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quinta-feira, 4 de maio de 2006

Para onde vamos?

Vale a pena divulgar o que a Irlanda conseguiu, em matéria de reforma da despesa pública, e nos imensos benefícios que a sua economia retirou dessa corajosa e lúcida opção política assumida na segunda metade dos anos 80.
Recordo que a Irlanda, hoje apontada como um caso notável e invejável de sucesso na sua gestão macroeconómica, se encontrava há cerca de 20 anos numa situação algo semelhante àquela em que nos encontramos hoje em Portugal: (i) economia deprimida; (ii) desemprego a crescer, próximo dos dois dígitos; (iii) inflação muito elevada; (iv) défices orçamentais crescentes e aparentemente incontroláveis, (v) dívida pública acima de 100% do PIB.
Após um primeiro período de contenção iniciado em 1983, a Irlanda adoptou em 1987 um Programa de Recuperação Nacional, cujo elemento central consistiu numa profunda reforma da despesa pública.
Esta reforma teve um efeito espectacular.
Em 3 anos, 87-89, a despesa pública primária (despesa total sem juros) em % do PIB diminuiu 11%, quando comparada com o máximo de 41,6% que havia atingido em 1982.
A despesa pública total baixaria 15,6% do PIB, entre um máximo de 49,8% em 1982 para 34,2% em 2004.
Esta reforma da despesa pública na Irlanda combinou medidas de consolidação orçamental “stricto senso” e medidas de carácter estrutural.
Do lado da consolidação “stricto senso”, registou-se uma significativa redução do consumo público, em resultado de restrições ao crescimento dos salários e de uma grande redução de efectivos na função pública. Só entre 1982 e 1989 os efectivos diminuíram 14%.
A estas medidas adicionaram-se importantes reformas que permitiram uma apreciável redução nas despesas com transferências do Estado e nos subsídios. Estes últimos terão baixado cerca de 2/3 só em 1988.
Outras reformas tornaram possível uma diminuição considerável das despesas da segurança social e com a saúde publica. Foram apertados os critérios de acesso aos benefícios da segurança social e o valor dos benefícios foi congelado em termos reais.
Em consequência deste conjunto de medidas, a criação de emprego foi fortemente incentivada, o crescimento económico acelerou e permitiu que a prazo relativamente curto começasse a emergir um excedente orçamental o qual, por sua vez, facilitou uma significativa redução de impostos e da dívida pública.
A redução da carga fiscal viria a constituir um incentivo poderoso ao investimento, nomeadamente estrangeiro, e a economia irlandesa não mais parou de crescer, sempre muito acima da média da U.E. e depois da zona euro.
O PIB cresceu 5% em 2005 e este ano deverão apresentar idêntico resultado…
A entrada no euro foi para eles de uma enorme simplicidade, tendo até aumentado os superavits orçamentais.
Este exemplo irlandês vem citado com destaque, em “caixa”, num interessantíssimo artigo publicado no último Boletim Mensal do BCE (Abril/2006), páginas 61 a 73, cuja leitura se recomenda (www.ecb.int / Publications /Monthly Bulletin).
À especial atenção de Tonibler e de Anthrax, que aí poderão encontrar resposta eloquente para as suas dúvidas quanto à (in)eficácia da despesa pública no caso português (com particular interesse o 3º parágrafo, “Linkages between public expenditure, economic growth and fiscal sustainability”).
Aí se pode também constatar que Portugal foi o País da EU em que a despesa pública mais cresceu entre 1960 e 2004: passamos de 14,7% para 46,5% do PIB, uma variação de +31,8 p.p.
Para o mesmo período, o crescimento médio da despesa nos países do euro foi de 17,3 p.p.
Será muito difícil realizar em Portugal, nesta altura, uma reforma de tipo semelhante à que a Irlanda promoveu há quase 20 anos?
Certamente que é muito difícil, seria ingenuidade ou má fé pensar ou admitir o contrário.
Mas haverá outra solução para o problema económico português que não seja muitíssimo difícil?

15 comentários:

Anónimo disse...

Eloquente este exemplo Irlandês. A receita parece simples e clara. O problema estará porventura no detentor da faca que corta. Tal como na justiça grega, os cortes cegos de alguns algozes (com aspecto de juízes imparciais ou de virgens pudicas – esta última foi um bocado forçada!), tanto atingem os infractores como os inocentes. E, por vezes, são estes últimos as principais vítimas. Talvez por serem menos hábeis, por opção ou vocação, para o esquema paralelo ou subterrâneo. E a questão do objecto e critério de corte pode fazer toda a diferença. Primeiro porque é preciso acreditar, razoavelmente, nas virtualidades do esforço colectivo para se atingirem níveis de bem-estar mais consentâneos com os padrões dos nossos parceiros europeus (a isto poderemos chamar espírito nacional). Depois, porque as pessoas estão cansadas e desiludidas com as acentuadas assimetrias do esforço e do respectivo retorno (a isto poderemos chamar fado nacional).
Por exemplo, como se justifica a prosperidade da Banca, da EDP, da PT, da GALP, e outras empresas de serviços ou bens “públicos” básicos, em tempos de estagnação económica? Será que o Estado está cumprir bem o seu papel regulador?
Por outro, serão os mega-investimentos em obras públicas – TGV, OTA, etc. – uma condição essencial ou necessária ao desenvolvimento socioeconómico nacional?

O investimento na “construção” de empreendedores, desde o ensino básico ao superior, parece-me ser a solução de longo prazo – o objectivo: gerar empresas mais competitivas e capazes de se afirmarem no mercado global. Cabe também aqui a criação de melhores condições nacionais para atrair novos investidores, nacionais e estrangeiros.

Aparte: Aqui, concordo em grande medida, pasmem-se, com o Tonibler (nos raros momentos em que não professa o caos!). Não vale a pena o Estado fazer mal aquilo que, em muitos sectores, os privados fazem melhor. O que importa é garantir, com os menores custos possíveis, melhores níveis de satisfação por parte dos clientes. Pagar impostos ou contribuições para sustentar a máquina improdutiva do Estado, não, definitivamente não!

A solução de curto prazo, estou de acordo, passa por cortar nas despesas de funcionamento do Estado, designadamente através da introdução de padrões mais exigentes de gestão e, concomitantemente, da generalização do princípio do utilizador-pagador, embora de forma mitigada e sem esquecer a solidariedade relativamente aos mais desprotegidos. Mas a eficácia desta solução depende, em grande medida, da credibilidade dos políticos que nos governam e, é aqui, que começa o ciclo vicioso.
Quero acreditar, no entanto, que com bons exemplos, como o que deu (valeria a pena ser desenvolvido ou dar outros), será possível começarmos a construir um ciclo virtuoso. Mas, o capital de esperança está cada vez mais na reserva.

Desculpem a absurda extensão deste comentário.

Anthrax disse...

Viva a IE! :) Assim que puder volto lá outra vez.

Tirando isso, Dr. TM, não pense que sou contra a redução da despesa. Não sou. Sou é contra os "assassínos psicóticos" com uma faca na mão e contra a falta de medidas que promovam a iniciativa privada.

O que é que me interessa criar uma empresa na hora (o que nem sequer é verdade porque já fui verificar), se depois tudo o resto não funciona? O que é que interessa pedir um livro de reclamações pela internet, se depois está-se 3 meses à espera que ele seja enviado, acabando por ser mais rápido ir buscá-lo à INCM. Quais são os benefícios de ter uma empresa registada em Portugal, se é preferível ir registá-la à Holanda ou a Bélgica onde as condições são melhores?

As pequenas e médias empresas, são absolutamente massacradas em Portugal. Os profissionais liberais, são absolutamente massacrados em Portugal, é que não só não têm direito a nada, como ainda têm de pagar uma brutalidade de impostos. Só alguém que frequente a CERCIS é que gostaria de ser freelance aqui.

Querem um sector privado como deve de ser, fantástico, «moi aussi». Podem começar por lhes dar as mesmas condições fiscais e os mesmos privilégios que dão aos bancos por exemplo. É que parece ser um boa política, pois as empresas públicas e os bancos são os únicos que, mesmo em tempo de crise, têm resultados fantásticos.

A IE é um bom exemplo sim senhor. Quem me dera que tivessem seguido o seu exemplo. O problema, é que Portugal está cheio de Portugueses e isso é dramático.

Anthrax disse...

Pasmem todos.

Também estou de acordo com o Félix! :O

Então isto quer dizer que eu e o Tóni andamos a dizer, mais ou menos, as mesmas coisas de maneiras diferentes?... Puxa, somos mesmo criativos.

cardealdealpedrinha disse...

Muitos parabens Dr.Tavares Moreira pelo Seu excelente artigo e já agora muito obrigado pelos ensinamentos prestados a um ignorante como eu.
Um abraço

Carlos Sério disse...

Mas quem acredita que esta mesma classe politica que se cobriu de privilégios ao longo destes últimos 30 anos e que nos conduziu a este caos económico, a este beco, seja capaz de alterar o que quer que seja que não seja o aumento dos impostos e a perda de regalias e direitos adquiridos?
É fácil apontar caminhos, todos os dias os nossos economistas o fazem, mas iniciar reformas e dar o exemplo é uma outra coisa. Porque razão já não se extinguem os governadores civis? E o estudo sobre os salários e reformas do Banco de Portugal que se iniciou à mais de um ano para quando as conclusões? Para quando a reforma da Assembleia que reduza para metade o numero de deputados?
Para quando a extinção dos Institutos paralelos aos serviços do estado? Para quando a extinção das empresas municipais com funções paralelas aos serviços das próprias câmaras? Para quando a extinção de Comissões, ógãos, conselhos,gabinetes, centros, etc,perfeitamente inuteis muitos deles?

Tonibler disse...

Caro T. Moreira,

Eu esperei, mais ou menos, pela parte da Irlanda para entender a sua ideia de para onde vamos.

Reduzir o fenómeno Irlandês às questões de corte de despesa é, no mínimo, redutor. A geração de emprego passou, por exemplo, pela "venda" de impostos pela isenção de impostos. Não há chafarica de banco na Europa que não tenha o seu "Irish branch" por onde passa os negócios mais lucrativos. Passou pelo lobby americano para sediar tudo quanto é empresa americana na Europa em Dublin. Houve de tudo um pouco.
Não tiveram um governo Cavaco a enterrar tudo o que havia em Auto Estradas! (esta não podia perdoar!)

Mas no geral, não há coisa mais contraproducente que "economia comparada". Os irlandeses fizeram-no porque são irlandeses! São feios, sardentos, burros e muita outra coisa que não os faz portugueses. Até estranhei, ao ler os comentários, que não houvesse um exemplo finlandês ou norueguês para demonstrar exactamente o contrário.

Eles são eles e nós somos nós. Somos muito melhores que eles em tudo, pelo menos nós continuamos juntos a nós e não a eles. Deve haver uma razão muito forte.

Tudo isto para dizer que discordo profundamente da sua visão de para onde vamos. Quer dizer, se não fôr feito nada, concordamos em tudo. Na acção é que não.

A Dra. M F Leite congelou salários e os custos com pessoal no estado subiram 4.5% quando o PIB caiu 1%. Porque faltava agir sobre a lei. Mas não podia porque ninguém agiu sobre a constituição. Mesmo que o fizesse, como ninguém agiu sobre a justiça, os funcionários públicos bloqueavam qualquer acção que se tomasse. Falta fazer tudo para que um corte na despesa vá reduzir, de facto, a despesa.

O nosso problema está no valor que a sociedade recebe em troca dos impostos que depende apenas de sermos como somos. Os Irlandeses dão pouco e recebem pouco; os Finlandeses dão muito e recebem muito e nós ainda não conseguimos achar a medida certa. Porque tudo o que é reforma importante está por fazer e vai continuar por fazer por décadas, porque não se manda os advogados todos para o lixo (salvo seja, camarada JMFA), os professores todos às urtigas, as universidades todas à mer...

Claro que começar hoje é melhor que começar amanhã e bom era que tivéssemos começado anteontem. Agora, os países tem mecanismos automáticos de ajuste da despesa ao valor que ela gera. Chama-se política monetária, que é exactamente aquilo que deixámos de ter. Começar amanhã vai salvar-nos de dar vivas a Leonor, Rainha da Grande Espanha? De os meus filhos virem de Barcelona a Lisboa no Verão ter com o pai, para a Festa do Emigrante? Não me parece.

Anthrax disse...

Ontem estive a ouvir o Prof. J.C. Neves e fiquei muito contente porque afinal não sou a única pessoa a falar em «bolos».

Também fiquei contente, porque já percebi a ideia do corte das despesas públicas (e inclusivé, também já percebi porque é que tive uma boa nota na cadeira dele. A resposta é fácil, ele fala de uma maneira que eu percebo). No entanto, discordei quando disse que o «bolo» estava a crescer, mas isso é porque eu ainda não vi nada.

Estou contente, demorei só duas semanas para perceber esta coisa :)

Tavares Moreira disse...

Registo, com simpatia, os diversos comentários que o texto do exemplo Irlanda suscitou.
O interesse que este tema desperta mostra que existe uma aguda consciência do problema que nos aflige, um certo consenso em torno do diagnóstico, mas também uma enorme confusão acerca de qual poderá ou deverá ser a solução para esse problema.
Por curiosa coincidência, ouvi ontem ao fim da tarde, numa sessão promovida pela Faculdade de Ciências Económicas e Empresariais da Universidade Católica, uma magnífica palestra do Professor António Borges, de mais de uma hora, sobre o problema económico português.
Tenho pena que os ilustres comentadores deste blog, especialmente os mais assíduos – e permitam-me aqui, sem desprimor para os restantes, uma referência especial para Anthrax e Tonibler – não tenham podido assistir a essa palestra. Creio que lhes teria sido extremamente proveitosa para a elucidação do tema que aqui nos tem ocupado.
Nessa palestra, o Prof. AB referiu-se ao défice grave de compreensão do problema económico português.
Diz ele, e bem na minha modesta opinião, que a opinião pública portuguesa está profundamente “baralhada” sobre o que deverá ser a solução para os nossos problemas.
Acrescentou que as pessoas têm em geral consciência de que as coisas não vão bem e de que é preciso fazer alguma coisa para que este estado de coisas seja radicalmente alterado.
Todavia, quando se passa ao capítulo da receita para a ultrapassagem do problema, diz o Prof. AB, a confusão é enorme e não falta quem – será provavelmente a maioria das opiniões audíveis – apresente como solução medidas que inevitavelmente contribuem para o agravamento do problema e, quiçá, para a sua definitiva insolubilidade.
Falemos francamente.
Ainda há dias citei aqui um articulista do Diário Económico, que opina com regularidade nesse importante órgão de comunicação especializado, a propor como solução que nos deixemos de preocupar com o défice orçamental.
Dizia ele, com aparente convicção, que, se todas as dificuldades por que estamos a passar têm a sua origem na necessidade de conter o défice orçamental, por que motivo insistimos num défice de 3% e, em vez disso, deixamos o défice ser de 5 ou 6%? Para que havemos de nos flagelar, cortar na despesa aqui e acolá, sem solução à vista, “agravando” o nosso problema económico?
Pasmei, acreditem, ao ler aquele texto, perguntando-me como é que é possível, depois de tanto tempo, haver ainda opiniões (supostamente) responsáveis, que apresentem propostas com tal nível de insensatez?
Então o articulista não entende que a solução por si propugnada significaria, muito simplesmente um aumento em flecha do endividamento do Estado, a redução drástica do “rating” da Republica Portuguesa com o consequente – e brutal, a partir de certo momento – agravamento dos custos de financiamento, o desaparecimento do (já precário) investimento estrangeiro e também nacional, o agravamento acelerado da perda de competitividade, o afundamento definitivo da economia, o desemprego a subir em flecha, etc,etc?
Como é que o articulista pensa que se financia o défice do Estado? Através de subscrições porta a porta? De instituições de solidariedade ou de caridade?
Mas o problema está em que o cidadão comum lê, e até é capaz de concordar com a ideia. E, enquanto for assim, daqui não saímos.
Perdem-me a extensão do comentário.
Voltarei a este ponto em próximo texto, se não me levarem a mal.
Para terminar, uma palavra de simpatia para os comentadores Félix Esménio

Tavares Moreira disse...

Peço deculpa, mas ficou truncada, na palavra final de simpatia, uma referência ao comentador Ruy e ao Ilustre Cardeal de Alpedrinha (D. Jorge ou D.Jaime?) que saudo com respeito.

Anthrax disse...

Oooohh... Por acaso tenho saudades da UCP, mesmo que não tenha nada a ver com a parte das Ciências Económicas e Empresariais (eu é mais IEP, que fica em frente mas é mais pequeno). De qualquer maneira, tenho a intenção de regressar aos meus estudos académicos assim que tiver disponibilidade (o que pode demorar algum tempo, ou não. Olhem, se me despedirem no fim do ano, vou torrar o subsídio de desemprego p'rá Católica).

Ok, mas tirando este pequeno detalhe, o Prof. AB tem toda a razão. A OP anda toda baralhada e não só. Tudo anda baralhado e ninguém se entende, o que é perfeitamente natural dado o contexto. Só que a OP pode andar baralhada, mas os políticos não. E mesmo que andem, não o podem dizer, nem o podem demonstrar.

Carlos Sério disse...

É do conhecimento público, que no período de 1995 a 2001, se registaram cerca de 120.000 ingressos na Função Pública. De 600.000 funcionários em 1995 chegou-se ao ano de 2001 com um efectivo total de 720.000. Um aumento de 20% portanto em número de funcionários, o que acarretaria em princípio, um aumento da massa salarial da Função Pública dos mesmos 20%. Só que, o salário médio destas novas entradas foi superior à média salarial dos restantes 600.000. A maioria destas aquisições destinaram-se sobretudo a preencher os quadros dos novos Institutos do Estado que então proliferaram como cogumelos.
Múltiplos serviços paralelos a serviços até então existentes na Função Publica, foram assim criados. Onde existia um director com um vencimento de 500 contos, passou a figurar um presidente, acompanhado de mais quatro ou cinco administradores, com salários superiores a 1500 contos cada, cartão de crédito, carro , motorista, e demais mordomias.
Instalados em edifícios modernos, com novos equipamentos, numa acumulação de despesas completamente irreflectida e sem sentido. Tudo somado, creio bem, que o custo total subiu a pelo menos 25% da massa salarial da Função Pública ou seja 3,75% do PIB.
O Défice Crónico Anual, herdado desde 2001, é portanto equivalente a 3,75% do Produto Interno Bruto.

Uma questão poderá colocar-se agora.
Será que, chegados a 2001, a Justiça, a Saúde, a Educação, a Segurança e todos os outros serviços prestados pelo Estado, melhoraram na mesma proporção de 25%? A resposta é inequivocamente não. Se não existiu uma maior degradação dos serviços, e muitos afirmarão que sim, seguramente que não se sentiram quaisquer melhorias.
Torna-se assim evidente, que a medida urgente, lógica e necessária a tomar, seria a extinção de todos os Institutos nascidos desde 1994, devolvendo à função pública todos os serviços neles prestados. Haveria seguramente o sacrifício de alguns, mas não será mais penoso fazer recair sobre todos, sobre a economia nacional, o custo destes Institutos absolutamente inúteis?

Mas será apenas má gestão, e os nossos governantes serão apenas incompetentes, ao promoverem a criação de Institutos tão ineficazes ?
Creio bem que não. Existe uma lógica de interesses na motivação da criação destes organismos e ela reside na necessidade de alimentar com cargos bem remunerados uma clientela partidária e familiar de uma classe política que de há longos anos detém o poder. É que já não bastam os lugares das empresas públicas. A lógica não é procurar gestores competentes e melhorar o funcionamento do Estado, mas tão só colocar camaradas, companheiros e amigos(estes cargos são todos de nomeação política) nos lugares bem remunerados. Acresce que estes Institutos, não estão sujeitos à apertada legislação jurídica de aquisição de bens e serviços ou empreitadas da função pública, o que abre assim caminho a uma total falta de transparência e a uma potencial corrupção na sua gestão.

Mas se os nossos sucessivos governantes, souberam tão bem engendrar um processo que lhes permite satisfazer tão principescamente as suas clientelas, porque razão não haveriam os políticos autarcas de usufruir dos mesmos "direitos"? Com a mesma lógica tem-se assistido nestes últimos anos à proliferação de empresas municipais. Esvaziando serviços municipais e criando serviços paralelos. Também aqui, com os administradores recrutados politicamente, com o mesmo despesismo, igual má gestão e a mesma inutilidade.
Urge de igual modo a extinção de todas estas empresas municipais.
Mas vejamos a questão de um outro ângulo. Se a todos estes administradores dos Institutos, das Empresas Municipais e Fundações, juntarmos os administradores e gestores das Empresas Públicas, com privilégios escandalosos antes e depois das suas curtas comissões de serviço, nós compreenderemos a extensão da grave crise que o País atravessa.
Dezenas de milhares de privilegiados, cujo número aumenta de ano para ano, têm vindo assim a esbanjar em benefício próprio, ao longo dos anos, a parca riqueza produzida pelos cidadãos deste País. Paralelamente à proliferação dos Institutos e Empresas Municipais uma outra situação se torna insustentável. Os privilégios particulares, as condições especiais, salariais e de reforma de políticos, gestores e administradores públicos, são inaceitáveis.
Como se compreende que Victor Constâncio,por exemplo,usufrua o dobro do vencimento que o seu homólogo Greenspan presidente da toda poderosa Reserva norte-americana(in Expresso, suplemento de economia de 25/06/05)?
A população portuguesa, que vem sofrendo pacientemente nos últimos anos com a chamada crise do défice, e que não é outra coisa senão o resultado da delapidação do erário público por uma vasta élite de poder, merece que lhe seja dita a verdade e que não continue a ser ludibriada por uma casta política egoísta e sem valores.
Governantes de boa fé, eliminariam em primeiro lugar todas as situações excepcionais e especiais relativas a salários e reformas de gestores de Empresas Publicas e outros órgãos do Estado, não permitindo os escandalosos vencimentos e reformas que hoje se praticam nem tão pouco as mordomias de que beneficiam. Só estes procedimentos, sem o peso deste monstruoso lastro do Défice Crónico Anual, levariam o País a sair da crise e à sua verdadeira emancipação e desenvolvimento.
Mas quem poderá acreditar que a nossa classe política abdique voluntariamente dos privilégios que tão bem soube erguer ao longo dos anos?

Tavares Moreira disse...

Tem Ruy toda a razão, pondo o dedo na ferida, direi mesmo na chaga que consome, impiedosamente, os escassos recursos do País. É indispensável que comentadores como A. Borges e outras vozes respeitadas comecem a usar um discurso de dedo mais apontado, para que se perceba melhor o custo brutal que a classe política representa, enxameando tudo quanto é instituto publico, empresa publica ou semi-publica ou entidade publica empresarial com agora se diz, empresa municipal ou inter-municipal, etc.
Se não houver coragem para por termo a estes fenómenos dos últimos 10 anos, que derretem os escassos recursos do País em despesas em grande parte inúteis, não tenhamos ilusões: a crise está para ficar.

Anónimo disse...
Este comentário foi removido por um gestor do blogue.
Anónimo disse...

Antes do almoço, depois do que li, não resisti a mais esta pequena provocação:

Caro Tonibler (c/c ao Anthrax)

Devo-lhe um público pedido de desculpas. Penso que tenho sido injusto.
Com o seu último comentário compreendi, finalmente, que afinal o caos não é o seu método de análise mas sim o seu objecto de estudo.
Quando eu era pequeno, a minha mãe, na brincadeira, dizia: «- O Homem é pó, vem do pó e vai para o pó». Ao que eu concluía: «- Logo o Homem é pó, pó, pó».
Porventura terá sido esta história que me fez discernir, com a ajuda do seu comentário claro está, o brilhantismo da sua abordagem sistémica: Portugal vive no caos, vem do caos e caminha para o caos. Logo Portugal é caótico (não dá para brincar com os sons). É a loucura total. Estarei certo ou errado?
Persiste em mim, porém, uma dúvida metódica: Será esta abordagem do Tonibler um silogismo (inferência mediata - ou raciocínio lógico - constituída por três proposições – duas premissas e uma conclusão) ou antes um axioma (uma proposição cuja validade se admite sem demonstração ou uma afirmação que não carece de ser demonstrada).
Contei as proposições e pareceu-me serem quatro.
Logo, não sei porquê, inclinei-me para a hipótese do axioma.

Aparte: Este comentário pretende ser uma homenagem, caro Tonibler, ao seu gosto pela matemática.

Espero estar redimido. :))

Caro Ruy
É muito verdade aquilo que diz, é muito verdade. Mas devemos ser criteriosos na crítica. Não meter tudo no mesmo saco. Quando não, parece ser apenas um discurso de bota-abaixo. E, pelo que tenho lido, esta imagem não parece fazer justiça à essência das suas opiniões.

Anthrax disse...

Ó amigo Félix, não me faça isso... Não me comece a falar em silogismos, axiomas, proposições e afins que eu começo a entusiasmar-me e depois é uma gaita. Vamos lá mudar de assunto...

Se bem que... sabe meu caro amigo, eu não sou muito dado a axiomas, acredito que sejam, temporariamente, necessários por uma questão de conveniência, mas nunca devem ser tomados por algo absoluto.