Depois do jantar devo, por motivos de saúde, dar uma pequena volta a fim de contrariar a maldita hiperglicemia filha de genes defeituosos que, em tempos, foram determinantes para a evolução humana, mas que atualmente só servem para chatear. É interessante analisar que aquilo que ontem foi útil hoje se transformou num grave problema de saúde pública. Antes permitiam que os portadores aguentassem as agruras da fome, sobrevivendo mais facilmente do que os não portadores, agora dão-lhes para matar. Sacanas! Mas, pensando bem, os meus malditos genes defeituosos, que me obrigam a fazer dieta, medicação e exercício, empurram-me para a tal voltita. E eu obedeço, com agrado, porque assim esbarro na livraria-café, precisamente a uma hora em que há pouca gente ou mesmo nenhuma, entre as 9 e as 10 horas. Foi o que aconteceu hoje. Como estava muito frio tive de puxar a gola do sobretudo. Questiono-me sobre a razão ou razões que me levam a gostar do frio. Arranjo facilmente uma desculpa, tranquiliza-me. Às tantas a razão da tranquilidade não é devida ao frio, talvez seja uma coincidência. De qualquer modo, senti que estava a saborear um raro momento em que deixei de vislumbrar a linha do horizonte dos problemas. Tenho de aproveitar, pensei. Vou comprar um livro, às tantas mais um para a montanha dos que esperam ser lidos, mas não faz mal, dá-me prazer, o que é suficiente. Romance, filosofia, crónica, história, ensaio, autor nacional, estrangeiro? Deixei-me ir. Já tinha passado por ele, no domingo. Tirei o livro do escaparate. Compra ultrarrápida, porque queria ainda tomar qualquer coisa e sentar-me numa das mesas antes que o estabelecimento encerrasse. O título foi o responsável pela rápida compra, “O lugar do morto”. Será que tudo o que diga morte ou coisa parecida me atrai? Já não digo nada! De qualquer modo, não me arrependo. Sentei-me. O jovem empregado, com tiques aristocráticos, vendo-me, trouxe um descafeinado com adoçante. Já sabe que àquela hora não tomo café. Retribui-lhe o gesto deferente com simpatia.
Aprecio a escrita de Agualusa. Uma escrita doce, suave, que me faz flutuar com prazer em ondas de frases simples, elegantes e ricas de sentimentos. Estava perante uma coletânea de crónicas “psicografadas” de muitas entidades. Todos mortos, logo, boas pessoas. Graças ao facto de habitarem no além, podem dizer o que lhes passa pelas etéreas cabeças sem ser importunados.
A primeira crónica, “Os portugueses não gostam de asas”, é de Eça de Queirós. Diz o espírito do escritor, que está no céu, pelo menos é íntimo de São Pedro e viu, de braço dado, Saramago e Miguel de Vasconcelos: - “Hoje debruço-me sobre Portugal de uma varanda mais vasta – a Eternidade – e de novo me aflige o desdouro. Não que Portugal esteja pior do que há cem anos; está todavia mais pequeno. Já nem é bem um país – é um resumo”. Comenta que todos os países erram e nós não somos exceção, só que antigamente “errávamos com grandeza e originalidade”, “hoje erramos em ponto pequeno, e ainda por cima por imitação”.
Não se pode dar asas a um português como fez São Pedro, ao fim da tarde, quando viu entrar uma alma sem maldade. Era português, mas protestou quando o porteiro do céu lhas entregou, perguntando o que é que iria fazer com elas. A resposta não tardou: - “Ora filho, voa!” Aterrorizado, o português devolveu as asas, dizendo-lhe: - “Se eu vim para aqui foi para descansar”. Eça viu.
Pois! Soube-me bem descansar um pouco esta noite, mas amanhã tenho de por as asas, e não é para me armar em anjinho...
Aprecio a escrita de Agualusa. Uma escrita doce, suave, que me faz flutuar com prazer em ondas de frases simples, elegantes e ricas de sentimentos. Estava perante uma coletânea de crónicas “psicografadas” de muitas entidades. Todos mortos, logo, boas pessoas. Graças ao facto de habitarem no além, podem dizer o que lhes passa pelas etéreas cabeças sem ser importunados.
A primeira crónica, “Os portugueses não gostam de asas”, é de Eça de Queirós. Diz o espírito do escritor, que está no céu, pelo menos é íntimo de São Pedro e viu, de braço dado, Saramago e Miguel de Vasconcelos: - “Hoje debruço-me sobre Portugal de uma varanda mais vasta – a Eternidade – e de novo me aflige o desdouro. Não que Portugal esteja pior do que há cem anos; está todavia mais pequeno. Já nem é bem um país – é um resumo”. Comenta que todos os países erram e nós não somos exceção, só que antigamente “errávamos com grandeza e originalidade”, “hoje erramos em ponto pequeno, e ainda por cima por imitação”.
Não se pode dar asas a um português como fez São Pedro, ao fim da tarde, quando viu entrar uma alma sem maldade. Era português, mas protestou quando o porteiro do céu lhas entregou, perguntando o que é que iria fazer com elas. A resposta não tardou: - “Ora filho, voa!” Aterrorizado, o português devolveu as asas, dizendo-lhe: - “Se eu vim para aqui foi para descansar”. Eça viu.
Pois! Soube-me bem descansar um pouco esta noite, mas amanhã tenho de por as asas, e não é para me armar em anjinho...
2 comentários:
Ahahah!
Caro Prof, posso não comentar sempre, mas leio todas as suas crónicas que aqui publica.
Quanto ao frio – se esse é, realmente, a fonte da sua tranquilidade – posso sugerir um lugar noutro continente, onde de certo sentiria essa serenidade (partindo do princípio que são sinónimos) durante, pelo menos, 5 meses! : )
... pode não ir fazer de anjinho, pode, mas, salvar e ser Salvador, d'isso meu caro, ninguem o livra!
;)
Bom, mas começando pelo princípio.
Os generais Romanos trouxeram para a península um hábito que constituia em fazer uma caminhada de 10.000 passos, antes de se recolherem para dormir.
Esta prática, garantia-lhes, para além do exercício físico, uma limpeza do espírito que resultava em maior facilidade de adormecer e maior clareza de raciocínio.
Todos os dias utilizo a A-1 para me deslocar para Lisboa e retornar a casa e, todos os dias dou de caras com um placard ou out-door, como se lhe queira chamar, instalado ali por alturas de Via-Longa, que apresenta a imágem de um casal, ele por sinal, parecidíssimo com o apresentador de televisão Eládio Clímaco e com uma legenda em destaque que diz "Jesus é a Salvação".
Apesar de o ver diáriamente, só ha dias é que dei comigo a pensar no sentido da frase.
Acontece-me sempre, quando conduzo, saio fora de mim mesmo, torno-me autómato. Até ha cerca de 4 anos, deslocáva-me sómente de mota, variadíssimas vezes, acontecia-me chegar a casa ou ao emprego e não conseguia recordar-me por onde tinha passado, se tinha encontrado trânsito ou não, nada. Algumas vezes sucedeu-me, a meio do percurso e estou a falar de 50 km, "acordar" e não saber onde me encontrava, nem para onde me dirigia. Comecei a assustar-me, sobretudo pela prespectiva de, no meio de tão grande alheamento, poder provocar um acidente que vitimasse alguém. Preocupado, consultei um médico amigo, relatei-lhe a minha preocupação e ele sossegou-me; que o pensamento está fora, mas os sentidos e os reflexos estão alerta. Perante a certeza do homem que sabe da poda, sosseguei.
Mas, voltando ao placard, pensei: Jesus é a solução?!
Mas... a solução de quê, ou a solução para quê?
Bom, a primeira resposta é inevitávelmente esta: para os nossos problemas!
Hmmm... Quer dizer então que somos seres cheios de problemas, para os quais buscamos desesperadamente solução, ou, soluções e, aquele anúncio está a dizer-nos que Jesus Cristo É! a solução para os problemas que afectam a nossa paz interior...
Quem conhece mínimamente os factos da vida de Jesus Cristo e aquilo que Ele pregou, poderá concluir com facilidade, que Ele não é a solução, Ele é alguém que nos indica as formas mais simples para encontrarmos a solução para os nossos problemas mas, acima de tudo, indica-nos a forma mais simples para pervenirmos os problemas. Ou seja, indica-nos o caminho mais sensato para não tropeçarmos nos problemas.
Então... Jesus Cristo, é um médico, é um Doutor; é alguem que quando o consultamos, nos diz, não roubes, não mates, não catrapisques a gaja do outro, honra o cota e a cota, ama o teu próximo, etc, etc. Do mesmo modo que o médico nos diz; não abuses dos doces, não fumes, não bebas bebidas alcoolicas em excesso, não comas alimentos gordos, pratica exercício físico e mental, etc, etc. Então, podemos concluir que tanto Jesus como os médicos, não são a Salvação, são sim, o caminho e esse caminho não tem fim.
;)
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