Tenho muito medo que o velho e experimentado aforismo de que o óptimo é
inimigo do bom se aplique às medidas agora enunciadas por Passsos Coelho. Para
cumprir o Memorando negociado pelo governo do PS, é bom lembrá-lo sempre, o
Governo decidiu-se pela acumulação de uma medida estrutural e recomendável (a
descida da TSU para os empresas), com outra, nas circunstâncias, praticamente
inevitável (a de um novo “imposto” sobre as remunerações dos empregados do
sector privado). Mas, ao fazer descer a taxa dos empregadores e subir a taxa
dos empregados para se igualarem ao mesmo nível de 18%, fez uma ligação
umbilical entre as duas taxas. Por muito que se possam teorizar e explicar e
enumerar as virtudes da medida, e a medida tem virtudes, o que aparece
explícito é que são os empregados a financiar a baixa de custos das empresas. O
que, sobretudo nas actuais circunstâncias, é um verdadeiro tiro no pé, por não
susceptível de compreensão e aceitação por parte da generalidade dos cidadãos,
naturalmente pouco versados nas subtilezas macroeconómicas.
Por outro lado, o governo não soube ou não pôde criar um ambiente que
pudesse justificar a medida. O grande problema do equilíbrio das contas
públicas não se resolve com mais impostos, mas sobretudo com diminuição da
despesa, com particular incidência no desmantelamento completo e radical do
Estado Paralelo, Institutos inúteis, Fundações parasitas, Observatórios
simultaneamente inúteis e parasitas, etc., onde tudo continua completamente na
mesma. Por outro lado, o governo ainda não fez a reestruturação dos transportes
públicos, nem da RTP, num caso e noutro enormes sorvedouros de dinheiro. Nem
chegou ao fim da negociação das rendas excessivas das PPPs ou das energias
renováveis.
Se, depois disto tudo, ainda fosse necessário avançar com a bomba atómica
das medidas simultâneas agora decididas, poderia ser aceitável e compreensível.
Não nas circunstâncias presentes.
Porque, se as medidas não resultarem, só resta uma, a saída do euro, e aí
não ficará pedra sobre pedra e os sacrifícios e os sacrificados atingirão
níveis inimagináveis.
Uma nota final para o corte nas pensões dos reformados: porque
descontaram, deveria ser a última das últimas medidas a tomar. Não é correcto,
nem justo, mexer assim tão radicalmente em direitos adquiridos, quando nas
rendas das eólicas e das PPPs a negociação é tão branda e inconcludente.
Kant teorizou sobre a crítica da razão pura, da razão prática e do juízo. Nem tudo o que advém da dedução teórica ou a experimentação é aceitável. Sobre essas coclusões tem que incidir um juízo moral. Acho que é isso que falta. E faz muita falta.
15 comentários:
“Para cumprir o Memorando negociado pelo governo do PS”.
Ainda bem que foi negociado pelo PS. Porque se fosse negociado pela dupla Passos Coelho/Victor Gaspar, que se gabam de ser mais troikistas do que a Troika, estávamos bem aviados, estávamos.
Pois... mas ao que parece, nem ha juízo, nem moral. Pelo menos quem decide, demonstra o contrário, caro Dr. Pinho Cardão.
Mas, não se evoque Immanuel Kant, nem as suas teorias. Ele nunca viveu em Portugal, nem neste tempo nem nesta crise, com estas gentes.
«... ao fazer descer a taxa dos empregadores e subir a taxa dos empregados para se igualarem ao mesmo nível de 18%...» O problema, caro Dr. Pinho Cardão, de tão claro e evidente que é, parece absurdo manter-se. É que, se a medida se ficasse somente pela descida das taxas colectadas aos empregadores, estaríamos sim, perante uma tentativa de apoio às empresas que iria reflectir-se, na manutenção em primeiro lugar, dos postos de trabalho existentes e posteriormente, muito provávelmente, iria proporcionar a criação de novos postos de trabalho. Mas se esta medida vem acompanhada de uma outra que retira a quem recebe salário, algum poder de compra... então temos de concordar com o engenheiro Belmiro quando diz que sem dinheiro, não é possível comprar coisas. Não sendo possível comprar coisas, deduz-se que não seja possível às empresas que vendem coisas, manter-se, mesmo com a taxa reduzida, pela simples questão que a redução de que passará a beneficiar, não será suficiente para pagar os ordenados que anteriormente eram pagos através dos lucros da receita.
Tudo isto, ao fim e ao cabo, resume-se efectivamente em duas simples operações aritméticas: adição... e subtração.
Acontece que maior ou menor rendimento das famílias, a procura gerada pelo maior rendimento das pessoas ou a procura gerada pelo investimento público são conceitos que não entram nas cabecinhas dos “boys de Chicago”. Para eles vigora a Lei de Say pelo que haverá apenas que dar dinheiro às empresas, baixando salários e a Taxa social, uma vez que conseguirão assim maiores disponibilidades financeiras e deste modo, segundo o seu pensamento, irão seguramente investir e criar mais emprego, dado que (acreditam piamente) a “oferta gera a sua própria procura”. Não há assim que haver preocupações com as políticas de distribuição de rendimentos, o mercado se encarregará de gerar a sua própria procura. O mal não está na falta de procura mas na carência de meios financeiros das empresas. É esta a sua lógica.
Quando o empresário assiste, mês a mês, à diminuição das suas encomendas, por mais meios financeiros que disponha, não irá seguramente investir e criar mais emprego, tomara ele despachar a mercadoria que tem em armazém.
Mas isto não colhe na cabecinha dos neoliberais. Para eles, mais dinheiro nos consumidores, maior rendimento das famílias, maior investimento público, não aumenta a procura nem o emprego. E não é por aí que a economia se deve dirigir. Políticas Keynesianas nunca.
Clarinho. Parabéns.
Estou convicto que não há retorno, pois o Povo QUER sacrificar-se porque percebeu que se gastou a mais.
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Mas não há um objetivo, navegação à vista como é usual dizer-se. Porque gente incompetente, ou dotada de modelos teóricos irreais, ou o cultivo do lugarzinho partidário.
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Tudo seria compreensível se as DESPESAS assinaladas pelo articulista fossem reais. Mas nada.
O consenso em vista de um fim único e comum acabou.
Agora, agora restará saírem por eleições, ou pelos colarinhos.
Não é só um juízo moral, antes fosse. Falta também o juízo técnico, pois a experimentação serve exactamente para isso, para testar, e para impedir danos generalizados de uma prática de que não se conheciam os efeitos precisamente porque o juízo técnico era insuficiente. Ora, se se "experimenta" sem cautela nem prudência,como se fosse certeza científica, ficamos depois todos a olhar os resultados bons ou maus, ou péssimos, ou catastróficos, com grande curiosidade científica? E diremos oh que pena!, afinal não devia ter sido assim??
1. Caro Carlos Sério:
Nem quero comentar a do seu primeiro comentário. Até porque não é factualmente verdadeiro. O PSD propôs, as cartas estão escritas, através do Dr. Eduardo Catroga, quer um aumento do apoio financeiro, de forma a resolver o problema das dívidas das empresas públicas, quer uma alteração dos pressupostos e, consequentemente, das medidas, pelo facto de o défice de 2010 ser superior em 2 pontos percentuais àquele que tinha sido indicado à Troyca por Sócrates. Aconteceu que a Troyca não alterou nem os pressupostos do défice, errados à partida, nem o montante do financiamento.
Portanto, ironias destas acabam por não ser lá de muito bom gosto e, pior ainda, acabam por lavar o mal feito.
2. Claro que de ideias tão simplistas como a que apresenta sobre os neoliberais e a Escola de Chicago não custa tirar as conclusões que se queira.
Como a da completa demência dessa casta já que, segundo diz, "para eles, mais dinheiro nos consumidores, maior rendimento das famílias, maior investimento público, não aumenta a procura nem o emprego...". Enfim, acho que é má política minimizar a inteligência alheia.
3. Quanto a políticas keynesianas, neste momento, em Portugal, estamos conversados. Quem as financia? E não foram as políticas keynesianas que nos levaram a este estado de coisas? Pretende-se dar ainda mais veneno? Se, para cúmulo, até já nem há quem o financie!...
Caro Bartolomeu:
Creio que simplifica demasiado. Uma descida da TSU das empresas e, assim, dos custos de produção, gera um cash-glow adicional que pode ser aplicado em investimento tecnológico, na organização empresarial, na formação de pessoal, com repercussões a prazo na produtividade e na competitividade, advindo daí um melhor posicionamento no mercado, substituição de importações, aumento das exportações.
Também pode induzir uma baixa de preços no mercado interno, compensando parcialmente a descida do poder de compra. Ou até aumento de salários. Os efeitos são estruturais e são benéficos.
Todavia, o que não concordo é com o tempo e o modo ela é levada à prática. Mas oxalá resulte.
Caro Conservador:
Muito obrigado. Parabéns, conservadores ou outros, caem sempre bem.
Cara Suzana:
Juízo técnico houve. Correram diversas simulações, com base em pressupostos que admito serem realistas. Não creio que o FMI e o BCE brinquem em serviço, nesta matéria.
No entanto, na gestão e, com maioria de razão, na governação há mais, muito mais, para além da tecnocracia.
Caso contrário, entregava-se a gestão e a governação a uns tantos especialistas e doutores em modelos econométricos e a coisa fluía.
Caro Dr. Pinho Cardão,
Em teoria, ou melhor, técnicamente, sim. Mas na prática, e com a visão empresarial que reina no nosso país e com as regras de emprego vigentes, esse investimento em tecnologia e em formação, não passará de uma mera suposição. E mais, duvido bastante que o governo, caso consiga fazer aprovar estas medidas, seja capaz de impor regras que obriguem as empresas a usar os lucros gerados pela baixa da taxa social, exclusivamente nesses investimentos.
O Senhor sabe muitíssimo melhor que eu, como é fácil para os nossos empresários congeminar formas de "dar a volta" àquilo que lhes é imposto pelo governo.
Além do mais, para que essas medidas fossem aceites e os fins cumpridos à risca, teria de existir um objectivo comum, apoiado por formação dos prórios empresários. Teria de haver o cuidado de lhes explicar muito bem explicadinhas as vantagens futuras dessa "aplicação". Como isso nunca irá acontecer, caso o orçamento seja aprovado com estas novas regras, vai ficar tudo "ao Deus-dará", como aliás é nosso hábito.
Caro Pinho Cardão,
“E não foram as políticas keynesianas que nos levaram a este estado de coisas?”
Não, não foram. O que nos trouxe a este estado de coisas foi a governação incompetente, despesista e corrupta dos últimos governos. Foi a criação paulatina ao longo dos anos de uma administração pública paralela, parasitária, que esbanja recursos e alberga as clientelas partidárias. Dizer que a governação Sócrates foi keynesiana é um erro profundo e seria até atribuir-lhe um mérito que ela não merece. Como diz e bem o Pinho Cardão, é com o aniquilamento desta administração paralela, com uma profunda reforma da administração, que se alcançaria uma diminuição da despesa pública sem diminuir os benefícios ou a qualidade dos serviços nela prestados.
Só que, a manutenção e sobrevivência dos benefícios parasitas das clientelas partidárias nesta administração paralela, são mais fortes que qualquer intenção de se executar uma reforma séria, que não seja apenas cosmética.
Caro Pinho Cardão,
Se essas medidas fossem tomadas, que obviamente apoio e concordo, em nada alteraria a necessidade destas. Nada. Seriam necessárias na mesma.
Podiam ser feitas antes para gerar outro ambiente mediático? Aí não concrordamos. A oposição a estas medidas vem exactamente da RTP e dos outros instalados nesses mesmos interesses que diz poderiam ser atacados.
Caro Pinho Cardão, pelo que entendo, juizos técnicos foi coisa que não faltou, o do ano passado e o deste ano, pena que sejam contraditórios. Mas, como diz, mesmo que tivesse havido um método científico sério, sempre faltará o que aponta. Que não é dispensável se calhar nem numa tese de doutoramento.
E para aqueles, sabe-se lá porquê, menorizam a poupança financeira que se obteria com o aniquilamento da administração paralela parasitária, devo afirmar que ela atingiria um valor próximo dos 6% do PIB.
Qual, o conselho de estado?
Caro Carlos Sério:
Pelo menos concordamos numa coisa, os malefícios do estado paralelo.
Já é bom.
Quanto ao governo de Sócrates,de facto foi mais um governo keynesianeiro do que keynesiano, porque Keynes de certeza condenaria o que, em nome da sua doutrina, Sócrates fez.
Quando Sócrates referiu que iria aumentar o investimento público , TGVs Aeroporto, PPPs, etc, porque era necessário dinamizar a economia, aplicou fora de tempo uma política keynesiana. Que nunca poderia ser aplicada com o nível de défice existente, carga fiscal existente, endividamento público existente. Keynes deve ter dado uma volta na tumba quando ouviu catedráticos defenderem esta política usando o seu nome.
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