países, tudo em nome de graus civilizacionais?

Carlos Monteiro disse...

Cara Suzana,

A liberdade de escolha não é solução para tudo. Saber escolher o grau civilizacional que desejamos é seleccionar aquilo que é «civilizado». É delicado, mas a virtude consiste precisamente em fazer essa escolha. Isso da liberdade individual é um refúgio de quem nao concordando, até achava que o Jornal de Sexta era bom só porque «chateava» o Sócrates, só que não tem a coragem de o referir, porque a falta de qualidade é óbvia.

E esta é a verdade neste caso, Cara Suzana. Perdoe a frontalidade, mas já sabe como sou... :)